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Vale desloca 125 pessoas que vivem no entorno de mais cinco barragens

Desocupações ocorreram nas cidades de Ouro Preto e Nova Lima, em Minas Gerais Mineradora afirma que são ações preventivas, mas três das cinco barragens estão na "zona de atenção" de risco da empresa

Beatriz Jucá
Áreas na zona de autossalvamento da barragem de Vargem Grande, em Nova Lima
Áreas na zona de autossalvamento da barragem de Vargem Grande, em Nova Lima
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Um total de 125 pessoas que vivem no entorno de cinco barragens da Vale nas cidades de Ouro Preto e Nova Lima estão sendo removidas de suas casas ao longo desta quarta-feira por equipes da Defesa Civil e da mineradora. Esta é a terceira vez que a empresa retira moradores de áreas próximas às suas barragens desde a tragédia de Brumadinho. A Vale afirma que a desocupação nas chamadas zonas de autossalvamento se trata de uma "medida preventiva" e que não houve alteração na situação de estabilidade das barragens, que passaram a ser monitoradas diariamente. A retirada das pessoas, explica a mineradora, visa facilitar a obtenção de autorizações pelo Governo para dar início às atividades de descaracterização das estruturas à montante. Quatro dos empreendimentos estão localizados na histórica cidade de Ouro Preto, sendo que três deles — as barragens Forquilha I, II e III — haviam sido incluídos na chamada "zona de atenção" por risco de rompimento em relatório interno da Vale elaborado no ano passado. A Prefeitura de Nova Lima (onde fica a quinta barragem, chamada Vargem Grande) afirma em nota que a mineradora acionou o Plano de Ação Emergencial na manhã desta quarta-feira e que a Defesa Civil municipal auxilia na retirada das pessoas.

O maior número de remoções previstas deverá ocorrer em Nova Lima, mesma cidade onde 200 pessoas já haviam sido retiradas por risco em uma segunda barragem. Segundo a Vale, pelo menos 100 pessoas deverão abandonar os 33 imóveis onde moram, em uma região localizada a 52 quilômetros da sede da cidade. Isso porque as casas estão localizadas na chamada "zona de autossalvamento", ou seja, em um raio de até dez quilômetros da barragem de Vargem Grande. A Vale diz que não há risco iminente de rompimento da estrutura, mas que está retirando a população para acelerar as autorizações com o objetivo de descaracterizar suas barragens de alteamento a montante. No entanto, por volta das 8h45 desta sexta-feira, a empresa acionou o Plano de Ação de Emergência desta estrutura, segundo nota da prefeitura da cidade.

"A Prefeitura de Nova Lima informa que a Defesa Civil Municipal foi avisada pela Vale às 8 horas e 45 minutos, desta quarta-feira (20/02), da necessidade de evacuação de 38 famílias moradoras do Complexo Rio de Peixe, em função do acionamento do Plano de Ação de Emergência de Barragens (PAEBM) de Vargem Grande. A Defesa Civil Municipal já está se encaminhando ao local para acompanhar a ação da mineradora, atuar no cumprimento dos protocolos e garantir a segurança de todos, assim como uma equipe da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social, que prestará apoio às famílias", afirma a nota.

As atividades da barragem de Vargem Grande foram paralisadas após o rompimento da barragem I de Brumadinho, que deixou pelo menos 169 mortos e 141 desaparecidos. O empreendimento está inserido, com outras nove barragens, no plano de descomissionamento anunciado pela Vale após o desastre. Um eventual rompimento da barragem de Vargem Grande sem a emissão de alerta poderia causar entre 100 e 1.000 óbitos, segundo estimativa de potencial perdas de vida contida no relatório de Gestão de Riscos Geotécnicos, um documento interno da própria mineradora produzido no ano passado. Na semana passada, outras 200 pessoas de Nova Lima que sair de suas casas após a Vale acionar o nível 2 do Plano de Ação de Emergência de Barragens de Mineração (PAEBM) para a barragem B3/B4 da mina Mar Azul, que está inativa. Em nota, e empresa também informou que se trata de uma medida preventiva, após revisão de dados de relatórios de empresas terceirizadas.

Na cidade histórica de Ouro Preto, 25 pessoas deverão deixar os oito imóveis onde vivem, em áreas rurais do entorno de quatro barragens da Vale: Forquilha I, II e III e Grupo, na Mina Fábrica. Segundo a Vale, as comunidades afetadas estão a aproximadamente 15 quilômetros da localidade de Engenheiro Correia. As barragens Forquilha I, II e III já estavam desativadas antes da tragédia de Brumadinho e também estão devem ser descomissionadas pela Vale em até três anos, conforme anunciou a empresa no último mês. O relatório de Gestão de Riscos Geotécnicos da mineradora coloca essas três barragens na chamada "zona de atenção" por risco de rompimento. A barragem que rompeu em Brumadinho também tinha essa classificação. A Vale, porém, insiste que não há risco iminente de ruptura em nenhuma das dez barragens inseridas nesta lista. Oito delas permanecem de pé, mas tiveram suas atividades suspensas por decisões judiciais.

