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Oscar luta pela igualdade e por sua liderança

O movimento feminista #MeToo e a perda de audiência por causa da proliferação de prêmios prévios marcam o evento de Hollywood

Trabalhadores preparam a cerimônia do Oscar nos arredores do Dolby Theatre (Los Angeles).
Trabalhadores preparam a cerimônia do Oscar nos arredores do Dolby Theatre (Los Angeles).MARK RALSTON (AFP)

Quando a cerimônia do Oscar terminar, nesta madrugada de domingo para segunda-feira, tudo indica que quase não haverá surpresas quanto aos ganhadores. Pelo menos foi o que ocorreu com as diversas premiações que antecedem o evento máximo de Hollywood. Frances McDormand será a melhor atriz por Três Anúncios Para Um Crime, e Gary Oldman o melhor ator por O Destino de Uma Nação. Pela primeira vez, repetiu-se o quarteto de atores ganhadores nos Critics’ Choice, no Bafta, no Globo de Ouro e nos prêmios do Sindicato de Atores. Guillermo del Toro, se conseguir se safar das recentes denúncias de plágio, tem todas as chances de levar o troféu de melhor direção por A Forma da Água.

E, no prêmio de melhor filme, a Academia tomou várias medidas para evitar outro momento Moonlight em 2018, embora tenha tido a consideração de oferecer uma segunda oportunidade a Faye Dunaway e Warren Beatty como apresentadores desse prêmio, depois de encarnarem a grande gafe de 2017, quando La La Land foi erroneamente anunciado como vencedor. A verdade é que eles saíram com a imagem arranhada daquele fiasco, embora a responsabilidade pela clamorosa falha na entrega de um envelope errado tenha sido de um funcionário da PricewaterhouseCoopers. Desta vez, a empresa de auditora promete ter reforçado as medidas para que isso não volte a ocorrer. E espera-se que o comediante Jimmy Kimmel, que repete como apresentador geral da cerimônia neste ano, recorde com humor o episódio da acidentada vitória de Moonlight sobre La La Land.

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“Ser o último prêmio da temporada nos torna especiais. É como a final da Copa do Mundo. Mas nota-se o cansaço”, comenta ao EL PAÍS um membro da Academia de Hollywood. “Antes, o Globo de Ouro e o prêmio do Sindicato de Atores eram atos privados; hoje, todos disputamos a mesma audiência”, acrescenta. Há uma década, a festa do Oscar foi vista nos EUA por 57,3 milhões de telespectadores; a de 2017 atraiu apenas 33 milhões.

Esse cineasta fala sob anonimato porque os 7.258 membros da Academia com direito ao voto não podem compartilhar sua opinião com a imprensa. Nem com os indicados. Mas, na era das redes sociais, a bolha dourada em que vivia esse grupo se rompeu. “Somo convidados para festas, exibições, palestras… Prestamos atenção aos outros prêmios”, descreve um integrante da academia, Tony Angellotti, um dos relações-públicas mais destacados de Hollywood. Os eleitores do Oscar são mais sensíveis às campanhas e ao mundo que os cerca, e isso pode alterar seu voto: “Por exemplo, a vitória de Moonlight foi em parte um protesto pela derrota de Hillary [Clinton, na eleição presidencial]”, diz.

Talvez. Mas do que não há dúvida é que a luta pela igualdade de gênero no cinema ainda exigirá vários anos de perseverança. Em 2017, dos cem filmes mais vistos nos cinemas dos EUA, só 24% tinham uma protagonista feminina, 5% a menos com relação ao ano anterior. Desses 24%, 65% correspondem ao cinema independente, e só 35% a filmes de grandes estúdios hollywoodianos.

Entretanto, a lista de indicados nesta 90ª edição mostra uma evolução. Existem repetições, como a de Meryl Streep, que alcança sua 21ª candidatura com The Post – A Guerra Secreta, mais que qualquer outro ator. Ou as 50 indicações alcançadas por John Williams, compositor da trilha sonora de Star Wars – Os Últimos Jedis. Só Walt Disney foi indicado mais vezes (59). Porém, num ano marcado pela defesa da diversidade, são mais interessantes as barreiras rompidas numa entidade tantas vezes criticada por seu perfil branco, masculino, idoso e norte-americano. Christopher Plummer é, aos 88 anos, o indicado mais venerável. “Ele merece”, segundo um membro da direção da Academia, “porque assombra o que conseguiu em apena alguns dias de filmagem ao substituir Kevin Spacey em Todo o Dinheiro do Mundo”. Uma estatueta seria a chave de ouro para campanhas como a #MeToo e para a plataforma Time’s Up, que lutam contra comportamentos como os denunciados abusos sexuais cometidos por Spacey.

Rachel Morrison também faz história como finalista de melhor direção de fotografia por Mudbound – Lágrimas Sobre o Mississippi. Foram necessárias nove décadas de Oscar para que uma mulher seja finalmente aceita nesta categoria antes exclusivamente masculina, embora seja improvável que leve o troféu. Como aponta outro acadêmico sob anonimato, “muitos apoiamos o mestre da luz, Roger Deakins [Blade Runner 2049], favorito após 14 indicações e nenhuma vitória”. E pela primeira vez uma mulher negra aspira ao prêmio de melhor roteiro adaptado. Mesmo entre os diretores, os nomes dos candidatos têm cheiro de mudança. Não é a primeira vez que uma cineasta aspira ao Oscar de melhor diretora. Greta Gerwig é quinta, com Lady Bird. E Jordan Peele (Corra!) é o quinto cineasta negro a ser indicado. Mas o ganhador provavelmente será um mexicano, Del Toro, o terceiro dessa nacionalidade na história, depois de seus amigos Alfonso Cuarón (Gravidade, 2013) e Alejandro González Iñárritu (Birdman, 2014; O Regresso, 2015). Mas… “Dunkirk e Corra! estão fazendo muito barulho na disputa por melhor filme. A Forma da Água tem muitas chances, mas a temática racial continua estando na ordem do dia”, argumenta Angellotti.

Outra primeira vez poderia ser a vitória de Uma Mulher Fantástica, aspirante chilena ao prêmio de melhor filme em língua não inglesa. Como recorda o Los Angeles Times, embora o russo The Square: A Arte da Discórdia tenha chegado como favorito, “a Academia escolherá Uma Mulher Fantástica por seus méritos artísticos – que a devolveu aos cinemas norte-americanos – e pelo memorável trabalho de sua protagonista, a atriz transexual Daniela Vega.” Nesta noite, saberemos o veredicto.

Kobe Bryant será castigado por seu passado?

Veremos até onde chegam os ventos de mudança, e a luta por eliminar abusadores e assediadores da indústria de Hollywood. Casey Affleck, ganhador do Oscar de melhor ator em 2017, não subirá ao palco desta vez. Voluntariamente, cedeu seu lugar como apresentador do prêmio de melhor atriz a Jennifer Lawrence e Jodie Foster. Outro exemplo para medir essa força estará no Oscar de melhor curta de animação. O favorito, Dear Basketball, dirigido pelo legendário Glen Keane, grande nome da animação tradicional, pode se ressentir das acusações de estupro apresentadas em 2003 e posteriormente retiradas contra Kobe Bryant, produtor desta carta de amor autobiográfica ao basquete. "Como salienta o atual presidente da Academia, John Bailey, nossa prioridade é uma maior aceitação popular. Dito isto, sabemos que somos os guardiães da excelência na arte do cinema", salienta o acadêmico anônimo.

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