_
_
_
_
_

Enfraquecida, Merkel negocia uma coalizão com partidos muito diferentes

Três formações com pouca sintonia política estão condenados a se entender e criar um programa de Governo

Políticos com o chanceler Angela Merkel
Políticos com o chanceler Angela MerkelMichael Kappeler (AP)

Jamaica. É o nome da coalizão que a chanceler alemã, Angela Merkel, vencedora das eleições de setembro, pretende construir nas próximas semanas. Começou oficialmente na quarta-feira negociações previstas como árduas e demoradas. Três partidos com pouca sintonia política estão condenados a se entender e criar um programa de Governo para os próximos quatro anos na maior economia da zona do euro. A experiência é inédita. “Não serão conversas fáceis. Mas vamos assumir o desafio”, reconheceu esta semana a chanceler.

A partir desta quarta-feira e previsivelmente até o final do ano, o bloco conservador de Merkel (CDU/CSU, negro), os liberais (FDP, amarelo) e os Verdes vão tentar resolver suas diferenças para iluminar a chamada coalizão Jamaica, referindo-se às cores da bandeira da ilha caribenha. Se fracassarem, começaria um período de instabilidade política, no qual as opções ficam reduzidas à formação de outra grande coalizão – conservadores e sociais-democratas – que nenhum partido deseja, um Governo de minoria ou a possibilidade muito excepcional de convocar novas eleições. Qualquer opção dessas poderia reforçar o apoio da emergente extrema direita alemã.

Mais informações
A complicada tarefa de formar Governo na Alemanha
Extrema direita entra no Parlamento alemão pela primeira vez desde 1945
Avanço da ultradireita estraga vitória de Angela Merkel
O Leste da Alemanha se rebela

A tarefa será hercúlea. Imigração, Europa, impostos e o meio-ambiente são os principais temas que dividem as três formações (quatro contando a CSU, a ala bávara da CDU, com identidade e exigências próprias). Estas e outras questões deverão ser resolvidas nas negociações que acontecerão na Sociedade de Parlamentares Alemães em Berlim, considerado território neutro, onde os ministérios também serão distribuídos. No primeiro dia de negociações houve apenas boas palavras e sorrisos na varanda da sociedade de parlamentares onde os políticos foram fotografados.

Merkel é a encarregada de dirigir as negociações, que deverão abrir a porta para seu quarto mandato, mas chega enfraquecida à mesa de negociações. Embora seu partido tenha sido o mais votado em setembro, também sofreu uma sangria de votos. Até um milhão deles migraram para a extrema direita, que entra pela primeira vez no Parlamento como a terceira força mais votada. A chanceler é acusada dentro e fora de seu partido de esvaziar a direita política e ter permitido, com seu giro para o centro, o crescimento da Alternativa para a Alemanha (AFD) de extrema direita. O revés sofrido pelo partido de Merkel no domingo passado nas eleições regionais da Baixa Saxônia contribuiu para aumentar a sensação de fraqueza política da chanceler.

Na quarta-feira as negociações começaram com uma reunião na parte da manhã entre a CDU e os liberais; à tarde, o partido de Merkel se reuniu com os Verdes. Na sexta-feira haverá uma reunião ampliada e todos os partidos vão se sentar na mesma mesa.

O líder dos liberais, Christian Lindner, começou a semana negociadora disparando à queima-roupa. Em entrevista à revista Stern, Lindner acredita que Merkel sofreu “uma evidente perda de autoridade” e espera a abertura de “um debate na CDU nos próximos quatro anos sobre a sucessão de Merkel”.

Pouco antes, em outra entrevista, desta vez com o Frankfurter Allgemeine Zeitung, defendeu que o ministério de Finanças, até agora era dirigido com mão de ferro por Wolfgang Schäuble, não deve permanecer nas mãos da CDU porque, em sua opinião, fracassou, sugerindo seu desejo de ganhar uma carteira decisiva também para o futuro da Europa. Lindner rejeita os planos que, pelo menos em palavras, Berlim e Paris querem para reformar a zona do euro e dotá-la de um Fundo Monetário Europeu capaz de prevenir crises. Os liberais também pedem um corte de impostos drástico, 30 bilhões, o dobro do que quer a CDU.

Na outra ponta do pensamento europeu estão os ultraeuropeístas Verdes. “A política fiscal europeia precisa se afastar da austeridade e buscar um pacto fiscal comum cujos recursos sirvam para financiar a inovação social e tecnológica”, disse recentemente Simone Peters, copresidenta dos Verdes.

Lei de imigração

A outra linha vermelha liberal passa pela redação de uma nova lei de imigração “que concilie as obrigações humanitárias com as necessidades do nosso país”, disse Lindner à Stern. A política de imigração aparece como o ponto mais espinhoso dessas negociações. A CDU e seu partido irmão da Baviera, a conservadora CSU, chegaram a um acordo na semana passada com o qual resolveram suas diferenças e concordaram com um número máximo de refugiados que a Alemanha estaria disposta a aceitar a cada ano (200.000). É um objetivo político que, no entanto, nasce morto, por não ser vinculante. Em qualquer caso, o acordo é a base com a qual o bloco conservador começa a negociar, sendo que os Verdes já avisaram que não querem nem ouvir falar de tetos, alegando que o direito de asilo não pode estar sujeito a restrições.

A política energética é outro dos assuntos enfrentados pelos partidos que devem se entender. Os ecologistas exigem o fechamento das centrais que operam com carvão, com o objetivo de reduzir as emissões poluentes, enquanto a chanceler, grande defensora da luta contra as alterações climáticas, tem evitado as medidas que possam afetar o futuro de milhares de trabalhadores da indústria do carvão. Embora a chamada revolução energética alemã semeou de moinhos de vento o campo, os compromissos para reduzir os gases de efeito estufa não diminuíram ao ritmo que Berlim se comprometeu com a comunidade internacional.

Se as negociações chegarem a bom porto, o resultado será refletido em um contrato detalhado – o de 2013 tinha 185 páginas – que as partes se comprometerão a respeitar durante os próximos quatro anos.

Mais informações

Arquivado Em

Recomendaciones EL PAÍS
Recomendaciones EL PAÍS
_
_