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Senhor presidente; senhora vice-presidenta

Uma dezena de Estados da América Latina tem uma mulher como número dois do Executivo, mas não há nenhuma presidenta em toda a região

Elvira Palomo
Fotografias de arquivo de 6 das 11 vice-presidentas latino-americanas. A dominicana Margarita Cedeño, a uruguaia Lucía Topolansky, a colombiana Marta Lucía Ramírez, a costarriquenha Epsy Campbell, a peruana Mercedez Araoz e a equatoriana María Alejandra Vicuña.
Fotografias de arquivo de 6 das 11 vice-presidentas latino-americanas. A dominicana Margarita Cedeño, a uruguaia Lucía Topolansky, a colombiana Marta Lucía Ramírez, a costarriquenha Epsy Campbell, a peruana Mercedez Araoz e a equatoriana María Alejandra Vicuña.EFE

A Colômbia terá a primeira mulher no cargo de vice-presidente de sua história. A chegada da ex-ministra Marta Lucía Ramírez ao posto em agosto confirma uma tendência na América Latina, onde a presença das mulheres continua crescendo no pelotão da frente da política, apesar do fato de que, atualmente, não há nenhuma presidenta. Com o fim do segundo mandato de Michelle Bachellet em março deste ano, foi encerrada uma etapa na região em que quatro mulheres coincidiam na liderança de seus países. O peso da vice-presidência depende de cada país, mas as candidaturas paritárias —cada vez mais frequentes numa época em que o feminismo ganha força— abrem um espaço público que dá visibilidade às mulheres em um campo ainda dominado pelos homens.

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Com perfis e trajetórias muito diferentes, na América Latina há mais de uma dezena de vice-presidentas. "Algumas porque fizeram uma carreira política e era uma consequência lógica que estivessem lá, e há outras que foram nomeadas nas chapas porque há uma espécie de tendência de que isso é politicamente correto", reflete a professora da Universidade de Buenos Aires, Virginia García Beaudoux, que destaca a longa trajetória da vice-presidenta de seu país, Gabriela Michetti. Na Venezuela, país mergulhado em uma grave crise, na semana passada o presidente Nicolás Maduro, em uma mudança de direção de seu Governo, nomeou a ex-chanceler Delcy Rodríguez como seu braço direito. No caso da Colômbia, os dois candidatos que passaram para o segundo turno —o conservador Iván Duque e o ex-prefeito de esquerda Gustavo Petro— tiveram uma mulher como candidata à vice-presidência. Beaudoux, consultora política especializada em questões de gênero e autora do livro Quién teme el poder de las mujeres? (Quem tem medo do poder das mulheres?), vê em algumas das alianças políticas da região certa "hipocrisia de uma sociedade machista", mas acredita que, seja qual for o motivo, é necessário "aproveitar toda a visibilidade, ocupar todos os espaços que possam ser ocupados". "Acho que, de todas as maneiras, é um avanço."

O poder e as funções da vice-presidência variam muito de país para país; na Colômbia, é uma figura mais diplomática, explica Carlos Malamud, pesquisador sobre América Latina do Real Instituto Elcano. Em outros casos, pode ser uma figura de muito peso, como ocorre na Nicarágua com Rosario Murillo, embora sua importância, destaca, "não venha de sua posição, mas de sua relação familiar com o presidente, replicando um padrão negativo na região, a questão matrimonial como via de acesso". Malamud ressalta a presença de mulheres em outras áreas da política e cita como exemplo o apoio decisivo das deputadas no debate sobre a descriminalização do aborto na Argentina. "Depende de cada caso, o que é verdade é que o protagonismo feminino na política latino-americana está crescendo", assegura.

Marta Lucía Ramírez. Colômbia (2018)

Marta Luzia Ramírez.
Marta Luzia Ramírez.EFE

A política conservadora, advogada e com experiência no setor privado, tem uma longa trajetória com passagens em diferentes governos. Durante a presidência de César Gaviria (1990-1994), do Partido Liberal Colombiano, foi vice-ministra de Comércio Exterior. Em 1998, comandou a mesma pasta como ministra com Andrés Pastrana. Posteriormente, foi embaixadora da Colômbia na França, até que, em 2002, o presidente Álvaro Uribe ofereceu-lhe o cargo de ministra da Defesa, uma época ainda com a guerrilha das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC) ativa. (Em 2003, a então ministra renunciou por um confronto com a liderança militar sobre a reestruturação do ministério).

