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Doze militares são denunciados por fuzilamento de músico e catador no Rio

Ministério Público Militar diz que agentes cometeram homicídio, tentativa de homicídio e omissão de socorro na ação que matou Evaldo Rosa e Luciano Macedo

Beatriz Jucá
 O carro de Evaldo dos Santos Rosa, após ser atingido por mais de 80 tiros, no domingo de 7 de abril.
O carro de Evaldo dos Santos Rosa, após ser atingido por mais de 80 tiros, no domingo de 7 de abril.Fabio Teixeira (AP)
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O Ministério Público Militar denunciou doze militares que dispararam contra o carro de uma família que se locomovia para um chá de um bebê, causando a morte do músico Evaldo Rosa e do catador de material reciclado Luciano Macedo, ferido enquanto tentava ajudar a família em Guadalupe, no Rio de Janeiro. Os militares foram denunciados pelo homicídio dos dois e pela tentativa de homicídio do sogro de Evaldo, Sérgio Gonçalves de Araújo, ferido na mesma operação. Também estavam no veículo a esposa, o filho e uma amiga do músico, que não foram atingidos. O documento enviado à Justiça Militar ainda denuncia os militares por omissão de socorro, já que eles teriam apenas tentado vistoriar a área após o incidente. Agora, a Justiça Militar terá um prazo de 15 dias para decidir se aceita ou não a denúncia.

Embora 12 militares estivessem presentes no local, apenas dez foram detidos em flagrante logo após o crime, já que os outros dois apenas conduziam os veículos e, portanto, não chegaram a disparar. Em uma audiência de custódia realizada no último dia 10 de abril, a Justiça Militar converteu nove dessas dez prisões em flagrante para prisão preventiva. Apenas o soldado Leonardo Delfino Costa teve liberdade provisória concedida porque foi o único que declarou não ter feito nenhum disparo naquele dia.

A juíza Mariana Queiroz Aquino Campos, da 1ª Auditoria Militar do Rio, manteve a prisão deles por entender que houve "quebra das regras de engajamento" durante a ação, já que eles dispararam sem que houvesse qualquer risco ou ameaça. A defesa dos militares entrou com recurso ao Superior Tribunal Militar pedindo a soltura imediata deles, mas o recurso foi negado. Na última quinta-feira, houve outra audiência pelo pedido da defesa para conceder o habeas corpus aos militares, mas a juíza pediu vistas. O caso deve voltar a ser analisado na próxima semana. Enquanto isso, eles seguem detidos.

No documento do Ministério Público Militar, a denúncia não cita essa decisão, e se estende aos 12 militares que participavam da ação de patrulhamento em uma área militar de Guadalupe, no Rio de Janeiro. Conforme a perícia teriam atirado contra o veículo da família ao confundi-lo com um carro roubado naquele mesmo dia na região. A ação, porém, é considerada desproporcional. Segundo a denúncia do MPM, os militares dispararam 257 vezes durante a operação, e 62 dos tiros atingiram o carro de Evaldo Rosa.

Informações iniciais da perícia feita pela Polícia Civil depois que a população local impediu que os próprios militares vistoriassem o local, contabilizavam pelo menos 80 tiros. "Não foram encontrados vestígios de disparos na viatura militar (evento 115, documento 5) nem no entorno de onde esta se encontrava", destaca o documento. Também não foram encontradas armas com as vítimas, conforme os laudos citados no documento da denúncia.

O caso foi levado à Justiça Militar por conta de uma lei sancionada pelo então presidente Michel Temer em 2017. Nos últimos três anos, o Exército vem ganhando protagonismo em ações de segurança pública no Brasil. Foi nesse contexto que os militares conseguiram aprovar a lei 13.491/2017, que transfere para as Forças Armadas os casos de crimes dolosos contra a vida de civis durante operações de garantia da lei e da ordem. O caso de Guadalupe é emblemático porque a legislação é interpretada como uma espécie de foro privilegiado para os militares por ativistas de direitos humanos.

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