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Crítica | Cinema
Crítica
Género de opinião que descreve, elogia ou censura, totalmente ou em parte, uma obra cultural ou de entretenimento. Deve sempre ser escrita por um expert na matéria

‘A Favorita’: Pela sedução ao poder

Esta rainha ciclotímica e sua relação com suas duas amantes me intrigam progressivamente, os diálogos são perspicazes. Filme foi indicado a dez Oscars

Emma Stone, em 'A favorita'.
Emma Stone, em 'A favorita'.
Carlos Boyero
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Relaciono a filmografia do diretor grego Yorgos Lanthimos com uma presença fixa nos festivais, essas competições que anseiam por tudo o que leve a marca da vanguarda, da modernidade, do hermetismo pretensioso, do exotismo, da autoria bem-sucedida. Neles, despertou-se o entusiasmo e também a lisonja intelectual, filmes vocacionalmente estranhos e inovadores, com abordagens originais, truculentas, supostamente misteriosas, com atmosfera claustrofóbica e perversa como Canino, A Lagosta e O Sacrifício de um Cervo Sagrado. Reconhecendo o mundo de Lanthimos como atípico, provocador, cruel e mórbido, nunca me conectei com ele, seus filmes me perturbam e tendem a me deixar entediado, assim como irritado.

Aparentemente, chovem ofertas do cinema internacional para Lanthimos. Faz tempo que suas filmagens são em Inglês, com recursos generosos (impensáveis na Grécia) e artistas muito cobiçados, incluindo mais de uma estrela. A Favorita, sua mais recente produção, que estreia no Brasil nesta quinta-feira, 24 de janeiro, se desenvolve na corte da Inglaterra durante o século XVIII. Lanthinos conta que é uma encomenda antiga. Na qual, pela primeira vez, desaparece seu habitual corroteirista Efhymis Filippou. O diretor tampouco assina o roteiro deste filme, de autoria de Deborah Davis e Tony McNamara. Não é um obstáculo para que, em A Favorita, sejam absolutamente reconhecíveis o universo, as obsessões, o estilo narrativo de Lanthimos.

Aos 15 minutos de projeção, fico em dúvida entre ficar preso na poltrona ou sair para respirar o ar poluído da rua. É que o estilo visual com o qual a história é contada me deixa nervoso. Fico tonto com o uso contínuo do olho de peixe, das grandes angulares, da câmera baixa. Supõe-se que a linguagem da câmera sirva para contar a história. Mas essa linguagem me deixa doente e tampouco me fascinam inicialmente as infinitas misérias da corte na qual reina Anne. E o jargão coloquial é muito lascivo, as situações são grotescas, tudo é muito moderno para um público de iniciados. Mas resisto um pouco mais, e o que vejo e ouço acaba me envolvendo. Sem excessos. Fico progressivamente intrigado sobre como acabará esta história sobre o poder absoluto utilizado para comprar sexo e, talvez, um pouco de amor. Esta rainha ciclotímica, entusiasta e depressiva, doente e sexualmente voraz, cercada por 17 coelhos com os quais pretende substituir emocionalmente as 17 criaturas que perdeu, e a complexa relação que estabelece com suas duas amantes, senhoras muito oportunistas, uma aristocrata com papel de soberana na sombra e a outra, uma profissional da sobrevivência que descobre que pode encontrar um lugar ao sol compartilhando a cama da rainha depois de ter engolido tanta merda, vão me intrigando progressivamente, os diálogos são perspicazes, o comportamento dos personagens é corrosivo e complexo.

Mas, acima de tudo, me deparo com a hipnótica e admirável interpretação de três atrizes privilegiadas. Não conhecia Olivia Colman, a intérprete da rainha Anne. Seguirei seus passos atentamente. Sempre gostei de tudo em Rachel Weisz. E a jovem Emma Stone é muito boa, convincente em variados trabalhos, tem um presente e um futuro esplêndidos. As três atrizes foram indicadas ao Oscar 2019: Colman concorre na categoria Melhor Atriz e Weisz e Stone disputam a estatueta de Melhor Atriz Coadjuvante.

A FAVORITA

Direção: Yorgos Lanthimos.

Intérpretes: Olivia Colman, Emma Stone, Rachel Weisz, Nicholas Hoult, Mark Gatiss.

Gênero: Histórico. Reino Unido, 2018.

Duração: 119 minutos.

Indicações ao Oscar 2019: A Favorita concorre em dez categorias no Oscar deste ano, entre eles o de melhor filme., melhor diretor e melhor roteiro original.

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