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Paralisia política deixa a economia argentina em situação crítica

Após derrota nas primárias, Macri lançou mão de medidas eleitoreiras, como reduzir os impostos e elevar o salário mínimo

O presidente Mauricio Macri, depois da derrota eleitoral.
O presidente Mauricio Macri, depois da derrota eleitoral.Agustín Marcarian (Reuters)
Enric González

E agora? O que fazer? Após o pânico dos mercados na segunda-feira, a economia argentina volta a espreitar o abismo. Com a agravante do bloqueio político: o presidente Mauricio Macri perdeu a autoridade, o opositor Alberto Fernández ainda não ganhou uma eleição real e nenhum dos dois parece disposto a cooperar para impedir que o país sangre daqui até dezembro, quando o novo mandato deve começar. A situação na Argentina é crítica.

Ninguém acredita que Macri possa superar a derrota sofrida nas primárias argentinas do último domingo. Nem ele mesmo acredita nisso. Mas deve permanecer na batalha eleitoral para que sua coligação, Mudemos, possa passar à oposição com um certo número de parlamentares. Se a campanha continua, é impossível forjar algum tipo de consenso ou poder compartilhado com o peronismo. E sem isso, parece improvável que se possa deter a queda livre da economia. Macri e Fernández, cuja relação pessoal é péssima, não mantêm nenhum contato desde a reviravolta eleitoral. Fernández diz que, se Macri o chamar, ele irá ao encontro. Na realidade, as circunstâncias os empurram para manter o confronto.

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O peso argentino se desvalorizou nesta terça-feira um pouco mais, até 58 por dólar (na sexta-feira estava a 45), e o risco-país disparou para mais de 1.700 pontos (os investidores concedem 75% de probabilidade de uma suspensão dos pagamentos nos próximos cinco anos), mas o mais alarmante é o recrudescimento da inflação por causa da desvalorização de 25% registrada na segunda-feira. Alguns fabricantes de alimentos, como a Unilever, começaram a aplicar aumentos provisórios próximos a 10% nos preços de seus produtos. Algumas lojas pararam de vender, esperando que novos preços sejam fixados. O próprio Governo considera inevitável que a inflação, agora perto de 50% ao ano, aumente ainda mais.

Na Casa Rosada, procuraram-se fórmulas para estabilizar de alguma forma a situação. O Banco Central se mostrou disposto a gastar suas reservas para evitar novas derrocadas do peso, o que a oposição criticou, e o Governo começou a estudar possíveis mecanismos para conter os aumentos de preços tanto quanto possível. Também se propôs, de maneira mais eleitoreira (agora a questão é que a derrota do macrismo em outubro seja o menos grave possível), a reduzir os impostos sobre as classes médias, elevar o salário mínimo e aliviar a situação das pequenas empresas, sufocadas por taxas de juros acima de 70%. O peronismo, porém, tem maioria entre os deputados e senadores, e isso deixa muito pouca margem de manobra ao Governo para baixar um plano econômico de emergência.

As PASO (Primárias Abertas, Simultâneas e Obrigatórias) se tornaram um mecanismo perverso. Criaram um longo vazio de poder (Macri fica desautorizado, Fernández só pode ser eleito nas eleições argentinas de 27 de outubro), o que agrava tudo. À necessidade de continuar a campanha eleitoral, o que impede acordos entre as grandes forças, soma-se a aparente alienação de Mauricio Macri, que na segunda-feira causou perplexidade geral ao culpar o kirchnerismo e, em última análise, a maioria dos argentinos que tinham votado na oposição, pelo caos nos mercados financeiros.

A incerteza é tão profunda que alguns indicadores macroeconômicos, como o preço dos títulos, são experimentos, porque está difícil casar as operações. Mal se compra e se vende, à espera de que algo aconteça. Ninguém sabe o quê. A única coisa que parece clara é que os próximos meses se tornarão uma via crúcis econômica. Várias grandes empresas, como a Pampa Energia, lançaram programas de recompra de ações próprias para evitar que as cotações (que caíram quase 60% globalmente na segunda-feira) continuem desmoronando.

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