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As opiniões que unem e separam os eleitores de Bolsonaro e Haddad

A maioria dos dois lados é contra privatizações e a favor da manutenção de programas sociais. Maiores discordâncias são em relação a porte de arma e reforma trabalhista, indicam pesquisas

Camisetas com motivos políticos, no Rio de Janeiro.
Camisetas com motivos políticos, no Rio de Janeiro.RICARDO MORAES (REUTERS)
Rodolfo Borges
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O tom de acirramento na reta final da campanha presidencial sugere um país partido entre grupos irreconciliáveis. Mas as pesquisas de intenção de voto feitas ao longo deste segundo turno mostram que os eleitores do deputado Jar Bolsonaro (PSL-RJ) e do ex-prefeito Fernando Haddad (PT) não são tão diferentes assim, ao menos na forma como enxergam algumas das questões em debate nesta eleição. Os dois eleitorados tendem a se posicionar contra a privatização de empresas públicas, são a favor da manutenção de programas sociais e contra o aumento da idade mínima de aposentadoria para 65 anos — uma das consequências de uma possível reforma da Previdência. As maiores discordâncias, segundo pesquisas de institutos como Datafolha, FSB e DataPoder360, se restringem à liberação do porte de armas, à reforma trabalhista realizada por Michel Temer e à possibilidade de o Governo federal intervir em sindicatos.

A presença do economista liberal Paulo Guedes na equipe de Bolsonaro não parece emocionar a maioria de seus eleitores, já que apenas 37% deles acham que o Governo deve vender todas ou parte de suas estatais, segundo pesquisa DataPoder360. Quando o assunto é a venda da Petrobras, o apoio é ainda menor entres os eleitores do deputado do PSL: apenas 30%. A rejeição dos eleitores de Haddad à venda de estatais (68%) e da Petrobras (75%) é muito maior, mas as ressalvas de quem vota em Bolsonaro à venda das empresas públicas pode dificultar, caso se confirme sua eleição no domingo, a agenda de privatizações prometida por Guedes — agenda que não tem lá um apoio muito efusivo do próprio Bolsonaro. Pesquisa encomendada pelo banco BTG Pactual à FSB aponta o eleitorado do capitão reformado dividido sobre o assunto, com 49% contra a venda de empresas do Governo e 43% a favor.

Segundo um pesquisador envolvido nessa pesquisas (ele prefere não se identificar por questões contratuais), existe uma certa homogeneidade do eleitorado brasileiro em relação a questões específicas. Conceitos como esquerda, direita e centro, usados de forma corriqueira no debate político, não são muito claros para os eleitores. É por isso que os institutos aplicam uma série de perguntas para poder montar uma "escala ideológica". Com base em indagações sobre a pena de morte, o aborto ou o porte de armas, por exemplo, os institutos traçam o perfil de cada eleitorado. Pesquisa CNT/MDA feita no início da campanha já indicava a prevalência de mais eleitores (61,1%) a favor da “redução de privilégios de servidores públicos e políticos” e da redução de impostos (79,4%). Na média, como mostram as pesquisas sobre quem vota em Bolsonaro e Haddad, o eleitor médio do Brasil é muito parecido.

A última manifestação a favor de Bolsonaro em São Paulo nesta campanha reuniu pessoas mais conservadoras, como identificou levantamento feito na avenida Paulista, mas esse é apenas um pedaço do eleitorado do deputado. A maior parte dos eleitores de ambos os candidatos à presidência concorda, em proporções bem próximas, sobre a manutenção de programas sociais, por exemplo. Em pergunta que menciona diretamente o programa Bolsa Família, a FSB identificou apoio de 78% dos eleitores de Bolsonaro e 90% dos de Haddad. Sobre a proposta de redução do imposto de renda para quem ganha até cinco salários mínimos, defendida pelas duas candidaturas que disputam o segundo turno, o apoio é de 80% para quem vota em Bolsonaro e de 68% quem vota em Haddad. As avaliações também são muito parecidas quando o assunto é "ensino a distância para o ensino fundamental", uma proposta de Bolsonaro, com aprovação de 48% dos eleitores do candidato do PSL e 53% dos eleitores do petista.

