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Os traficantes mais famosos da Argentina impedem a apresentação de um livro que os investiga

Viúva de “Pájaro” Cantero, o falecido líder de um grupo, irrompe em uma universidade e ameaça os autores

Lorena Verdún, em uma foto em março deste ano.
Lorena Verdún, em uma foto em março deste ano.Télam
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Em 26 de maio de 2013, Claudio Ariel Pájaro Cantero estava urinando na porta de uma discoteca de Villa Gobernador Gálvez, na periferia de Rosário (a 380 quilômetros de Buenos Aires), quando recebeu seis tiros vindos de um automóvel. O ataque representou o fim do bando de narcotraficantes conhecido na Argentina como Los Monos, e que manteve sob tensão a cidade com sangrentos ajustes de conta. A história é relatada no livro Los Monos, Historia de la Familia Narco que Transformó a Rosario en un Infierno (Sudamericana, 2017), dos jornalistas Germán de los Santos e Hernán Lascano. O livro não pôde ser apresentado nesta cidade por causa de uma violenta ameaça.

Na última quarta-feira deveria ter sido realizada uma apresentação da publicação, já na terceira edição, há dois meses com bom ritmo de vendas e aclamada por centenas de artigos jornalísticos que endossam a qualidade de uma investigação de mais de dois anos. O lugar escolhido era um auditório da Universidade Nacional de Rosário (UNR) que estava lotado. O jornalista local Roberto Caferra foi quem abriu o ato antes de passar a palavra aos autores. Mas estes não puderam nem abrir a boca.

Neste momento irromperam no lugar três mulheres que, com gritos ameaçadores, se aproximaram da mesa dos palestrantes e provocaram a suspensão da exposição. Entre elas se destacava Lorena Verdún, ex-mulher e mãe de alguns dos filhos de Cantero. “É uma mulher processada por associação ilícita, coautoria de homicídio e narcotráfico”, disse ao EL PAÍS Germán de los Santos, um dos autores do livro.

“Começaram a gritar contra nós e a nos insultar”, completou o jornalista. “Os senhores investigaram a minha família, agora nós vamos investigar os senhores’, nos ameaçou. Estava muito irritada. Afirmava, entre outras coisas, que o livro era uma perseguição à sua família. Tentamos falar, mas foi impossível”. Não havia policiais. O livro trata também da cumplicidade policial e, por ser um espaço universitário aberto ao público, preferimos que não houvesse. Era simplesmente a apresentação de um livro, é um fato inédito que irrompam pessoas vinculadas ao narcotráfico”, relata De los Santos.

As autoridades da UNR avaliaram que não estavam dadas as condições de segurança e suspenderam a apresentação. A ministra da Segurança, Patricia Bullrich, escreveu em sua conta do Twitter: “Me informa @RoyLopezMolina que foram ameaçados os autores da história de Los Monos. O @MinSeg está aí para que não fique impune”. Os autores decidiram adotar medidas de proteção para resguardar sua segurança.

Consultado sobre a investigação, De los Santos contou que ambos os jornalistas acompanhavam o assunto havia muito tempo, para seu trabalho nos jornais La Nación e La Capital. “Fizemos mais de 260 entrevistas, consultamos arquivos judiciais e diversas fontes oficiais e não oficiais. Nunca tivemos problemas durante a investigação, mas também porque fizemos isso com um perfil muito baixo.”

No momento, o bando não possui o poder de outrora e seriam as mulheres as encarregadas do negócio. No entanto, todos concordam em que sua atividade, com a de outros bandos menores, mudou a vida cotidiana na terceira cidade mais importante do país.

A saída do livro “não foi uma surpresa para eles (Los Monos) porque consultamos muitíssimas vezes seus advogados e até lhes propusemos terminar o livro com uma entrevista para que contassem seu ponto de vista, mas no final não concordaram”, recorda o jornalista, e opina: “Não é um bando desarmado. Há alguns dias processaram Guillermo Cantero, cunhado dessa mulher que apareceu ontem, por sequestro extorsivo. Ele planejou tudo da prisão, o que demonstra que dali continua controlando tudo. Que alguém esteja preso na Argentina não significa que os bandos estejam desarmados.”

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