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A controversa operação de Maduro para vincular voto e renovação de programas sociais

Com o 'cartão da pátria', criado para dar benefícios aos pobres, governo consegue controlar eleitores

Eleitor vota nas eleições municipais deste domingo na Venezuela
Eleitor vota nas eleições municipais deste domingo na VenezuelaNATHALIE SAYAGO (EFE)
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Arelis Aleman, militante do Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV), coloca em um sistema digital dados de milhares de eleitores do bairro El Carpintero de Petare, que fica no leste de Caracas. "Depois de eleger um prefeito, as pessoas vêm com seu ‘cartão da pátria’ para nos avisar de que eles votaram. Temos controle, o que nos permite conhecer muito, incluindo as necessidades das pessoas", explica.

O documento de identificação foi criado em janeiro com a promessa de conceder benefícios sociais aos venezuelanos, mas sua utilidade tem sido política nas eleições municipais, realizadas no domingo passado e boicotadas pelos partidos de oposição Primeiro Justiça (liderado por Henrique Capriles), Vontade Popular (criado por Leopoldo López) e Ação Democrática (presidido por Henry Ramos Allup).

Em El Carpintero, a ordem foi seguida por centenas de eleitores. Cerca de 1.700 das quase 5.900 pessoas que votaram na escola Alberto Ravell, em Petare, notificaram o partido do governo de que eles não apoiaram a abstenção. "Aquele que é miserável (oponente) não está listado neste registro, mas aqueles que estão com o processo, sim. Com o ‘cartão da pátria’, sabemos quem está com a revolução", diz Aleman.

Há oito dias, o presidente aprovou um bônus de Natal de 500 mil bolívares (6 dólares) para 4 milhões de famílias que só pode ser retirado com o cartão de identificação. Muitos esperaram em longas filas para obter o cartão.

A coalizão da oposição 'Mesa de la Unidade Democrática' acusou o partido no poder de usar a "fome" da população para fins eleitorais. Em um comunicado divulgado após o Conselho Nacional Eleitoral anunciar o triunfo do PSUV em 305 das 335 prefeituras que estavam em disputa na eleição de domingo passado, além do Governo do Estado de Zulia (noroeste), a aliança política afirmou que a pressão do governo levou muitas pessoas às urnas. "Mais uma vez, vimos todo o aparato do Estado abusando do seu poder, incluindo o uso perverso do ‘cartão do país’, para submeter a vontade de um povo em situação de extrema necessidade". Mais de 16,5 milhões de venezuelanos estão afiliados ao cartão, de acordo com o Executivo.

Oposição

Os candidatos governistas não tiveram concorrentes nas eleições. Os principais partidos oposicionistas decidiram não participar da disputa depois de denunciar graves irregularidades nas eleições regionais de 15 de outubro. “Convocaram à abstenção, tentaram sabotar o processo. Hoje poderíamos dizer: não puderam com o sucesso das eleições municipais. O povo da Venezuela pôde mais, e temos que dizer que as eleições de 10 de dezembro foram um sucesso total para o país. É a terceira eleição em 140 dias”, disse o presidente Nicolás Maduro.

A participação diminuiu 11,6% em comparação aos sufrágios estaduais, em que o chavismo conquistou 18 dos 23 Governos locais e destituiu Juan Pablo Guanipa, eleito em Zulia, por se recusar a prestar juramento perante a Assembleia Nacional Constituinte (ANC). Capriles, ex-candidato presidencial, atribuiu a apatia dos eleitores à crise institucional.

Na repetição da eleição em Zulia, o economista Omar Prieto, militante do governista PSUV, derrotou Manuel Rosales, líder do partido oposicionista Um Novo Tempo. “Por princípios e valores continuaremos defendendo a rota cívica, eleitoral e democrática. O voto é nossa única ferramenta, não há saídas mágicas. Continuaremos firmes lutando pela mudança que a Venezuela deseja”, afirmou Rosales.

Maduro ameaçou cassar os partidos opositores que não participassem do pleito municipal. Sua instrução será acatada por Delcy Rodríguez, presidenta da poderosa ANC, que já antecipou que prepara uma revisão desse assunto no plenário.

Com a possível proscrição das agremiações oposicionistas, não se pode descartar que a Venezuela caia num sistema unipartidário, como ocorreu em outros contextos na União Soviética ou em Cuba. Para o chefe de Estado, que aspira a ser reeleito em 2018, esse seria um cenário muito aprazível para seus propósitos.

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