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Protagonismo de Trump na crise da Venezuela, uma faca de dois gumes para Guaidó

O político venezuelano sugere uma intervenção militar contra Maduro, mas depois matiza falando em "cerco diplomático"

Francesco Manetto
Uma seguidora de Juan Guaidó se ajoelha diante de agentes da Guarda Nacional Bolivariana.
Uma seguidora de Juan Guaidó se ajoelha diante de agentes da Guarda Nacional Bolivariana.SCHNEYDER MENDOZA (AFP)

Após um sábado marcado por confrontos na fronteira da Venezuela, Juan Guaidó  encerrou uma jornada com uma mensagem que, longe de acalmar os ânimos, sugere o pior epílogo para a grave crise do país. Depois da tentativa fracassada de fazer com que caminhões de ajuda humanitária entrassem no país através da fronteira com a Colômbia e o Brasil, o presidente da Assembleia Nacional venezuelana se dirigiu às instâncias internacionais que o apoiaram desde o início, com os Estados Unidos e a Colômbia à frente, para pedir novamente sua ajuda. Desta vez, em termos que aparentemente vão além do apoio simbólico ou logístico.

“Os acontecimentos de hoje me obrigam a tomar uma decisão: expor à comunidade internacional de maneira formal que devemos ter todas as opções em aberto para conseguir a libertação desta pátria que luta e continuará lutando. A esperança nasceu para não morrer, Venezuela!”, escreveu o político venezuelano no Twitter, pouco depois de dar uma entrevista coletiva ao lado do presidente colombiano, Iván Duque, e do secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), Luis Almagro. Suas palavras remetem ao fantasma que agita precisamente o Governo de Nicolás Maduro, o da intervenção militar, algo que seu arqui-inimigo, o Governo de Donald Trump, não deixou que sugerir.

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Um mês depois de prestar juramento como chefe de Estado interino reconhecido pelo Parlamento no lugar do presidente chavista, Guaidó deu um passo além, e fez isso ao final de um dia no qual a repressão policial e os distúrbios deixaram pelo menos quatro mortos e dezenas de feridos. Nas últimas semanas, ele havia mantido um tom relativamente calmo, apesar do desafio aberto. Pôs em andamento um processo de transição que busca a saída do sucessor de Hugo Chávez, a formação de um gabinete provisório e a convocação de eleições. Conseguiu unir novamente em torno da mesma causa a oposição venezuelana, um conjunto de forças com estratégias, sensibilidades e orientações ideológicas diferentes. No entanto, a tensão e o fato de o Governo mostrar que tem o controle do aparelho estatal, apesar da deserção não desprezível de mais de 60 militares em poucas horas, levou-o a insinuar o caminho da intervenção.

Mais tarde, diante do alvoroço que gerou, matizou sua declaração com outra mensagem divulgada por meio do Twitter, na qual se limita a mencionar “as opções da comunidade internacional que conseguiram o cerco diplomático que contribuirá para o fim da usurpação, para o Governo de transição e para eleições livres”.  Horas depois, recebeu apoio, também via Twitter, da chancelaria brasileira, que conclamou os aliados, especialmente os que ainda não reconheceram Guaidó, a ajudar a "libertar a Venezuela". Guaidó, que na sexta-feira foi à cidade colombiana de Cúcuta, apesar de estar expressamente proibido pela Justiça venezuelana de sair do país, participará nesta segunda-feira em Bogotá da reunião do Grupo de Lima, uma das iniciativas mais beligerantes contra o chavismo no continente. Também terá um encontro com o vice-presidente dos EUA, Mike Pence, que, na véspera de 23 de janeiro, dia da proclamação de Guaidó, declarou apoio à iniciativa dos opositores contra Maduro.

“Para avançar em nosso caminho, vou me reunir segunda-feira com nossos aliados da comunidade internacional, e continuaremos coordenando as próximas ações”, acrescentou o líder do partido Vontade Popular, de Leopoldo López, que está preso desde 2014. Para os dirigentes da Assembleia Nacional, o equilíbrio entre pressão interna e externa é fundamental, embora o papel do Governo Trump não só manche o trabalho da oposição, como também pode afetar sua legitimidade. O Governo dos EUA foi o primeiro a reconhecer Guaidó como presidente. Não obstante, seu protagonismo nesta crise é uma faca de dois gumes. O apoio de Washington continua sendo necessário, mas a mera hipótese de um conflito armado condena Guaidó a perder a batalha da opinião pública, principalmente dentro da União Europeia. A maioria dos países o reconheceu como presidente interino, embora Bruxelas tenha mostrado sua determinação de buscar uma saída negociada.

O líder do Parlamento venezuelano, que neste domingo recebeu o apoio do ex-presidente norte-americano Bill Clinton, apelou até mesmo a Chávez para reduzir o tom de suas palavras. “Duvido que Hugo Chávez aceitaria o que Maduro trouxe para a Venezuela e a FAN”, afirmou, referindo-se às Forças Armadas. “Fome, violência, repressão e medo. Maduro destruiu tudo, começando pela Constituição de 99, promovida por Chávez em 99 e defendida por nós em 2007”, acrescentou.

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