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Com ruídos na base, Bolsonaro jura “casamento” com Guedes por Previdência

Em visita ao Nordeste, presidente afirma que, sem mudanças, Brasil entrará em "caos econômico" e não precisará mais de ministro da Economia

Bolsonaro, em visita ao Instituto Ricardo Brennand, no Recife nesta sexta-feira.
Bolsonaro, em visita ao Instituto Ricardo Brennand, no Recife nesta sexta-feira. Marcos Corrêa/PR
Marina Rossi
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O presidente Jair Bolsonaro (PSL) aproveitou sua primeira visita do mandato ao Nordeste para redobrar suas apostas —e seus apelos— pela reforma da Previdência. Foi contundente ao condicionar o sucesso dos investimentos anunciados para a região à aprovação das mudanças nas aposentadorias, que tramita num Congresso onde o Governo está longe de ter uma base de apoio estável. A mensagem chegou no mesmo dia em que políticos e agentes do mercado financeiro debatiam as intenções de Paulo Guedes, seu ministro da Economia, ao dizer à revista Veja que renunciaria ao cargo se a reforma pretendida pelo Governo se transformar em uma "reforminha" ou "se sentir que o presidente não quer a reforma". "Pego um avião e vou morar lá fora. Já tenho idade para me aposentar", disse o ministro. "Se não fizermos a reforma, o Brasil pega fogo. Vai ser o caos no setor público, tanto no Governo federal como nos Estados e municípios".

Em Pernambuco, questionado sobre a ameaça de seu ministro, Bolsonaro afirmou que ir embora "é um direito dele". E reforçou a tese de Guedes, durante entrevista coletiva em Petrolina, no interior do Estado. "Ele tem razão. Se tiver uma reforminha e não tiver a reforma, a gente não precisa mais de ministro da Economia, porque o Brasil pode entrar em um caos econômico. Ele vai ter que ir para a praia. Vai fazer o que em Brasília?", disse o presidente, que voltou a ser racista ao dizer que uma mudança de pequeno porte seria "de japonês". Depois, o mandatário ainda usaria o Twitter para reforçar a aliança com seu ministro da Economia, seu fiador das reformas liberais durante a campanha eleitoral: "Peço desculpas por frustrar a tentativa de parte da mídia de criar um virtual atrito entre eu (sic) e Paulo Guedes. Nosso casamento segue mais forte que nunca kkkkk. No mais, caso não aprovemos a Previdência, creio que deva trocar o Ministério da Economia pelo da Alquimia, só assim resolve."

O intercâmbio de declarações foi acompanhado de perto pelo mercado financeiro, onde o presidente Bolsonaro é tratado com reticência, apesar de ainda haver fé de que a gestão possa passar a reforma das aposentadorias. A ameaça de Guedes de deixar o cargo e a espécie de ultimato ao Congresso reforçado pelo presidente não foi bem recebido por algumas lideranças parlamentares. Chegam num momento delicado da relação do Planalto com o Parlamento e quando há no horizonte a possibilidade de aprovação de uma reforma bastante diferente da proposta pela atual gestão. Na semana passada, um grupo de deputados, incluindo o presidente da Câmara Rodrigo Maia (DEM-RJ), chegou a cogitar apresentar um novo projeto, abandonando o texto enviado em fevereiro pelo Executivo. A proposta alternativa não andou, mas o Governo já trabalha com a possibilidade de alterações no texto da proposta original e teme que as mudanças prejudiquem o objetivo de economizar 1 trilhão de reais em dez anos. A "reforminha" mencionada por Guedes seria um projeto muito diferente do proposto por ele.

O Congresso e Rodrigo Maia também não estão nada confortáveis com o movimento do Planalto de, no próximo domingo, endossar uma manifestação em apoio a Bolsonaro convocada em mais de 300 cidades, segundo seus organizadores. A mobilização oficialmente é pela reforma da Previdência e o pacote de leis contra a violência, mas as redes bolsonaristas estão inundadas de mensagens depreciativas contra Maia e outras lideranças políticas, acusadas de "achacar" o Planalto. Não faltam também mensagens sugerindo até o fechamento do Legislativo. Bolsonaro, que em um primeiro momento afirmou que iria ao ato a favor dele mesmo, depois recuou. "Não estou participando das manifestações", afirmou em Petrolina. "Pelo que estou vendo é uma manifestação que tem uma pauta, uma pauta de alavancar o Brasil para o futuro”, disse, rejeitando as propostas mais radicais. A adesão nas ruas neste domingo, e a reação do Planalto, vão ser um fator importante para definir a relação com o Parlamento adiante.

Só se a reforma sair

Durante sua primeira visita ao Nordeste, Bolsonaro acenou para a região, anunciando um aumento de 4 bilhões de reais no Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste (FNE). Mas, de olho em seu maior objetivo, condicionou os investimentos à aprovação da Previdência. "Sem a reforma, não poderemos colocar talvez parte do que estamos acertando em fazer aqui", afirmou o presidente no Recife.

Em uma região onde oito dos nove governadores são da oposição, Bolsonaro buscou apoio e pregou união, mirando obter êxito no Congresso. Deu um "abraço hétero" no governador de Pernambuco Paulo Câmara (PSB), para mostrar que não há animosidade, e seguiu, do Recife a Petrolina, batendo na mesma tecla: "Precisamos aprovar a Previdência porque daí temos investimentos interno e externo para essas obras", disse, em entrevista coletiva em Petrolina.

Na cidade a 700 quilômetros da capital, o presidente foi recebido por algumas dezenas de apoiadores, aos gritos de “mito”. Petrolina é governada por Miguel Coelho (sem partido), filho do senador Fernando Bezerra Coelho (MDB), líder do governo no Senado, e articulador da visita do presidente à região. Enquanto acompanhava o presidente, o senador tinha mais de 250 milhões de reais bloqueados pela Operação Lava Jato, por ordem do Tribunal Regional da 4ª Região (TRF-4), em ação por improbidade contra o MDB e o PSB e os políticos desses partidos. A ação investiga desvios em negócios relacionados ao esquema de corrupção na Petrobras. Segundo a Lava Jato, o PSB, Fernando Bezerra, o ex-governador de Pernambuco Eduardo Campos e o empresário Aldo Guedes, entre outros, teriam recebido propinas desviadas da obra da construção da Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco.

Antes de encerrar sua visita à única região que não o elegeu e onde tem a pior aprovação no país, Bolsonaro afirmou "já estar com saudade". No sertão, anunciou a entrega de empreendimentos do programa Minha Casa Minha Vida, uma dos principais programa sociais do do PT. Foram as primeiras casas do programa entregues pelo presidente. O Governo estuda mudar o programa, apresentando uma proposta de aluguel invés de posse das casas para os mais pobres. Na proposta, que deve ser anunciada em julho, os beneficiários na faixa de renda menor teriam de alugar seus imóveis por um valor simbólico em vez de pleitearem um financiamento para aquisição da casa própria. Um dos maiores problemas, segundo o Governo, é a comercialização irregular das casas.

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