_
_
_
_
_

Um século de buscas, sem êxito, por alienígenas

Desde a invenção do rádio, pensou-se em usá-lo para encontrar alguma inteligência extraterrestre. Essa busca obteve recentemente importante estímulo econômico

O radiotelescópio Big Ear, em Ohio (EUA), captou um estranho sinal em 1977.
O radiotelescópio Big Ear, em Ohio (EUA), captou um estranho sinal em 1977.NAAPO
Mais informações
EUA destinaram 22 milhões de dólares anuais a programa secreto para investigar óvnis
Magnata procura extraterrestres dentro do asteroide interestelar

Fazer contato com extraterrestres foi um dos usos propostos pelos criadores dos primeiros sistemas de envio de informação a distância sem fios. No começo do século XX, Guglielmo Marconi, um dos inventores do rádio, acreditava que essa tecnologia poderia ser empregada para se comunicar com os habitantes de Marte e receber seus sinais. Em agosto de 1924, o Governo dos EUA declarou um dia nacional de silêncio radiofônico para poder buscar esse tipo de sinal e pediu à população que apagasse seus aparelhos durante cinco minutos a cada hora durante 36 horas. O objetivo era evitar interferências que escondessem possíveis mensagens marcianas — que nunca chegaram.

Desde aquelas primeiras tentativas de buscas por alguma inteligência extraterrestre, nossa visão do espaço mudou bastante. As sondas que fotografaram Marte a partir de sua órbita e aterrissaram em sua superfície mostram um deserto gélido sem sinal de civilização. Expedições semelhantes por todo o Sistema Solar e décadas de detecções de todo tipo de sinal eletromagnético sugerem que, a não ser que sejam muito discretos, não existem alienígenas com sistemas de telecomunicações em nossa vizinhança.

A exploração científica também demonstrou que as possibilidades de haver mundos habitados são quase ilimitadas. Estima-se que somente na nossa galáxia existam cerca de 200 bilhões de estrelas e que há em todo o universo um número semelhante a esse de galáxias. São muitas as chances de que, em um cosmos com as mesmas regras físicas, a inteligência se forje, como aconteceu na Terra. Essa mesma exploração mostrou, porém, que o universo é imenso e que está, fundamentalmente, vazio. Pouco tempo atrás, a astrofísica Amina Helmi lembrava no EL PAÍS que, se duas galáxias, com suas dezenas de milhares de sistemas planetários, se cruzassem, certamente não haveria nenhuma colisão. Até mesmo na velocidade da luz, a mesma em que nossas ondas de rádio viajam, chegar ao planeta extra-solar mais próximo conhecido levaria 4 anos. Atravessar tamanho vazio para encontrar seres parecidos conosco, mesmo que eles existam em nossa galáxia, pode levar séculos.

Apesar da dimensão desses desafios, os humanos continuaram a buscar inteligências extraterrestres, muitas vezes sem estabelecer limites para a imaginação. Em outubro de 2015, soube-se que o telescópio Kepler detectara um escurecimento peculiar no brilho da estrela KIC 8462852. Aquele sol, que está a 1.480 anos-luz, mas faz parte da Via Láctea, parecia ter à sua volta algum objeto estranho, diferente dos planetas extra-solares buscados pelo Kepler. O entorno da estrela parecia um amontoado de objetos de diferentes tamanhos, viajando em velocidades variadas e sem fazê-lo em um plano mais ou menos fixo, como nos sistemas planetários comuns. Então, Jason Wright, um astrônomo da Universidade Penn State (EUA), considerou que aquelas observações podiam ser explicadas como sendo uma megaestrutura criada por uma civilização mais avançada do que a humana para aproveitar a energia da estrela. Uma análise realizada por 200 astrônomos e publicada recentemente descarta esse tipo de construção e considera mais plausível que aquelas distorções teriam sido causadas pelo choque entre dois cometas ou por algum tipo de convulsão interna do astro.

Um sinal apresentado como tendo sido produzido por uma inteligência extraterrestre acabou levando a uma descoberta premiada com o Nobel

Não é a primeira vez que se usam alienígenas para tentar explicar uma observação científica peculiar. Uma das mais famosas se deu em torno da detecção de estranhos sinais em meados de 1967. Jocelyn Bell Burnell, uma aluna de doutorado da Universidade de Cambridge (Reino Unido) observava o céu havia várias semanas com um grande radiotelescópio. Certo dia de agosto, ela captou algo que não coincidia com as fontes de sinais de rádio conhecidas no universo. Tampouco parecia ser uma interferência. Após semanas de estudos, Bell identificou a sua origem em uma região específica do céu e comprovou que aquela fonte vibrava com a velocidade mais própria de um sinal artificial do que de um objeto natural conhecido. Durante certo tempo, mesmo não sendo essa a primeira hipótese, não se descartou completamente que aquelas pulsações fossem a primeira evidência de uma inteligência extraterrestre. Ao final, comprovou-se que o sinal provinha de uma estrela de nêutrons, um objeto até então desconhecido. Bell Burnell não fez contato com extraterrestres, mas a sua descoberta valeu um Prêmio Nobel, mesmo que não tenha sido para ela.

Poucos anos depois dessa história de homenzinhos verdes, o radiotelescópio Big Ear, em Ohio (EUA), recebeu um sinal intenso de rádio de 72 segundos proveniente da constelação de Sagitário. Suas características correspondiam ao que se esperava de um sinal proveniente de algum tipo de tecnologia de telecomunicação, mas não se conseguiu detectá-lo novamente. Aquele sinal, chamado de Wow por causa da expressão que seu descobridor escreveu no papel em que registrou o fato, é ainda hoje o mais parecido com uma mensagem extraterrestre já recebida na Terra.

Um século depois das primeiras tentativas de fazer contato com outros seres vivos inteligentes, a busca continua e recebeu recentemente um grande empurrão. Financiado pelo magnata russo Yuri Milner, o projeto Breakthrough Listen, que apresentou seus primeiros resultados no ano passado, proporcionará 100 milhões de dólares e milhares de horas de uso de telescópios para ouvir os alienígenas. Mesmo que não se venha a encontrá-los, essa busca, como no caso das estrelas de nêutrons, pode gerar frutos inesperados.

Mais informações

Arquivado Em

Recomendaciones EL PAÍS
Recomendaciones EL PAÍS
_
_