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Renew, o novo partido britânico contra o Brexit

Inspirado no Em Marcha, de Macron, grupo luta por um novo referendo após os termos de separação

Pablo Guimón
Sandra Khadhouri, representante do partido Renew
Sandra Khadhouri, representante do partido RenewNEIL HALL (EFE)
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O que há pouco tempo era o grande tabu da política britânica se quebrou definitivamente. O desastre das negociações, a vertigem pela iminência do incerto desenlace final e o consenso entre os especialistas de que, seja qual for, será prejudicial ao país, encorajou diversas iniciativas que confluem em um objetivo comum: deter o Brexit. A última, um novo partido político, batizado como Renew e inspirado no movimento Em Marcha, de Macron, que na segunda-feira lançou sua campanha nacional.

A intenção do Renew, que se define como centrista e procura construir seu respaldo sobre o crescente descontentamento com os partidos tradicionais, é “ser duro com o Brexit e com suas causas”. “Colocaremos a permanência na UE novamente sobre a mesa em um voto sobre o acordo final com Bruxelas”, explica James Clarke, um dos líderes do partido.

O partido nasceu no final do ano passado, fundado por um grupo de candidatos independentes que se apresentaram às eleições de junho com uma mensagem anti-Brexit. Seus responsáveis não escondem a inspiração direta no movimento que levou Emmanuel Macron à presidência da França em maio do ano passado, e afirmam que mantiveram “reuniões informais” com seus ideólogos nos últimos meses.

Seu objetivo é lançar candidatos em todas as 650 circunscrições eleitorais nas próximas eleições legislativas, previstas para 2022. Até agora já possuem 300. Seu financiamento, explicam, vem de doações particulares e dos bolsos dos próprios candidatos.

“As pesquisas mostram que a opinião sobre o Brexit está mudando, e o Governo conservador está nos obrigando a optar por um Brexit rigoroso sem um mandato claro por parte do eleitorado”, diz Sandra Khadhouri, outra das vozes do Renew.

O certo é que as pesquisas trazem dados esperançosos aos que sonham com uma volta atrás. Uma pesquisa recente do ICM para o The Guardian, uma das mais ambiciosas realizadas após o referendo, revela que 47% dos britânicos seriam a favor de um novo referendo quando forem publicados os termos da separação, contra 34% que se opõe a reabrir o debate. Ao mesmo tempo, as análises realizadas pelo Governo mostram revelações importantes: algumas das regiões que mais sofrerão o impacto do Brexit são aquelas que votaram majoritariamente por ele, e só Londres, onde a permanência venceu com folga, se livraria de um grave prejuízo.

Tudo isso, unido à paralisante guerra travada no interior do Partido Conservador sobre o modelo de país após o Brexit, a somente oito meses do vencimento do prazo para se chegar a um acordo com Bruxelas, deu asas aos que desde o referendo de 2016 exploram discretamente vias para evitar que ocorra o que consideram o maior erro da história recente do Reino Unido.

Há algumas semanas foi apresentada outra iniciativa, batizada como Our Future, Our Choice (OFOC; Nosso Futuro, Nossa Escolha). É liderada pelo influente lorde Andrew Adonis, ex-trabalhista e agora independente, uma das figuras que trava a batalha legislativa contra o Brexit na Câmara Alta. O que o OFOC quer é “uma mobilização sem precedentes dos jovens” para deter o Brexit.

“Esse não é um assunto fechado”, explica Adonis. “Como mostraram os debates recentes, temos uma crise parlamentar nesse país. A primeira-ministra não possui maioria em nenhuma das câmaras para enfrentar o Brexit. A única forma de sair dessa crise é um referendo sobre quaisquer que sejam os termos que May acertar. Unir os jovens, o movimento trabalhista e os empresários em uma campanha contra o Brexit destrutivo da primeira-ministra é vital e é onde precisamos concentrar nossas energias agora”.

Além do Renew e OFOC, outro movimento europeísta percorrerá o país nos próximos meses. Fundado pela ativista Gina Miller, que enfrentou o Governo nos tribunais para conseguir com que o Parlamento pudesse se pronunciar sobre o Brexit e ganhou, conta com o respaldo das 400.000 libras (1,82 milhão de reais) que recebeu do multimilionário húngaro-norte-americano George Soros, que fez parte de sua fortuna apostando contra a libra na quarta-feira negra de 1992. Ele se chama Best For Britain e pretende “se levantar pela liberdade de expressão, a democracia e o direito de lutar contra esse Brexit desastroso”.

Os três grupos compartilham o objetivo final, mas possuem estratégias diferentes. O Best For Britain defende o voto tático a favor de candidatos com perfil europeísta; o OFOC propõe mobilizar os eleitores para que pressionem seus deputados para que se oponham ao Brexit; e o Renew procura pressionar esses deputados colocando-os diante de outro candidato com uma agenda anti-Brexit.

Conservadores e trabalhistas se comprometeram a respeitar o resultado do referendo, em que 52% dos eleitores optaram por sair da UE, e não planejam submeter o Brexit a uma revalidação. O único partido nacional que defende a volta atrás, o liberal-democrata, não conseguiu capitalizar o sentimento anti-Brexit. Mas seu fracasso não desacredita necessariamente a pretensão de dar voz aos descontentes. “Sabemos que 2018 será um ano fundamental”, diz Clarke, do Renew, “e somos muitos os que querem estar do lado certo da história”.

O PAPEL DOS JOVENS

Os diferentes movimentos que pretendem parar o Brexit sabem que contam com um aliado fundamental: o eleitorado jovem. 75% dos eleitores de 18 a 24 anos votaram pela permanência no referendo de 2016. E tudo indica que, à medida que mais jovens chegarem à maioridade, a balança demográfica se inclinará claramente em favor dos partidários de se continuar na UE.

“Já existe um milhão de pessoas que era menor de idade no referendo e que hoje poderia votar”, afirma James Clarke, do Renew. “Os estudantes dividiram conosco suas preocupações pelas divisões sociais, a falta de segurança, os empregos precários e a perda de oportunidades que o Brexit causa. Precisamos escutar os jovens”.

"Estamos em uma nova fase das conversas e é imprescindível envolver os jovens nelas", explica Felix Marquardt, do think tank Youthonomics. "Há um dano geracional que deve ser consertado. É a geração jovem a que irá viver as consequências do Brexit. Em cinco anos, seremos um país claramente a favor da permanência na UE. Todos os grupos que defendem um segundo referendo estão convencidos do papel importante que cabe aos jovens".

Os coletivos que pretendem parar o Brexit formavam até agora uma paisagem dividida, mas muitos se uniram sob as asas do chamado Grupo de Coordenação de Bases, e contam com a cumplicidade de deputados, conservadores e trabalhistas, para fazer com que seja ouvido seu pedido de um segundo referendo. Uma mensagem que todos sabem que precisa da cumplicidade do eleitorado jovem.

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