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Papa Francisco remove o segredo pontifício para casos de pedofilia

Nova norma enfatiza o dever geral de cooperar com a Justiça e proíbe explicitamente a imposição de silêncio às vítimas de violência sexual e abusos

Daniel Verdú
O papa Francisco, no Vaticano, no final de novembro.
O papa Francisco, no Vaticano, no final de novembro.Max Rossi (REUTERS)

O Papa Francisco, no dia em que completa 83 anos, promulgou duas novas leis que, entre outras coisas, eliminam o segredo pontifício —imposto pelo pontífice em questões e investigações de certa gravidade— em casos de violência sexual e abusos de menores e de vulneráveis por parte de representantes da Igreja. A nova regra visa acabar com a lei do silêncio que por tantos anos pairou sobre os casos de abusos e agilizará a tramitação das denúncias e seu possível encaminhamento às autoridades civis, caso o país em que ocorreram obrigue a isso, como já sucede nos Estados Unidos. A lei, conhecida como motu proprio, não afeta o segredo da confissão, que continua plenamente vigente também para esse tipo de crime.

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A regra, que entrará em vigor imediatamente, também destaca que haverá o dever geral de cooperar com a Justiça quando houver mandatos executivos. Ou seja, as dioceses de cada país deverão fornecer toda a documentação sobre os processos e denúncias em curso que forem solicitados pela autoridade judicial. Algo que já havia sido apontado anteriormente, mas agora vem acompanhado pelo levantamento do segredo pontifício. Andrea Tornielli, diretor editorial da Santa Sé, assim resumiu a mudança: "Os documentos não serão de domínio público, mas, por exemplo, será facilitada a possibilidade de uma colaboração mais concreta com o Estado, no sentido de que a diocese que possui uma determinada documentação não está mais vinculada ao sigilo papal e pode decidir —o que deve fazer— colaborar transmitindo uma cópia da documentação também à autoridade civil".

A nova norma é mais um passo na abertura do atual pontificado para o problema dos abusos de menores e um dos aspectos reivindicados na cúpula dedicada ao assunto, realizada em fevereiro. Além disso, é acompanhado da proibição de impor às queixas das vítimas a obrigação do silêncio. Uma ideia retirada de uma lei anterior e que aqui é novamente enfatizada. O único a quem serão impostas restrições será o réu, porque normalmente o bispo adotará medidas cautelares. Outra novidade na remoção do segredo papal que o Vaticano ainda não explicou é o grau de acesso que as vítimas terão à documentação de seu caso. Até agora, uma vez concluídos os processos administrativos, elas enfrentavam uma barreira informativa. A nova regra deve facilitar a possibilidade de examinar o arquivo do caso.

A lei veio acompanhada da explicação de um de seus responsáveis, o bispo espanhol Juan Ignacio Arrieta, que sintetiza seu conteúdo desta maneira: “Esta instrução busca especificar o grau de reserva com que serão tratadas as notícias ou denúncias relativas a abusos sexuais por parte de clérigos ou pessoas consagradas contra menores ou outros sujeitos determinados, e as eventuais condutas que tendessem a silenciá-los ou encobri-los. O objetivo é cancelar a sujeição ao chamado segredo pontifício, redirecionando o nível de reserva devidamente exigido para a proteção da boa reputação das pessoas envolvidas, para o normal segredo de ofício estabelecido, que todo pastor ou titular de um cargo público deve contemplar de modo distinto, de acordo com as pessoas que tenham o direito de conhecer as notícias”.

No segundo motu proprio promulgado pelo Papa também se abre a possibilidade de que os advogados em processos canônicos sejam civis. Além disso, a detenção, aquisição e difusão de imagens pornográficas de menores de 18 anos por parte de um clérigo passam a ser consideradas pornografia infantil (antes, a idade mínima era 14 anos).

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