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Assessores classificam telefonema entre Trump e líder ucraniano como “inapropiado” e “incomum”

Consultor do Conselho de Segurança Nacional e assessora do vice-presidente americano ouviram conversa telefônica com Volodymyr Zelenski que motivou processo de impeachment

Pablo Guimón
O tenente-coronel Alexander Vindman e a assessora do vice-presidente Jennifer Williams durante audiência pública sobre o impeachment de Donald Trump
O tenente-coronel Alexander Vindman e a assessora do vice-presidente Jennifer Williams durante audiência pública sobre o impeachment de Donald TrumpLOREN ELLIOTT (REUTERS)

A investigação do impeachment de Donald Trump entra na segunda semana de audiências públicas, na qual nove depoimentos serão ouvidos (na segunda-feira foi acrescentado um aos oito previstos) ao longo de três dias. Os primeiros a depor, na terça-feira, foram duas pessoas que ouviram a conversa telefônica de 25 de julho entre Donald Trump e o presidente ucraniano, Volodymyr Zelenski. Trata-se do tenente-coronel Alexander Vindman, especialista em Ucrânia no Conselho de Segurança Nacional, e de Jennifer Williams, assistente de política internacional do escritório do vice-presidente norte-americano, Mike Pence.

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No telefonema em questão, segundo um registro não sigiloso, o presidente pediu a seu colega ucraniano o “favor” de abrir investigações em seu país contra Hunter Biden e seu pai, o ex-vice-presidente Joe Biden, pré-candidato democrata à corrida presidencial de 2020. Vindman ficou preocupado com a conversa e transmitiu o que ouviu ao advogado do Conselho de Segurança Nacional, que decidiu armazenar o registro da chamada em um sistema altamente sigiloso, mais do que deveria. Essa chamada foi a que levou o denunciante anônimo a apresentar a queixa que deu início ao processo de impeachment.

“É inapropriado para o presidente pedir a um Governo estrangeiro que investigue um adversário político”, afirmou Vindman aos congressistas na terça.

Vindman declarou que a chamada foi “uma jogada partidarista” e por isso informou o Conselho de Segurança Nacional. Em seu depoimento inicial, o tenente-coronel explicou que a Ucrânia havia recebido apoio dos Estados Unidos nos últimos anos, compartilhado por democratas e republicanos, mas recentemente percebeu que existiam “dois atores disruptivos”. Estes, contou Vindman, eram “o então procurador-geral ucraniano Yuri Lutsenko e o ex-prefeito de Nova York Rudolph Giuliani, advogado pessoal do presidente Trump”.

Ambos “forneciam informações falsas que enfraqueciam a política dos EUA na Ucrânia”, disse Vindman, incluindo a difusão da ideia de que o Governo de Kiev deveria investigar as atividades da família do ex-vice-presidente se quisesse receber ajuda do Governo dos EUA. O filho de Joe Biden, Hunter, fazia parte do conselho da companhia ucraniana de gás Burisma, e a suspeita (não sustentada pelas evidências) de Giuliani é que o democrata pressionou o Governo ucraniano a interromper uma investigação contra seu filho, chegando a manobrar até conseguir a destituição do então procurador-geral Viktor Shokin. Mas diferentes relatórios mostram que nunca houve uma investigação contra Hunter Biden. E seu pai pressionou para que Shokin fosse destituído, mas foi apenas mais um dos diplomatas internacionais e especialistas de organizações anticorrupção a exigir sua saída.

Vindman relatou que quando Trump pediu a Zelenski que investigasse os Biden, o desequilíbrio de poder entre ambos os líderes era em si mesmo um elemento de pressão. “Na cultura militar de onde eu venho, quando um superior pede para fazer algo, não é um pedido, mas uma ordem”, disse. Essa “disparidade de poder”, explicou, fez Zelenski entender que, se quisesse uma reunião na Casa Branca, teria que abrir as investigações que Trump estava lhe pedindo.

Por seu lado, Williams definiu a chamada como “inusual”. “Achei o telefonema de 25 de julho inusual porque, em contraste com outros telefonemas presidenciais que observei, envolvia a discussão do que parecia ser um assunto de política interna”, explicou.

"Anti-Trump"

Durante seu depoimento a portas fechadas, Williams já havia descrito a conversa telefônica entre os dois líderes como “inapropriada”, o que lhe valeu os ataques de Trump por meio do Twitter. “É uma anti-Trump que eu não conheço e da qual mal ouvi falar”, escreveu o presidente.

No início da audiência, o presidente do Comitê de Inteligência, Adam Schiff, fez referência aos ataques de Trump contra Williams e os relacionou com os que o presidente dedicou à ex-embaixadora Marie Yovanovitch durante seu depoimento na sexta-feira, que o próprio Schiff sugeriu que poderia constituir um crime de intimidação de testemunhas. “Senhora Williams, todos vimos o tuíte do presidente sobre a senhora no domingo e os insultos que lançou à embaixadora Yovanovitch na sexta-feira. A senhora está aqui hoje e o povo norte-americano está agradecido”, disse Schiff. Horas depois, em sua rodada de perguntas, o congressista democrata Jim Himes voltou a se referir aos ataques de Trump e a mencionar a “intimidação de testemunhas”.

Ainda na terça prestaram depoimento duas outras testemunhas, Kurt Volker e Tim Morrison, neste caso convocados pelos republicanos. O primeiro é o ex-enviado especial para a Ucrânia e um dos “três amigos” –denominação que disse desconhecer–, juntamente com o embaixador na União Europeia, Gordon Sondland, e o ministro da Energia, Rick Perry, aos quais Trump confiou esse canal de diplomacia irregular com a Ucrânia em detrimento do oficial, de acordo com vários depoimentos. Morrison é diretor de Europa e Rússia no Conselho de Segurança Nacional e os republicanos queriam que ele reiterasse que, como havia dito em particular, não encontrou nada inerentemente problemático na chamada.

No início de seu depoimento, Volker procurou se mostrar como alguém alheio às supostas tentativas de outros oficiais de pressionar com um pacote de ajuda para que Kiev investigasse os adversários de Trump. Os republicanos esperavam que Volker reforçasse sua versão de que não houve mal-entendido no pedido de Trump a Zelenski: que o presidente não fez depender o desbloqueio de um pacote de ajuda militar e uma visita oficial à Casa Branca de que Zelenski abrisse as investigações solicitadas.

Nesta quarta-feira é a vez de Gordon Sondland, empresário doador da campanha de Trump, que foi recompensado com o cargo de embaixador junto à União Europeia. Existe uma grande expectativa por seu depoimento depois que enviou aos congressistas uma emenda de três páginas para corrigir seu depoimento inicial a portas fechadas. Na emenda ele reconhece que disse a um assistente de Zelenski que o desbloqueio do pacote vital de ajuda militar à Ucrânia dependia de que Kiev abrisse as investigações sobre os democratas.

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