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Ataques à liberdade de imprensa aumentam em 2018

Repórteres sem Fronteiras contabiliza 63 profissionais da mídia assassinados neste ano, 348 presos e 60 sequestrados. No Brasil, foram dois assassinatos, segundo o Comitê para Proteção dos Jornalistas

Rosario G. Gómez
Manifestação em abril em Bratislava depois da morte do repórter Jan Kuciak.
Manifestação em abril em Bratislava depois da morte do repórter Jan Kuciak.Radovan Stoklasa (REUTERS)
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O assassinato do colunista do Washington Post, Jamal Khashoggi, na sede da Embaixada da Arábia Saudita em Istambul, foi o que atraiu a maior atenção e cobertura da mídia, mas para os profissionais da área, 2018 tem sido particularmente sangrento. Quase no final do ano, a organização Repórteres Sem Fronteiras (RSF) contabiliza 63 jornalistas assassinados, ante 55 no ano anterior, número ao qual se somam 348 presos e 60 sequestrados.

O relatório não faz menção ao Brasil, mas de acordo com o Comitê de Proteção dos Jornalistas (CPJ), outra organização internacional, dois jornalistas foram assassinados neste ano: Jairo Sousa e Jefferson Pureza Lopes, ambos radialistas.

A violência contra a imprensa tem acontecido em países em paz. Na União Europeia, ao assassinato em 27 de janeiro do jornalista eslovaco Jan Kuciak, que estava investigando um caso de corrupção, junta-se o atentado um ano antes que matou a maltesa Daphne Caruana Galizia. Nos Estados Unidos, um ataque a tiros contra a redação do jornal The Capital Gazette tirou a vida de cinco pessoas, um atentado que colocou o país entre os mais letais do mundo para a imprensa.

O ódio contra a mídia se espalha por todos os países como uma epidemia. O presidente dos EUA, Donald Trump, qualifica os jornalistas como "inimigos do povo" e, na Polônia, a nova lei sobre meios de comunicação levou a demissões em massa e ao estrangulamento econômico de publicações críticas. O Brasil também segue na mesma esteira, já que assistiu a um verdadeiro linchamento virtual de jornalistas durante a eleição, com diversos ataques proferidos, inclusive, pelo presidente eleito Jair Bolsonaro. Os regimes totalitários da Nicarágua e da Venezuela redobraram a censura governamental. Em alguns casos atacam as sedes de jornais e em outros restringem o acesso ao papel para punir jornais impressos que não concordam com o Governo. Na Espanha, a apreensão policial dos celulares de dois redatores da Europa Press e do Diario de Mallorca provocou uma onda de críticas.

A Incitação ao ódio, expressa por líderes políticos, religiosos e empresários sem escrúpulos, tem "consequências dramáticas e leva a um aumento muito preocupante das violações dos direitos dos jornalistas", alerta o secretário-geral da RSF, Christophe Deloire. Os sentimentos de ódio encontram um terreno fértil nas redes sociais, e no Facebook e no Twitter a aversão à imprensa é fomentada.

Esse ódio resultou em um aumento notável na violência contra jornalistas, que alcança um nível sem precedentes. Todas as cifras –tanto de assassinatos e prisões, como de desaparecimentos forçados– aumentaram. A violência contra os profissionais deu um salto em relação a outros anos, segundo o balanço da RSF, elevando para 80 o número de jornalistas mortos enquanto realizavam seu trabalho (8% a mais que no ano passado), se forem considerados também os colaboradores da mídia e os chamados jornalistas-cidadãos.

Com 15 profissionais mortos no ataque mais mortífero desde a queda do Taleban, em 2001, o Afeganistão mais uma vez se coloca à frente dos países mais letais para a imprensa. Depois, vêm a Síria (com 11) e o México (9), que ainda é o país não envolvido em uma guerra mais perigoso para exercer o ofício e onde as medidas de proteção (como o dispositivo botão de pânico) se mostraram ineficazes. No Iêmen foram mortos oito repórteres, alguns deles em decorrência de bombas e outros, na prisão, vítimas de maus-tratos.

A maior prisão

O número de jornalistas presos também aumentou: há 348, em comparação com 326 em 2017. Como naquele ano, mais da metade está nas prisões de cinco países: Irã, Arábia Saudita, Egito, Turquia e China. O regime de Recep Tayyip Erdogan transformou a Turquia na maior prisão do mundo para os profissionais da mídia. "O fato de que em 2018 o número de jornalistas detidos diminuiu, em comparação com 2017, não engana: muitos jornalistas foram soltos em liberdade condicional, mas ainda aguardam julgamento de apelação", disse a RSF.

O número de jornalistas sequestrados chega a 60, em comparação com 54 no ano passado, e quase todos são mantidos em cativeiro no Oriente Médio. O grupo terrorista que se autodenomina Estado Islâmico é o principal sequestrador (tem 24 reféns) e sua forma de agir contra a imprensa está sendo imitada pelos houthis, do Iêmen, que têm em seu poder 16 profissionais.

Também um país europeu, a Ucrânia, usa essas táticas para intimidar a mídia. Apoiadas pela Rússia, as forças separatistas da autoproclamada República Popular de Donetsk mantêm detido um locutor que trabalha para a Radio Free Europe, acusado de ser espião. A organização RSF também registra o desaparecimento de três jornalistas: dois na América Latina e um na Rússia. Uma das poucas boas notícias no relatório é que, pela primeira vez desde 2003, nenhum repórter foi morto no Iraque.

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