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Com Trump em retirada, disparam as vendas da América Latina para China

Protecionismo dos EUA deu empurrão para que exportações da AL para a China crescessem 30% em 2017 Brasil teve alta de 18% nas vendas, puxadas por alta nos preços de minério de ferro

Ignacio Fariza
Vista aérea do porto de Yangshan, em Xangai.
Vista aérea do porto de Yangshan, em Xangai.AFP
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A China continua agigantando sua posição como grande parceiro econômico da América Latina e do Caribe. A chegada de Donald Trump à Casa Branca, um presidente abertamente contrário ao livre comércio e à multilateralidade que tem dominado o mundo nas últimas décadas, foi o empurrão definitivo para o avanço de Pequim. Mas os laços comerciais e de investimento estavam sendo tecidos havia mais de uma década. As últimas cifras apontam nessa direção: em 2017, as exportações da região ao gigante asiático dispararam 30%, segundo os dados divulgados nesta segunda-feira pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). O crescimento das remessas para a China triplicou no último ano o das vendas aos Estados Unidos (10%)

“As compras da China na região foram as mais dinâmicas por estarem concentradas nos produtos básicos, que apresentaram uma forte tendência de alta”, reconhece Paolo Giordiano, economista principal de Comércio e Integração do BID e autor do relatório Estimativas das Tendências Comerciais da América Latina e do Caribe. Somente um terço do incremento das exportações latino-americanas se explica pelo maior volume: o resto tem a ver com o encarecimento dos produtos comercializados.

As exportações da América Latina e do Caribe a todos os mercados mundiais cresceram 13%, revertendo assim a queda de 3,3% registrada em 2016: uma notável mudança de tendência ainda pendente de consolidação e conduzida, sobretudo, pelo encarecimento das matérias-primas, nas quais a região continua sendo intensiva. A Organização Mundial do Comércio (OMC) prevê que os intercâmbios entre todos os países do globo tenham expansão de pouco menos de 4% em 2017, um terço do crescimento das exportações com origem na América Latina.

O petróleo, produto básico por excelência e do qual muitos países latino-americanos, como Venezuela, Brasil e México, são exportadores líquidos (vendem mais do que compram), viu seu preço incrementado em mais de 23% nos 11 primeiros meses do ano. O minério de ferro, por exemplo, vale hoje quase 27% mais do que há um ano: um autêntico revigorante para o Brasil, o segundo maior produtor mundial deste minério. E o preço do cobre, do qual o Chile tanto depende, deu um salto de 28%.

Crescimento não homogêneo

As boas notícias, porém, não chegam a todos os rincões da região. Os picos de exportação se concentram na América do Sul – onde o crescimento médio foi de 16%, em comparação com a queda de 4,5% registrada em 2016 – e, de modo especial, em cinco países: Venezuela (+28%), Peru (+25%), Colômbia (+19%), Brasil (+18%) e Equador (+16%). Todos eles têm dois denominadores em comum: a importância das matérias-primas no total de suas exportações e a alta dependência da China.

No Caribe, o valor das exportações cresceu 11%. No México, aumentou 10%, graças à melhora dos fundamentos da economia dos EUA, ao qual está muito interconectado. No entanto, a América Central ficou para trás, com um crescimento das exportações de 6% – um fraco desempenho em comparação com o ocorrido no restante da região. Três dos únicos quatro países que viram cair suas vendas externas em 2017 são caribenhos: Barbados, Haiti e República Dominicana.

Com a recuperação em uma fase “ainda relativamente frágil”, para que as vendas externas latino-americanas continuem a tendência altista registrada este ano o BID vê como crucial que se “elimine a incerteza sobre o crescimento da China”. E também que a própria economia latino-americana se “acelere” definitivamente. E que cheguem a bom termo duas negociações: as mantidas desde meados do ano pelos EUA, México e Canadá para a atualização do Tratado de Livre Comércio da América do Norte (Nafta, na sigla em inglês) e as do Mercosul e México com a União Europeia para, respectivamente, criar e modernizar seus respectivos acordos comerciais

O primeiro desses temas – a saúde econômica da China – e o último – o futuro do Nafta – são considerados essenciais para os setores exportadores da América do Sul e México. E aí a situação também é díspar: apesar de as dúvidas sobre o futuro do gigante asiático terem se dissipado à base de estímulos fiscais e monetários – embora a incerteza sobre a enorme dívida privada permaneça –, a inquietação sobre o tratado norte-americano não parou de crescer nos últimos meses, sempre sob a ameaça de ruptura de Trump. Da China dependem um de cada cinco dólares exportados pelo Brasil e um de cada quatro exportados pelo Peru no ano passado. E para seus dois parceiros no Nafta, os EUA e Canadá, vão 80% das vendas externas do México.

Os fluxos intrarregionais – aqueles entre países latino-americanos ou caribenhos – continuam sendo uma das grandes matérias pendentes de uma região que olha demais para a China, os EUA e, em menor medida, a Europa, e muito pouco para seus vizinhos mais imediatos. No entanto, nesse ponto, os dados também permitem uma leitura otimista, pelo menos, no curto prazo: as exportações entre países latino-americanos aumentaram 12% em comparação com o ano anterior, com a América do Sul e o Caribe como principais beneficiários desta intensificação. Da continuidade desta tendência depende boa parte do sucesso de muitas economias da região, especialmente as dos países menores e menos intensivos em matérias-primas. O potencial é tão grande quanto pequeno seu aproveitamento.

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