Ramírez, de 63 anos, foi eleita senadora pelo Partido da Unidade em 2006, e, quatro anos depois, fez sua primeira tentativa de concorrer às eleições presidenciais, mas perdeu as primárias do Partido Conservador. A segunda foi em 2014, eleição vencida por Juan Manuel Santos. Este ano também não foi a escolhida para representar o bloco conservador, mas em março anunciaram que concorreria com Iván Duque como candidata à vice-presidência.

Delcy Rodríguez Venezuela (2018)

Delcy Rodríguez.
Delcy Rodríguez.EFE

O presidente Nicolás Maduro anunciou mudanças em seu Gabinete na semana passada. Uma das mais significativas foi a nomeação da ex-ministra de Relações Exteriores, Delcy Rodríguez, como vice-presidenta. Rodríguez (1969), advogada e política, pertence ao círculo de confiança do presidente e ocupou vários cargos. Desde agosto de 2017, ocupava a presidência da Assembleia Nacional Constituinte, criada por Maduro no ano passado para redigir uma nova Constituição. Anteriormente, foi ministra da Comunicação e Informação (2013-2014), posto agora ocupado por seu irmão Jorge Rodríguez. Foi chefa da diplomacia venezuelana como ministra de Relações Exteriores e representou o Governo da Venezuela no diálogo com a oposição, do qual participa o ex-primeiro-ministro da Espanha, José Luís Rodríguez Zapatero.

Epsy Campbell. Costa Rica (2018)

Epsy Campbell.
Epsy Campbell.EFE

A ex-deputada é também ministra de Relações Exteriores. Campbell (1963), política e economista, não é a primeira mulher a ser vice-presidenta na Costa Rica, mas sim a primeira mulher negra a ocupar esse cargo. Durante sua trajetória política foi deputada do Partido Ação Cidadã (PAC) em dois mandatos (2002-2006; 2014-2018), e entre 2005 e 2009 presidiu o seu partido, no qual milita desde sua fundação.

Paralelamente à sua atividade política, foi uma das líderes do movimento de afrodescendentes na América Latina. Foi coordenadora da Rede de Mulheres Afro-Latino-Americanas e Afro-Caribenhas (1997-2001) e do Fórum de Mulheres para a Integração Centro-Americana (1996-2001). É uma das fundadoras do Centro de Mulheres Afro-Costarriquenhas e do fórum Parlamento Negro das Américas. Publicou artigos sobre sexismo, racismo e integração. Em suas próprias palavras: “Feminizar a política é o desafio do século XXI”.

María Alejandra Vicuña. Equador (2018)

María Alejandra Vicuña.
María Alejandra Vicuña.EFE

Em janeiro passado, Vicuña assumiu o cargo de vice-presidente no lugar de Jorge Glas, condenado por sua participação no esquema de corrupção da empreiteira brasileira Odebrecht. Formada em direito (1978), estava havia apenas cinco meses como ministra de Desenvolvimento Urbano e Moradia quando o presidente Lenín Moreno a designou vice-presidenta interina depois da detenção de Glas. Posteriormente o mandatário apresentou à Assembleia Nacional uma lista tríplice de candidatas ao cargo – composta também pela chanceler María Fernanda Espinosa e pela ministra de Justiça, Rosana Alvarado.

Vicuña, de 40 anos, está vinculada desde a juventude ao partido Aliança País. Foi eleita deputada em 2009 e 2013, e nesses mandatos participou de várias comissões de saúde e educação.

Mercedes Araoz. Peru (2018)

Mercedez Araoz.
Mercedez Araoz.EFE

A crise de Governo causada pela renúncia do presidente Pedro Pablo Kuczynski, em março, levou Araoz, até então segunda-vice-presidenta, a se tornar a primeira na linha de sucessão do novo Executivo encabeçado por Martín Vizcarra. Formada em Economia, entrou no setor público em 2002 como assessora do vice-ministro de Comércio Exterior. Ocupou as carteiras de Comércio Exterior e Turismo, a de Produção e a de Economia no segundo Governo de Alan García (2006-2011). Em 2011 se apresentou como candidata presidencial pelo Partido Aprista Peruano (PAP), mas acabou renunciando. Kuczynski a incluiu em sua chapa em 2016.

