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China avança na eliminação do controle total da natalidade

País enfrenta rápido envelhecimento populacional após quatro décadas de restrições ao número de filhos

Macarena Vidal Liy
Três recém-nascidos em um hospital na China, imagem de arquivo
Três recém-nascidos em um hospital na China, imagem de arquivoPatty Chen (REUTERS)

Será que a China está se preparando para eliminar completamente as restrições ao número de filhos que um casal pode ter? Cada vez mais sinais indicam que sim. O último foi nesta segunda-feira, dia 27. O projeto do novo Código Civil, resultado de uma extensa reforma, não faz menção ao “planejamento familiar”, termo que, no jargão burocrático, designa o polêmico controle de natalidade imposto há quatro décadas.

O Diário da Procuradoria, uma plataforma oficial de notícias sobre o Ministério Público chinês, anunciava a mudança em sua conta nas redes sociais. O projeto será examinado em caráter preliminar nesta semana durante a reunião do comitê executivo da Assembleia Nacional Popular, o parlamento.

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O novo Código Civil entrará em vigor em 2020. Se forem mantidas as mudanças anunciadas na plataforma, sua introdução eliminará definitivamente do país mais populoso do mundo um detestado sistema de controle de natalidade, imposto mediante multas pesadas, mas que também recorreu com frequência às esterilizações e abortos forçados. Um sistema muito criticado por especialistas e por defensores dos direitos reprodutivos, que deixou como legado um acelerado envelhecimento populacional e um significativo desequilíbrio em favor do gênero masculino na proporção de nascimentos.

A China adotou a política de filho único em 1979 na tentativa de limitar o crescimento de uma população que hoje ultrapassa 1,37 bilhão de pessoas. Sempre houve exceções, especialmente na zona rural e para as minorias étnicas, mas a regulamentação foi mantida até 2016. Naquele ano, finalmente se permitiu um segundo filho a todos os casais chineses que assim desejarem.

A flexibilização não surtiu o efeito que as autoridades queriam. A esperada explosão da natalidade não chegou. Em 2016, imediatamente depois que se permitiu o segundo filho, nasceram 17,9 milhões de crianças, de acordo com a Agência Nacional de Estatísticas. Apenas 1,3 milhão a mais do que em 2015 e metade do que o Governo previa. Passada a euforia inicial, em 2017 o número foi ainda menor, 17,2 milhões de novos bebês. Muito longe dos 20 milhões calculados pelas autoridades.

Para a socióloga Hu Xiaojiang, da Universidade Normal de Pequim, a mudança “deveria ter sido feita muito antes, dez anos atrás. Agora é difícil remediar a situação. Mas antes tarde do que nunca. Segundo ela, mesmo que o planejamento familiar seja completamente eliminado, “o efeito não será muito evidente. Serão necessários outros incentivos para os casais quererem mais filhos.”

O desejo de ter mais filhos é limitado. Como acontece em muitas outras sociedades, o custo econômico da educação de um segundo filho, ou de uma casa onde caibam pelo menos quatro pessoas, faz muitos casais jovens pensarem duas vezes. Casais formados, em muitos casos, por filhos únicos que cresceram sendo ensinados que o modelo ideal de família era o de um pai, uma mãe e um filho.

Algumas províncias já tomaram medidas como prolongar a licença-maternidade; outras propõem abonos para cada novo filho. Dois acadêmicos propuseram uma solução contrária que tem gerado intensa polêmica nas redes sociais: penalizar com taxas quem tiver menos de dois filhos e destinar os recursos para um “Fundo Maternidade”.

O novo Código Civil, de acordo com o Diário da Procuradoria, também propõe dificultar os divórcios. Uma das alterações introduzidas prevê um prazo de um mês antes de começar a tramitar um pedido de divórcio para permitir que o casal se reconcilie.

A proposta gerou inúmeros comentários na internet chinesa. “Eles querem mais filhos e menos divórcios”, ironizava um internauta no Weibo, o Twitter chinês. Outro dizia para “devolver com juros o dinheiro das multas cobradas por ter mais filhos”.

A pista dada pela plataforma do Ministério Público não é a única que circulou nas últimas semanas. No início deste mês, os Correios emitiram um selo para comemorar o próximo ano do horóscopo chinês, o Ano do Porco, em que uma família suína aparece com três leitõezinhos. Uma trivialidade? Pode ser. Mas há precedentes. Em 2015, os Correios já anteciparam o relaxamento da política do filho único, que viria um ano depois. No selo comemorativo do Ano do Macaco, também havia uma família: pai e mãe símios com dois pequenos primatas.

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