_
_
_
_
_

OCDE sugere mais recursos no Bolsa Família para reduzir desigualdade no Brasil

Organização diz que programa é a única transferência que chega ao pobre

Agência Senado
Mais informações
Seis brasileiros concentram mesma riqueza que a metade da população mais pobre
Recessão faz quase um milhão de famílias voltarem ao Bolsa Família
Economia tem todos os sintomas de recuperação, mas desemprego persiste

Para estimular um crescimento econômico mais igualitário no Brasil, o país deve aumentar os recursos destinados ao Bolsa Família, já que o programa é o único gasto social verdadeiramente progressivo e que chega ao pobre. A avaliação é da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que fez uma série de recomendações ao Governo nesta semana. Segundo relatório da OCDE, um pacote de reformas que desvinculasse o piso de benefícios previdenciários do salário mínimo e que, ao mesmo tempo, deslocasse as economias que possam ser geradas para o Bolsa Família, poderia ter feito a desigualdade no Brasil diminuir 63% mais rapidamente nos últimos anos. "É importante olhar medidas que limitem os aumentos reais dos benefícios que não atinjam os pobres. Não diminuir, mas somente limitar aumentos futuros e usar essa economia para transferir mais dinheiro para o Bolsa Família. Aumentar o escopo de pessoas que possam utilizar o benefício ", explica Jens Arnold, economista responsável pelo Brasil na OCDE, ao EL PAÍS.

O Bolsa Família é voltado para famílias extremamente pobres (renda per capita mensal de até 85 reais) e pobres (renda per capita mensal entre 85,01 reais e 170 reais). Os beneficiários recebem o dinheiro mensalmente e, como contrapartida, cumprem compromissos nas áreas de saúde e educação. Hoje o Brasil gasta 0,5% do PIB com o Bolsa Família. O benefício máximo para uma família inteira é menos de um terço do salário mínimo. Atualmente, o programa atende pouco mais de 14 milhões de famílias, que recebem, em média, 178,45 reais. De acordo com o documento, esses benefícios têm sido ajustados à inflação de maneira facultativa, mas o ajuste planejado para 2017 foi suspenso até 2018.

Na avaliação de Luis Henrique Paiva, ex-secretário do Bolsa Família e atual pesquisador do Ipea, sem a correção constante do benefício pela inflação, o programa pode acabar perdendo sua eficiência. "Se corre o risco de que o valor do benefício não seja minimamente suficiente para a família se manter. Os reajustes precisam ser feitos", afirmou Paiva em podcast do Ipea sobre desigualdade. Segundo o pesquisador, os aumentos não deveriam tampouco ser dados, como hoje, via decreto. "É preciso retirar o componente político dos reajustes do Bolsa Família.(...) os reajustes ainda são atos políticos são emitidos por decreto pelo presidente em um anúncio. Na hora que isso for incorporado na legislação, eles passam a acontecer como qualquer outro benefício", explica. Ainda segundo o pesquisador, a linha da pobreza aplicada atualmente pelo programa está defasada e abaixo da definida no início do programa Brasil Sem Miséria. Paiva também sugere que ela esteja automaticamente indexada.

O Bolsa Família, que tirou milhões de brasileiros da pobreza, é um assunto que desperta sempre discussões sobre sua eficácia, ainda que tenha sido exemplo para dezenas de países na América Latina, África e Ásia, que adotaram programas semelhantes. O Bolsa Família é também uma das marcas dos Governos do PT, que comandou o país entre 2003 e 2016, com Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff.

Após o impeachment da petista, Michel Temer se prontificou em prometer que não iria alterar os  programas sociais e não terminaria com o programa. Logo depois de assumir o cargo, anunciou ainda um aumento de 12,5% no Bolsa Família. Neste ano, o Governo deve dar um aumento real do benefício, mas o percentual ainda não está definido. O presidente, no entanto, espera que o programa de transferência de renda não seja mais necessário no futuro. "Não descuidamos dos programas sociais, mantenho o Bolsa Família, mas este não pode ser um programa eterno", afirmou em entrevista à rádio Tupi do Rio de Janeiro nesta quinta-feira.

Salário mínimo alto

Na avaliação da OCDE, o salário mínimo no Brasil, atualmente de 954 reais, é alto e maior do que a renda média de 56% dos brasileiros. A organização argumenta ainda que o salário mínimo subiu rapidamente ao longo dos anos e seu valor real é agora 80% maior do que há 15 anos. "Esse aumento foi transferido para todos os benefícios vinculados ao salário mínimo. Se você pensa que o salário vai continuar crescendo, continuaremos transferindo também a uma faixa de pessoas mais privilegiadas que não precisa", explica Arnold.

A reforma da Previdência também foi apontada como prioritária ao crescimento e à distribuição de renda no país. Sem a reforma, os gastos previdenciários mais do que dobrarão, fazendo que o sistema fique claramente insustentável, segundo a OCDE. "Além disse, os subsídios implícitos altamente regressivos do sistema previdenciário, com 82% dos fundos gastos com 62% mais ricos, aumentariam ainda mais".

O relatório diz ainda que o alinhamento das regras previdenciárias do Brasil com as regras praticadas pelos países da OCDE "implicaria uma previdência mínima mais baixa do que o salário mínimo, com elegibilidade de pensões proporcionais para períodos mais curtos de contribuição". A entidade, um clube de países ricos ao qual o Brasil pleiteia entrar até agora sem sucesso, aponta que o reajuste dos benefícios sociais e previdenciários no Brasil deveria ser vinculado à inflação. Além de reforçar a necessidade de aprovar uma reforma da Previdência para equilibrar as contas públicas e evitar o crescimento acelerado da dívida pública, a organização sugere reformas estruturais. Entre elas está a redução de barreiras comerciais, como a redução de tarifas para importação e fim da exigência de conteúdo nacional na fabricação de produtos.

Mais informações

Arquivado Em

Recomendaciones EL PAÍS
Recomendaciones EL PAÍS
_
_