Conheça as cinco barragens que motivaram as desocupações

Nova Lima

  • Vargem Grande: Foi paralisada após a tragédia de Brumadinho e incluída no plano de descomissionamento da Vale, que prevê a descaracterização de barragens a montante em até três anos. Segundo documento interno da mineradora, potencial de perdas de vidas sem alerta está entre 100 e 1.000 óbitos.

Ouro Preto

  • Forquilha I, II e III: As barragens já estão desativadas e também foram incluídas no plano de descomissionamento da Vale. O potencial de perda de vidas estimado pela Vale nas três em caso de ruptura sem a emissão de alerta fica entre 100 e 1.000. Com o alerta, óbitos podem ser reduzidos a perto de 1. Juntas, as três barragens têm volume de rejeitos cinco vezes maior que a barragem que rompeu em Brumadinho.
  • Grupo: Abastece a Mina Fábrica, em Ouro Preto. Também está prevista no plano de descomissionamento da Vale e deve ser descaracterizada nos próximos três anos.

Forquilha I, II e III são classificadas barragens de risco baixo, porém com elevado dano potencial associado (quando há risco de perda de muitas vidas e dano ambiental elevado). O relatório interno da mineradora aponta que, sem a emissão de alerta à população, essas barragens poderiam provocar de 100 a 1.000 mortes. Isso porque o mar de lama pode afetar não só às comunidades mais próximas, mas uma área maior. Com alerta, a perda potencial de vidas cai a um número próximo de um. Juntas, as três barragens que estão localizadas bem próximas uma da outra, armazenam um volume de rejeitos cinco vezes maior que o volume da barragem que rompeu em Brumadinho. O EL PAÍS tentou entrar em contato com a Prefeitura de Ouro Preto para comentar as remoções, mas não conseguiu contato com os responsáveis.

A Vale informa que disponibilizará pontos de atendimentos específicos em Ouro Preto e Nova Lima. E que disponibilizará hospedagem, alimentação, transporte e medicamentos às pessoas que tiveram que deixar suas casas, além de uma equipe multidisciplinar com psicólogos e assistentes sociais. A mineradora ainda afirma que os centros urbanos das cidades de Ouro Preto, Nova Lima, Itabirito e Congonhas, próximos aos empreendimentos, não seriam afetados pela remoção. "As medidas abrangem pontualmente as áreas destacadas nos mapas disponibilizados nos pontos de atendimento e na internet e que as pessoas serão contatadas por equipes da Vale e da Defesa Civil. Moradores de outras localidades podem permanecer em suas casas", diz a nota da empresa.

Na tarde desta quarta-feira, a Justiça mineira acatou o pedido do Ministério Público com base nos riscos das barragens Forquilha I, II e III e determinou que a Vale adote uma série de medidas de segurança. Embora um eventual rompimento não deva afetar a sede de Ouro Preto, procuradores apontam que a vizinha Itabirito estaria na rota da lama de rejeitos dessas estruturas, conforme documento apresentado pela própria mineradora. Agora, a Vale tem 72 horas para providenciar fixação de rotas de fuga e pontos de encontro, implantar sinalização de campo e de sistema de alerta, bem como apresentar estratégias para evacuação e resgate da população com dificuldade de locomoção. A mineradora também deverá cadastrar imóveis nas áreas de impacto e informar à população de Itabirito sobre essas medidas. A Justiça ainda deu um prazo de sete dias para que a Vale realize simulados e treine a população .

No dia 8 de fevereiro, outras 304 pessoas foram retiradas de suas casas em Minas Gerais por risco de rompimento em duas barragens de alteamento a montante. Um total de 239 pessoas foram retiradas de imóveis próximos à barragem da mina Gongo Soco, da Vale, em Barão de Cocais. Lá, a mineradora acionou as sirenes por decisão da Agência Nacional de Mineração, após a consultoria Walm negar a Declaração de Condição de Estabilidade à estrutura. A aproximadamente 180 quilômetros do município, em Itatiaiuçu, a mineradora ArcelorMittal decidiu retirar outras 65 pessoas que vivem no entorno da barragem de rejeitos de Serra Azul como medida de precaução após avaliação da estrutura da barragem. As famílias desalojadas foram encaminhadas para um hotel e só deveriam retornar quando confirmada a redução de risco por meio de inspetorias nos empreendimentos. Algumas delas já foram autorizadas a voltar às suas casas.

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