Alicia Pucheta. Paraguai (2018)

Alicia Pucheta.
Alicia Pucheta.Reuters

A ex-juíza da Corte Suprema de Justiça também fez história em seu país ao ser designada depois da renúncia de Juan Afara. Pucheta pode se tornar inclusive a primeira mulher a presidir o Paraguai – por um breve período – se o Congresso aceitar a renúncia de Horacio Cartes antes do final do seu mandato, em agosto, para tomar posse como senador e garantir seu assento. O Paraguai teve eleições em 20 de abril, vencidas pelo candidato do governista Partido Colorado, Mario Abdo.

Luzia Topolansky. Uruguai (2017)

Luzia Topolansky.
Luzia Topolansky.EFE

A ex-guerrilheira tupamara, que dedicou toda sua vida à política, se tornou vice-presidenta em setembro de 2017, depois da demissão de Raúl Sendic por causa de um escândalo de malversação de recursos públicos. Era então senadora. Topolansky, de 73 anos, pertence ao Movimento de Participação Popular (MPP), integrado à coalizão de esquerda Frente Ampla, e é também esposa do ex-presidente José Mujica (2010-2015). Casaram-se em 2005, numa cerimônia íntima, depois de compartilharem trincheira política durante anos, e antes que Mujica fosse eleito presidente. Conhecida em sua época de clandestinidade pelo pseudônimo de Ana, é uma líder política de ampla trajetória parlamentar por mérito próprio. Militou no Movimento de Libertação Nacional-Tupamaros (MLN-T) com sua irmã gêmea María Elia, uma guerrilha urbana de esquerda radical. Foi presa em 1971, escapou da prisão e voltou para a cadeia, onde passou 13 anos até ser anistiada, em 1985. Depois da ditadura militar (1973-1985) fundou com outros ex-tupamaros o MPP, no qual ocupou diversos cargos. Foi eleita vereadora, deputada e senadora (a mais votada do país em 2009 e 2014).

Rosario Murillo. Nicarágua (2017)

Rosario Murillo.
Rosario Murillo.EFE

Ativista política do movimento sandinista, escritora e política, Murillo é primeira-dama desde 2007. Seu marido, o presidente Daniel Ortega, a designou candidata à vice-presidência pela governista Frente Sandinista de Libertação Nacional (FSLN) nas questionadas eleições de 2016, que eles venceram. Murillo já participava extraoficialmente do Governo. É promotora de uma doutrina que mistura catolicismo, misticismo, símbolos pré-hispânicos e sandinismo. Em uma etapa anterior, foi deputada (1984-1990) durante o primeiro Governo de Ortega, depois da ditadura de Anastasio Somoza.

Gabriela Michetti. Argentina (2015)

Gabriela Michetti.
Gabriela Michetti.EFE

Foi a deputada mais votada pela cidade de Buenos Aires em 2009. Nascida em 1965, formada em Relações Internacionais, já era como deputada considerada o braço direito de Mauricio Macri, que a escolheu como companheira de chapa para as eleições de 2015. Era uma dirigente conhecida, que anteriormente tinha sido vice-prefeita de Buenos Aires e senadora, além de ter disputado o Governo da capital. Em 1994, dirigindo sem cinto de segurança, sofreu um acidente que a deixou paraplégica.

Isabel de Saint Malo. Panamá (2014)

Isabel De Saint Mau.
Isabel De Saint Mau.EFE

É vice-presidenta e chanceler do Panamá no Governo do Juan Carlos Varela desde 2014. O mandatário a escolheu como candidata independente e foi a primeira mulher em ocupar ambos os cargos no país. Embora não tivesse experiência política, havia trabalhado entre 2001 e 2008 no Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento e sido embaixadora do Panamá na ONU. É formada em Relações Internacionais e tem 49 anos. Entre os objetivos que cita como vice-ministra estão a transparência, a luta contra a corrupção e a igualdade de gênero.

Margarita Cedeño.
Margarita Cedeño.EFE

Margarida Cedeño. República Dominicana (2012)

A advogada, de 53 anos, assumiu o cargo como número dois de Danilo Medina em 2012, depois de oito anos como primeira-dama com Leonel Fernández. Cedeño cogitou disputar a presidência pelo Partido da Libertação Dominicana (PLD), ao qual seu marido pertencia, mas afinal decidiu sair como vice. Durante seus anos de primeira-dama participou de vários programas sociais que lhe deram popularidade no país, embora também tenha sido acusada de ter aproveitado sua visibilidade para impulsionar sua carreira política.

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