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Kuczynski renuncia à presidência do Peru para evitar impeachment no Parlamento

Guerra dos irmãos Fujimori expôs plano de compra de votos para evitar deposição de Pedro Pablo Kuczynski

Kuczynski, e a primeira-ministra Araoz, nesta terça-feira em Lima.
Kuczynski, e a primeira-ministra Araoz, nesta terça-feira em Lima.MARIANA BAZO (REUTERS)
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O presidente peruano Pedro Pablo Kuczynski (PPK) renunciou à presidência nesta quarta-feira, antecipando o resultado de uma votação no Parlamento que iria destituí-lo do cargo. Sua decisão foi antecipada diante da guerra dos irmãos Fujimori, que voltam a fazer história no Peru e a afundá-lo numa profunda crise política de saída incerta.  Keiko fez com que fossem difundidos vídeos nos quais se vê seu irmão Kenji negociando com um parlamentar fujimorista a salvação de PPK em troca de obras em suas províncias. Kenji pedia assim aos fieis a sua irmã que a traíssem. Mas a consequência da guerra interna é que ficou às claras a manobra para salvar PPK em troca de dinheiro, embora seja em forma de investimentos.

Nos vídeos, Kenji aparece como um negociador em nome do presidente. PPK concedeu indulto ao patriarca pouco depois de Kenji conseguir os votos suficientes dentro de seu grupo para salvar o mandatário peruano numa votação de dezembro. O compromisso tão grosseiro gerou um escândalo de tais dimensões no Peru que alguns parlamentares que iam votar contra a destituição decidiram mudar seu voto. A derrota era mais que provável.

A demissão se produz a duas semanas de que Lima se converta na capital da região ao acolher a Cúpula das Américas, a qual estão previstas a chegada do presidente dos EUA Donald Trump e o cubano Raúl Castro. A cúpula teria, assim, um novo anfitrião. O substituto mais provável é o vice-presidente Martín Vizcarra, um homem respeitado no ambiente político que se fez conhecido pela boa administração como governador de sua província, Moquegua, entre 2010 e 2014. Vizcarra é um engenheiro que veio do mundo da construção.

Um ministro e dois congressistas de Peruanos Pelo Kambio (PPK), partido fundado e liderado pelo mandatário, pediram sua renúncia. Kuczynski visitou nesta quarta-feira o arcebispo de Lima, Juan Luis Cipriani, um personagem muito próximo de Keiko Fujimori, a lideresa da oposição e presidenta da partido Força Popular.

"A investidura presidencial vai para além das pessoas. Precisa-se proteger as instituições. Por isso, com muito pesar, senhor presidente, lhe peço que dê um passo atrás”, tuitou Pedro Olaechea, parlamentar de PPK, que leva as siglas do exbanquero de investimento.

Além disso, o ministro da Habitação, Carlos Bruce, escreveu na mesma rede social: "Nestes momentos difíceis devemos pensar no melhor para nosso país e isso passa por uma mudança democrática", uma mensagem que os meios interpretam como uma despedida do cargo e uma encomenda para que Kuczynski se demitisse.

Enquanto isso, a junta de porta-vozes do Congresso decidiu iniciar um processo de acusação constitucional contra os três congressistas que aparecem em três vídeos e um áudio de negociação de benefício em troca de votos ou abstenções no debate de amanhã. Também inclui os ministros Mercedes Araoz e Bruno Giuffra, mencionados em ditas negociações.

As gravações foram realizadas secretamente pelo congressista keikista Moisés Mamani em reuniões nas quais os parlamentares Kenji Fujimori, Bienvenido Ramírez e Guillermo Bocángel além do advogado pessoal de Kuczynski, Alberto Borea, propunham cenários favoráveis caso ele se abstivesse de votar pela destituição presidencial.

O filho mais novo de Alberto Fujimori, Kenji, converteu-se em aliado do Governo de Kuczynski em dezembro, quando evitou com dez votos a destituição do chefe de Estado, ansiada pela oposição e pela esquerda pelos pagamentos de mais de quatro milhões de dólares da empresa Odebrecht a duas empresas ligadas a Kuczynski na década passada. Três dias depois, o indulto a Fujimori revelou o pacto e supôs uma ruptura com os milhões de antifujimoristas que alçaram PPK ao poder e os deputados de esquerda que também o salvaram nessa votação. Os vídeos revelaram o detalhe das ofertas e terminaram de afundar a imagem do presidente em um país no qual seus máximos mandatários acabam no cárcere -ali está ainda Ollanta Humala- ou imersos por completo em todos os inquéritos. A política peruana nunca se recuperou da devastação que supôs o autogolpe de Fujimori em 1992, quando fechou o Parlamento, e destruiu o sistema de partidos conhecido até então.

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