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De universidades a igrejas, coronavírus esvazia eventos e preocupa setores de serviço no Brasil

Grandes eventos estão sendo cancelados em várias cidades do país para evitar aglomeração de pessoas. Associação de bares e restaurantes não prevê prateleiras vazias, mas crise nas áreas de lazer

São Paulo / Brasília -
Mulher em supermercado nos Estados Unidos.
Mulher em supermercado nos Estados Unidos.Mike Stewart (AP)

Desde a chegada do novo coronavírus ao Brasil, que teve seu primeiro caso divulgado na última semana de fevereiro, os últimos dias registraram o maior avanço da doença em território nacional. O número de infectados mais do que triplicou em três dias: segundo dados do Ministério da Saúde, os 25 confirmados na segunda-feira (9) saltaram para 77 na tarde desta quinta (12). Ao passo que o vírus se instala no Brasil, outros países com milhares de doentes se viram obrigados a tomar medidas extremas, como a suspensão de diversos torneios esportivos, o cancelamento de voos dos Estados Unidos para a Europa e o isolamento da Itália, onde as ruas e os supermercados ficam cada vez mais vazios. O Brasil ainda não está na mesma situação de desespero, mas já convive com o cancelamento de eventos que trariam uma aglomeração de pessoas e com a incerteza do setor de serviços acerca da propagação da doença.

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Segundo o ministério, 42 dos 77 casos são em São Paulo, Estado que foi a porta de entrada da doença no Brasil. Um deles é em um aluno do curso de Geografia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, no campus central da universidade, e provocou o cancelamento de algumas aulas de outros cursos que funcionam no mesmo prédio, como História e Ciências Sociais. No geral, as aulas da USP seguem mantidas, ao contrário do que acontece na Faculdade Cásper Líbero, localizada na Avenida Paulista, que suspendeu todas as aulas de seus cursos até o próximo dia 20 de março “frente à possibilidade de os casos de contaminação aumentarem nos próximos dias”. A Unicamp, entidade estadual de Campinas, e o Insper também suspenderam suas aulas até o fim do mês. A PUC-SP, por outro lado, funciona normalmente apesar de dois alunos terem testado positivo para o coronavírus.

As medidas de prevenção ao coronavírus também afetaram algumas festas estudantis, tradicionalmente realizadas no começo do semestre para recepcionar os calouros nas universidades. Uma das maiores, a Gvjada, organizada por estudantes da Fundação Getúlio Vargas, aconteceria no sábado (14) em São Paulo e tinha mais de 4.000 interessados no evento do Facebook, foi adiada: “Seria irresponsável realizar a festa nesse fim de semana”, argumentou a Associação Atlética Acadêmica Getúlio Vargas. O festival Lollapalooza, que acontece na mesma cidade nos dias 3, 4 e 5 de abril, deve seguir os rumos das edições marcadas para Argentina e Chile, que já foram adiados.

Em Brasília, o clima foi de feriado nesta quinta-feira. Depois do governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha, suspender as aulas nas redes pública e privada do Estado e restringir eventos que reúnam um grande número de pessoas, o movimento caiu pela metade na capital do país, com escolas de natação, academias e outros comércios vazios. A Universidade de Brasília interrompeu as atividades presenciais, mas manteve o calendário acadêmico, substituindo as aulas por exercícios domiciliares “embora classifique a medida do Governo como precipitada”. Até agora, são dois casos confirmados do vírus no Distrito Federal, além de 74 suspeitos. Maria Riva, 75, fiel frequentadora de uma igreja, reclamou da medida que deixou até a missa de portas fechadas. “Nem pra Deus podemos apelar agora”, afirmou em tom de brincadeira a aposentada.

A Confederação Sul-Americana de Futebol suspendeu as partidas da Copa Libertadores, que tem equipes de Porto Alegre, Curitiba, São Paulo, Santos e Rio de Janeiro envolvidas, seguindo o exemplo adotado pelas entidades europeias. CBF e federações estaduais ainda não se pronunciaram sobre o futebol nacional.

Abastecimento

No entanto, o Brasil ainda não vive a mesma situação extrema de países como a Itália e Inglaterra, que soma prateleiras vazias nos supermercados e ruas desertas em suas cidades mais turísticas, e tampouco perturba o setor de mercados. Através da assessoria de imprensa, a Associação Brasileira de Supermercados (ABRAS) diz estar acompanhando a situação com atenção e seguindo orientações do Governo, mas que ainda não registrou “nenhum problema ou falta de abastecimento nos supermercados do país”.

A ABRAS, inclusive, organiza uma convenção nacional que visa o encontro de líderes brasileiros do setor e está marcada para acontecer no Rio de Janeiro a partir da próxima segunda-feira, 16 de março, até o dia 18. A convenção deve reunir cerca de 600 pessoas diariamente no Riocentro e por enquanto está mantida. “Um país que tem 200 milhões de habitantes e 70 casos confirmados não é preocupante no sentido de ter pânico”, afirmou a assessoria. Por outro lado, o Banco Central cancelou o XXII Seminário Anual de Meta para a Inflação, que aconteceria no mesmo Rio de Janeiro entre os dias 20 e 22 de maio, como “medida preventiva para evitar o risco de propagação do coronavírus”.

Um dos setores que mais deve ser afetado pelo surto do coronavírus no Brasil é o de bares e restaurantes, uma vez que os estabelecimentos podem sofrer prejuízos pela redução de fornecimento, ausência de pessoas nas ruas e infecções nos próprios funcionários. Percival Maricato, presidente da seccional paulista da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes, se declara assustado, mas “devidamente alertado”. “Na Itália, os bares estão fechando às 18h. Se eles fecharem às 18h aqui, é a mesma coisa que não abrir. Precisamos estar preparados para a crise que vai vir e enxugar os custos, porque vamos ter problemas”, afirma ele. Maricato não teme prateleiras vazias ou problemas de fornecimento, mas sim a diminuição do movimento no comércio e a infecção por parte de empregados dos estabelecimentos. “Se as pessoas seguirem as recomendações do Ministério da Saúde e OMS e não saírem de casa, as áreas de lazer serão muito afetadas. Ao mesmo tempo, precisamos educar, examinar e garantir a remuneração de um funcionário doente. Um restaurante fechado não vai aguentar mais de um mês. Por outro lado, vai aumentar o delivery”, argumenta.

O presidente da ABRAS-SP prevê uma reunião com o Governo estadual nos próximos dias para definir os próximos passos do planejamento que, segundo ele, já está sendo discutido desde a semana passada. Nesta quinta-feira, em entrevista coletiva, o governador João Doria afirmou que “não há razões para pânico” e nem “recomendações para o cancelamento de eventos no Estado”. Percival Maricato pretende cobrar incentivos do governador para que seu setor lide com a crise financeira causada pela doença. “Achamos que o Governo deve fazer linhas de crédito e suspender ou reduzir impostos durante algum tempo”, opina o presidente. “Para que pequenas empresas possam suportar os dias sem movimento e mandar um funcionário suspeito para casa mantendo a remuneração e o nível de emprego”, conclui.


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