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Mundo tem maior incidência de sarampo em 13 anos

Na primeira metade de 2019 foram registradas mais transmissões que em todo o ano passado, segundo dados da OMS. Brasil é o segundo com mais registros nas Américas

Uma adolescente de 15 anos se vacina contra o sarampo em Teesside (Inglaterra).
Uma adolescente de 15 anos se vacina contra o sarampo em Teesside (Inglaterra).Owen Humphreys (Getty Images)
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No primeiro semestre de 2019 foram registrados mais casos de sarampo que em qualquer ano desde 2006, segundo dados provisórios publicados nesta segunda-feira pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Em novembro, o organismo já advertira sobre o avanço histórico do sarampo por causa da redução da cobertura vacunal, e nesta segunda-feira reafirma que a prevalência da doença, ascendente há três anos, é “preocupante e continuada”. Desde janeiro, 182 países notificaram 364.808 casos de sarampo, quase três vezes os contabilizados no mesmo período do ano passado. Além disso, a OMS salienta que este número é uma subestimação; calcula-se que reflita apenas 10% dos casos reais.

Segundo a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), o Brasil registra atualmente o segundo maior número de casos de sarampo das Américas, região que confirmou 2.927 casos neste ano (até o dia 7 de agosto). A doença foi identificada em 14 países da região no primeiro semestre. O maior número de episódios da infecção foi registrado nos Estados Unidos (1.172), seguido pelo Brasil (1.045) e Venezuela (417).

“Estas cifras são um toque de atenção muito poderoso”, adverte o epidemiologista Antoni Trilla, do Hospital Clínic de Barcelona. “A saúde do mundo está em risco sempre que em alguma parte do planeta existir a possibilidade de epidemia ou de manutenção do vírus”, acrescenta. Embora o sarampo fosse considerado erradicado em todo o continente americano e em grande parte da Europa, atualmente há surtos registrados em todas as regiões da OMS.

O sarampo é uma doença viral transmitida facilmente pelo ar ou por contato pessoal. Passado um período de incubação de até 12 dias — durante o qual já é contagioso —, o vírus produz febre alta e erupções cutâneas. Além disso, pode derivar em complicações sérias, como pneumonia, cegueira ou encefalite, uma inflamação cerebral que às vezes deixa sequelas muito graves, inclusive a morte. Em 2017, último ano para o qual há cifras, ocorreram 110.000 falecimentos no mundo, principalmente de crianças com menos de cinco anos.

O aumento mais drástico de casos se deu na África, onde o número de pacientes se multiplicou por 10 desde o ano passado. A situação também piorou muito rapidamente na região europeia da OMS (que inclui países não membros da UE, como Israel, Ucrânia e Rússia): já foram registrados quase 90.000 casos neste ano, mais que aqueles contabilizados ao longo de todo 2018 (84.462). Os países mais afetados são a República Democrática do Congo, Ucrânia e Madagascar, assolados por epidemias há meses.

Existe uma vacina segura e eficaz para prevenir a transmissão do sarampo, mas estima-se que 95% da população teria que ser inoculada para que se alcançasse a imunidade coletiva, evitando novos surtos. Estima-se que 20 milhões de crianças de todo o mundo — mais de 10% dos menores — não recebam a vacina correspondente a cada ano, segundo dados publicados pelo Unicef. Por isso, o sarampo ainda é uma importante causa de morte em nível global, sobretudo entre as crianças menores.

“Aumentou a desigualdade e a falta de acesso à vacina nos países em desenvolvimento”, diz Amos García-Rojas, presidente da Associação Espanhola da Estudos da Vacinas. Ele atribui o avanço do sarampo, sobretudo, à pobreza e à guerra: “Na Ucrânia, por exemplo, a situação de conflito bélico desconfigurou totalmente a política imunológica do país”. Inclusive em Estados ricos, os especialistas observam que pode haver setores desfavorecidos da população, como as famílias nômades, que são mais suscetíveis a adoecer por sua exclusão do sistema sanitário. Em vários países, o sarampo também avança agora entre adolescentes e adultos jovens que pularam as vacinas na infância.

O movimento antivacinas — pais e pacientes que rejeitam a profilaxia por causa de crenças anticientíficas — é um problema menor em nível global, segundo todos os epidemiologistas. Só causam alguma preocupação em alguns países desenvolvidos, como os Estados Unidos, Itália e França. “Um problema das vacinas é seu próprio sucesso: já não vemos as doenças contra as quais nos vacinamos”, raciocina García-Rojas. “Isto nos leva a baixar a guarda.” O Estado de Nova York, que recentemente sofreu alguns de seus piores surtos de sarampo em comunidades de judeus ortodoxos, agora proíbe que se recuse a imunização por motivos religiosos. Segundo a OMS, os Estados Unidos sofreram neste semestre a maior incidência de sarampo em 25 anos.

O Plano de Ação Mundial sobre Vacinas (GVAP, na sigla em inglês) tem como objetivo eliminar o sarampo em cinco das seis regiões da OMS até 2020. Os especialistas Trilla e García-Rojas confirmam que, efetivamente, a doença cumpre os requisitos para a erradicação: não é capaz de sobreviver fora do corpo humano, existe vacina eficaz e é facilmente diagnosticada. Mas “claramente” não será eliminada no ano que vem, lamentam.

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