Outro ponto de entendimento: 72% daqueles que votam em Bolsonaro são contra o aumento da idade mínima de aposentadoria para 65 anos, assim como 87% daqueles que votam em Haddad. Segundo a última pesquisa Datafolha, os dois lados também se opõem à proibição de greves (70% para Bolsonaro e 75% para Haddad), à proibição da existência de partidos políticos (57% de quem vota no deputado e 67% de quem vota no ex-prefeito), à "censura de jornais, TV e rádio" (71% e 74%, respectivamente) e ao fechamento do Congresso Nacional pelo Executivo (67% e 78%).

Os posicionamentos sobre torturar suspeitos para obter informações e controlar o conteúdo das redes sociais também são muito próximos — no primeiro caso, 78% dos eleitores de Bolsonaro são contra, assim como 82% dos eleitores de Haddad; no segundo, os percentuais são quase idênticos, com apoio de 43% e 42%, respectivamernte, para o controle das redes. Nesta campanha, plataformas como Facebook e WhatsApp estiveram no centro do debate político junto com as propostas de campanha e os ataques retóricos desferidos pelos candidatos.

Divergências

As opiniões dos dois eleitorados se tornam um pouco mais diferentes, mas seguindo a mesma tendência, quando se trata de intervenção do Governo federal em sindicatos, outro tema testado pelo Datafolha. Metade dos eleitores de Bolsonaro (50%) se diz favorável, enquanto apenas 32% dos eleitores de Haddad apoiam a ideia. As maiores diferenças são sentidas na avaliação sobre a manutenção da reforma trabalhista – defendida por 56% do eleitores do deputado do PSL na pesquisa da FSB e refutada por 53% dos eleitores do petista — e quando a questão é o porte de armas. Enquanto 63% daqueles que votam em Bolsonaro se dizem a favor da liberação, 90% dos eleitores de Haddad são contrários.

Além disso, os eleitores de Bolsonaro e Haddad vão às urnas com expectativas e anseios diferentes. A principal razão que leva os eleitores do deputado para as urnas é a renovação política e o desejo de mudança, verbalizado por 30% deles ao Datafolha. Outros 25% optaram por ele porque rejeitam o PT. Somados, esses dois motivos ultrapassam metade do eleitorado do capitão reformado. Além disso, 17% pretendem votar nele por suas propostas em relação à segurança e 13% por sua imagem ou valores pessoais.

No caso do voto em Haddad, a rejeição a Bolsonaro é o motivo mais alegado, por 20% de seus eleitores. Apenas 15% mencionam seu plano de governo como razão de preferência, enquanto 13% apontaram alinhamento com o partido (PT) e 11%, influência do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, cuja candidatura foi substituída pela de Haddad após o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) negar seu registro, por conta da condenação em segunda instância por corrupção passiva.

Ditadura

As pesquisas deste segundo turno também indicam uma distinção entre a percepção dos dois eleitorados. A maioria dos eleitores de Bolsonaro (64%) e de Haddad (77%) diz que a democracia é a melhor forma de governo, mas aqueles que votam no petista enxergam em maior proporção a possibilidade de uma ditadura se instalar no país. Não há nenhuma chance de que isso ocorra na avaliação de 65% dos eleitores de Bolsonaro, indica o Datafolha. Por outro lado, 53% dos eleitores de Haddad dizem que há muita chance de que uma nova ditadura se instale no país. Os dois eleitorados também divergem sobre a herança do regime militar (1964-1985). Para 48% dos eleitores de Bolsonaro, a ditadura “deixou mais realizações positivas do que negativas”. Para 70% dos eleitores de Haddad, as decorrências foram negativas.

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