_
_
_
_
_

Os ‘amantes de Módena’ eram dois homens

Esmalte dos dentes permite identificar o sexo dos esqueletos enterrados de mãos dadas há 1.600 anos, mas nada revela a relação que mantinham

Os 'amantes de Módena', enterrados da mão.
Os 'amantes de Módena', enterrados da mão.UNIVERSIDAD DE BOLONIA

Os amantes de Módena representaram durante anos o mito do amor eterno: dois esqueletos enterrados juntos, de mãos dadas, e um deles com a cabeça voltada para o outro, unidos pela eternidade. Até agora se supunha serem um homem e uma mulher. Mas descobriu-se que os dois esqueletos, enterrados há 1.600 anos e descobertos em 2009 na cidade de Módena (Itália), pertencem a dois homens com cerca de trinta anos de idade. Pesquisadores da Universidade de Bolonha revelaram o sexo dos esqueletos por meio da composição do esmalte dos dentes.

Conforme o estudo publicado na revista Scientific Reports, os restos mortais estavam danificados pela passagem do tempo. “Não podíamos analisar os crânios ou os quadris por causa do desgaste que havia; isso poderia ter nos ajudado, já que a forma dos ossos é diferente entre um homem e uma mulher”, explica Federico Luigi, um dos autores do relatório. O pesquisador da Universidade de Bolonha explica que, nos dez anos que se passaram desde a descoberta, tentaram realizar todo tipo de análises, mas nenhuma permitiu confirmar o sexo dos esqueletos. Dessa forma, o rumor do amor eterno heterossexual continuou se espalhando pelo mundo. “Dois anos atrás, pesquisadores ingleses descobriram que uma proteína presente no esmalte dos dentes permitia identificar o sexo. Tentamos com os amantes e funcionou”, conta o especialista italiano.

Mais informações
Água é detectada pela primeira vez em atmosfera de ‘superterra’ habitável
O primeiro dia na Terra após os asteroide que acabou com os dinossauros
Maior estudo da história não encontra relação determinante entre genes e comportamento sexual

A proteína em questão é a amelogenina e se divide, como os cromossomos, em X e Y. A AMELX se encontra no tecido dental do homens e da mulher, mas a chamado AMELY, apenas nos homens. Os amantes de Módena tinham um esmalte com a mesma composição. Para comprovar a descoberta, os pesquisadores repetiram a análise com 12 dentes de esqueletos do mesmo lugar e de outros cemitérios próximos e dois “modernos”, como os qualificaram no estudo. E tudo se encaixou.

Cemitério onde encontraram 'os amantes de Módena'
Cemitério onde encontraram 'os amantes de Módena'universidad de bolonia.

Os esqueletos foram enterrados em um cemitério com outras 11 pessoas. Alguns dos enterrados mostram marcas de traumatismos que podem estar relacionados a uma morte violenta durante uma guerra, explica o estudo. Os pesquisadores sugerem que o enterro foi realizado dessa maneira para ilustrar uma união entre dois homens que morreram juntos na guerra ou que eram da mesma família e por isso compartilharam a sepultura. No entanto, fica a dúvida de por que estão de mãos dadas.

Luigi não especula sobre qual era a relação entre eles. “Não podemos dizer que tiveram um relacionamento romântico, porque sabemos que na Itália, na Antiguidade tardia, ser homossexual era crime e ninguém, em sã consciência, teria mostrado esse tipo de relacionamento mesmo que fosse em uma sepultura”, explica o italiano .

Os pesquisadores insistiram em confirmar o sexo dos esqueletos mesmo sem haver debates ou dúvidas envolvidas. “Por que não deixamos isso de lado? Não é um enterro usual. Existem muito, muito poucos [enterros desse tipo] [todos de homens e mulheres ou parentes, de acordo com a lista do estudo]. É extraordinário e muito mais interessante descobrir que são dois homens. Nos permite indagar nas ideologias de nossos antepassados e, principalmente, a partir de um ponto de vista social, descobrir como se contempla isso agora”, conclui Luigi.

Mais informações

Arquivado Em

Recomendaciones EL PAÍS
Recomendaciones EL PAÍS
_
_