_
_
_
_
_
Coluna
Artigos de opinião escritos ao estilo de seu autor. Estes textos se devem basear em fatos verificados e devem ser respeitosos para com as pessoas, embora suas ações se possam criticar. Todos os artigos de opinião escritos por indivíduos exteriores à equipe do EL PAÍS devem apresentar, junto com o nome do autor (independentemente do seu maior ou menor reconhecimento), um rodapé indicando o seu cargo, título académico, filiação política (caso exista) e ocupação principal, ou a ocupação relacionada com o tópico em questão

Lopetegui, um treinador do Real Madrid em chamas

O presidente do clube pensa em mudar o treinador, o treinador em mudar cinco jogadores, e o torcedor em rasgar a carteirinha

Jorge Valdano
Julen Lopetegui no primeiro plano durante treino do Real Madrid.
Julen Lopetegui no primeiro plano durante treino do Real Madrid.GABRIEL BOUYS (AFP)

Meio-campo branco

Na ausência de gênios, o clássico entre BarcelonaReal Madrid se transfere para o centro do campo. Casemiro é cimento armado, farol que serve de referência para o time após a perda da bola. No entanto, na hora de distribuir as bolas que rouba com precisão cirúrgica, tem um problema: os craques que o rodeiam. Qualquer um fica mal diante de tal companhia. Quem tem mais espírito organizador é Kroos, com o carisma de uma calculadora: não impressiona nem falha. Toca, toca e toca, e quando a jogada parece morrer asfixiada, muda de frente para ajudá-la a respirar. Na distribuição de papéis, cabe a Modric mudar o ritmo da jogada com a bola colada aos pés, a cabeça erguida e o cérebro alerta, como um sábio. Pode ser que faça uma jogada com Isco, um desses jogadores que trai a tendência. Contradizendo a lei da sistematização que transforma um jogo em uma linha de montagem, Isco faz o que bem entende, mas divinamente.

Mais informações
Sergio Ramos: “O Real Madrid não vai deixar de ganhar só porque Cristiano foi embora"
'Messidependência? Sim, obrigado', por Rafa Cabeleira

Meio-campo azul-grená

Busquets joga bola como se não existisse o acaso. Sua precisão e astúcia têm a ciência das ruas e servem para desarmar, distribuir e ficar onde deve, que é exatamente o lugar por onde cedo ou tarde passará a bola ou não passará o rival. Sua inteligência já atingiu o ponto máximo, que nada mais é que a simplicidade. Ao seu lado vai e vem Rakitic, croata que já passou pelo Sevilla e não tem nada a ser destacado ou criticado. Algo importante: joga de meio-campista no Barça sem se sentir culpado por não ter sido formado em La Masía. Arthur é o terceiro homem. Dá continuidade, lógica e clareza ao jogo para encher o centro do campo depois do vazio deixado pelos inesquecíveis Xavi e Iniesta. Como a nostalgia é muito ruim, bastou que Arthur mexesse o pescoço como Xavi para ser adotado pelo Camp Nou em tempo recorde.

Luz, câmera, ação

Quando se perde, o futebol pede ação. Às vezes, não fazer nada é o mais inteligente, mas ninguém sai nos jornais nem entra na história por não fazer nada. Assim, o presidente pensa em mudar o treinador, o treinador em mudar cinco jogadores, e o torcedor em rasgar a carteirinha de sócio. Ação. O Real Madrid está queimado pelos maus resultados, mas as chamas da mídia só atingem Julen Lopetegui. Encurralado por perguntas lançadas com mira telescópica, Lopetegui se esquiva das balas como pode em um desesperado exercício de sobrevivência. Ele é criticado por não rir e, se fosse o oposto, perguntariam de que estaria rindo. Em tempos assim, as entrevistas coletivas são um calvário, a menos que você se chame Zidane, um homem tranquilo que surfava em águas turbulentas.

O inesperado mestre

A relação com a imprensa é um fator crítico para os treinadores. Diante da pressão cada dia mais concentrada em sua figura, eles têm de fazer um impossível exercício de equilíbrio. Nas entrevistas, as respostas têm de contentar muita gente: o jornalista que pergunta, mas também os jogadores, os torcedores, o presidente do clube... Não é de estranhar que às vezes o pobre treinador acabe se enrolando. Ou se contradizendo. Quando Zizou chegou ao Real Madrid, cheguei a temer por ele. Estava convencido de que sua timidez e o fato de o espanhol não ser sua língua nativa o fariam viver um calvário em cada aparição. Mas Zidane foi um mestre que nos ensinou truques que valem ouro: saber exatamente o que não se pode dizer, substituir a última palavra por um sorriso e, o mais importante, falar apenas para os jogadores.

Mais informações

Arquivado Em

Recomendaciones EL PAÍS
Recomendaciones EL PAÍS
_
_