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Yalitza Aparicio, a professora indígena que aspira a um Oscar histórico

Protagonista de ‘Roma’ é indicada ao prêmio de melhor atriz, a primeira a uma mexicana em 17 anos

Imagem do filme ‘Roma’.
Imagem do filme ‘Roma’.AP
Luis Pablo Beauregard
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Originária de uma terra agreste, Yalitza Aparicio se tornou uma celebridade inesperada. A protagonista de Roma somou um novo marco à sua carreira na manhã desta terça-feira, ao ser indicada ao Oscar de melhor atriz por seu papel como a empregada doméstica Cleo no longa dirigido por Alfonso Cuarón. O feito amplia a drástica transformação vivida em poucos meses por essa professora rural nascida no Estado de Oaxaca (sul). Aparicio, que nunca antes havia parado diante de uma câmera de cinema, disputa a mais cobiçada categoria feminina com Glenn Close, Olivia Coleman, Lady Gaga e Melissa McCarthy. É a primeira vez que uma mexicana aparece nessa lista desde 2002, quando Salma Hayek foi indicada por Frida.

Há três anos, pendia sobre Aparicio a temível espada que ameaça a maioria das vidas de Tlaxiaco, um município de 40.000 habitantes, onde quatro a cada dez casas não têm saneamento básico. A pobreza e as carências restringem a existência de centenas de jovens que não podem romper esse ciclo inevitável. No primeiro dia de 2019, o prefeito de Tlaxiaco foi assassinado minutos depois de tomar posse no cargo. A violência não é uma desconhecida para a família Aparicio Martínez. A mãe de Yalitza, Margarita, é uma indígena triqui oriunda de San Juan Copala — uma etnia destroçada pelos acirrados ódios entre seus grupos políticos, que motivaram dezenas de homicídios nessa comunidade.

Yalitza e seus três irmãos vivem em Campo de Aviación, um bairro de Tlaxiaco que surgiu sobre uma antiga pista de pouso clandestina nesta região de indígenas mixtecos. Não muito tempo atrás, a hoje atriz, de 26 anos, ajudava sua família a fazer pinhatas em seu tempo livre, depois de dar aulas a crianças de pré-escola num colégio chamado México.

Os conflitos sindicais da Seção 22, um belicoso grupo do Sindicato Nacional de Trabalhadores da Educação (SNTE), deixaram Yalitza sem opções depois de cursar a licenciatura para se tornar professora do curso pré-escolar numa escola normal de Putla Villa de Guerrero. Aparicio voltou ao seu município porque não conseguiu achar vaga em outra escola.

Tudo mudou quando Edith, a mais velha dos irmãos Aparicio Martínez, ousou desafiar seu destino. Era a mais extrovertida, por isso se sentiu capaz de responder ao chamado que ouviu alguns anos atrás da boca do diretor da Casa da Cultura local. “Morenita, venha a um casting porque querem atrizes para um filme”, disseram-lhe. Yalitza acompanhou sua irmã mais velha. As duas sentiam desconfiança e medo. Achavam que por trás da oferta poderia haver um sequestro ou uma rede de tráfico de mulheres, confessou Edith ao jornal El Universal.

O que encontraram foram Luis Rosales e sua equipe de casting, trabalhando para um projeto que era tratado com receio. Yalitza passou no primeiro filtro e, para a segunda etapa, que a levaria ao centro do país, ao Estado do México, pediram-lhe que fosse acompanhada de alguma amiga que soubesse falar mixteco. Essa amiga é Nancy García, que interpreta Adela na ficção da Netflix. Marina de Tavira, outra das protagonistas de Roma, foi indicada ao Oscar de melhor atriz coadjuvante.

Quando finalmente lhe disseram que iria trabalhar com Alfonso Cuarón, Yalitza Aparicio teve que procurar o nome e as fotos dele na Internet. Sentiu-se ludibriada ao ver o premiado diretor em pessoa pela primeira vez. A figura magra que tinha à sua frente não correspondia ao que vira no computador. “Vamos embora daqui, porque estão nos enganando”, disse Aparicio à sua mãe. Mas era tarde demais. Cuarón já tinha visto nela a encarnação de Liboria Rodríguez, a babá que cuidou dele na sua casa, na rua Tepeji, a partir de meados de 1962. Ali começou a ser escrita uma história que terá um novo capítulo em 24 de fevereiro, na cerimônia mais glamourosa de Hollywood.

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