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Mercados cautelosos devido à tensão na Catalunha

Euro cai abaixo de 1,18 dólar no início das operações na Ásia. Especialistas pedem, de modo unânime, uma solução negociada

Homem segura bandeira da Catalunha.
Homem segura bandeira da Catalunha.Chris McGrath (Getty)

As imagens das ações ofensivas da polícia diante dos colégios eleitorais onde se realizava o referendo ilegal convocado pela Generalitat (a autoridade catalã) monopolizaram as atenções dos meios de comunicação financeiros (e não financeiros) de todo o mundo. Se até agora a questão catalã tinha passado quase despercebida pelos mercados, com poucas referências à crise fora das fronteiras espanholas e um impacto limitado na Bolsa, foi a notícia do dia.

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Neste contexto, nas primeiras horas de negociação no mercado de câmbio (na Ásia), a moeda europeia caiu abaixo de 1,18 dólar e era negociada por 1,176, um declínio de cerca de 0,3% em relação à cotação de sexta-feira. As quedas, ainda limitadas, não indicam uma sessão fácil para a Bolsa espanhola na abertura. A Espanha corre o risco de se tornar um foco de instabilidade diante da continuidade da crise catalã, num contexto nada simples, em meio à saída do Reino Unido da União Europeia e o crescimento dos populismos em vários Estados.

A maioria dos especialistas consultados antes deste domingo concordava que, se o senso comum prevalecer e o diálogo for aberto, o Ibex (bolsa espanhola) tem todos os ingredientes necessários para abrir em alta, superando a barreira dos 10.400 ou 10.500 pontos. Eliminar o fosso com o resto da Europa permitiria que o índice atingisse os 11.000 pontos. Mas esse nível pode estar longe à luz do que aconteceu no domingo, que complica muito essa chamada ao bom senso que os especialistas da Bolsa de Valores reclamam, assim como a quase unanimidade dos políticos europeus que opinaram ontem sobre o assunto.

A isto se deve acrescentar que na sexta-feira a S&P decidiu manter a classificação financeira da Espanha (cogitava-se uma melhora) e citou a questão catalã como fonte de possível instabilidade. Outro aspecto negativo para o Ibex e a dívida espanhola.

Dessa forma, fica para trás a experiência, positiva em relação à Bolsa, da consulta realizada em 9 de novembro de 2014, quando transcorreu sem incidentes. Naquele dia, a turbulência política não impediu que o Ibex disparasse 1,45% no dia seguinte e que o prêmio de risco dos bônus espanhóis de 10 anos caísse de 133 a 120 pontos-base frente ao equivalente alemão.

Até agora, o impacto, mesmo limitado, existe. O Ibex perdeu sua condição de índice líder na Europa, embora ainda acumule uma alta de 11% no ano. O PSI 20 português subiu 15,6%; o Dax alemão, 11,7%. "O diferencial com a Alemanha aumentou, e é claro que a tensão entre os Governos central e catalão contribuiu para que a Bolsa espanhola tivesse um desempenho pior do que o do resto do Velho Continente", diz Eduardo Bolinches, analista da ActivTrades.

Uma escalada da tensão diante da radicalização das posições criaria as condições necessárias à venda de ativos com a ‘marca Espanha’

"Há muito dinheiro esperando para entrar assim que a situação se acalmar, se não acontecer nenhuma loucura", prevê o especialista da ActivTrades. Embora o Banco da Espanha, assim como a S&P, tenha reconhecido que a tensão na Catalunha pode afetar o crescimento, os pilares da economia nacional permanecem inalterados. A capacidade de financiamento do Tesouro está por enquanto fora de qualquer dúvida; inclusive se fortaleceu com algumas taxas negativas nos últimos leilões que acontecem num contexto de taxas mínimas históricas.

Especialistas do departamento de mercado de capitais de uma entidade estrangeira alertam que nem tudo o que reluz é ouro e que existe um grande interesse por parte do Governo em que a demanda demonstre toda a sua força nessas operações durante essas semanas de intenso ruído em torno da Catalunha. "Uma independência pela força é o pior cenário possível. A comunidade autônoma deixaria de contribuir para o pagamento da dívida espanhola, não pagaria sua parte e causaria um autêntico descontrole nos mercados. A boa notícia é que isso é pouco menos do que impossível", disse na sexta-feira Juan Gómez Bada, diretor de investimentos do Avantage Fund.

Bolinches adverte, no entanto, que se houver uma tentativa de desconexão o nervosismo aumentará e a Bolsa poderá cair abaixo dos 10.200 pontos, nível que serviu de muro de contenção nas últimas sessões. "Nos próximos dias teremos muita volatilidade. Mas o lógico é que a sensatez acabe retornando, voltem a fazer política aqueles que têm de fazê-la e que o investimento que ficou represado volte a entrar no país", acrescentam especialistas de outra entidade estrangeira. Um de seus diretores revela que os investidores estrangeiros começaram a perguntar sobre o problema catalão, embora ainda seja apenas um sinal.

No entanto, a situação dos valores com sede na Catalunha, apesar de que o CaixaBank e o Banco Sabadell tenham sido ligeiramente mais penalizados do que o resto do setor financeiro nas últimas sessões, é impoluta. A Cellnex é a medalha de ouro do Ibex, com uma alta de 42%; o CaixaBank, curiosamente, é a de prata, com 37,1%, e o Sabadell, apesar das quedas relativamente maiores nas últimas sessões, é a de bronze, com 36%. "Esses bancos foram os líderes na alta, e é lógico que os investidores tenham usado a desculpa catalã para realizar lucros", comentam especialistas da Renta 4.

Portanto, ao investidor em Bolsa só resta confiar na prudência dos Governos de Madri e Barcelona, que será fundamental para que o prêmio de risco espanhol não aumente e para que o Ibex, apesar de não recuperar o (escasso) terreno que perdeu, não perca ainda mais. E também para que caia o rendimento do bônus catalão, que mostra um prêmio de risco de quase 300 pontos-base na dívida com vencimento dentro de pouco mais de dois anos. A capacidade de financiamento de curto prazo da Catalunha é inexistente, de modo que uma declaração unilateral teria como consequência, salvo um plano B do Governo catalão, um calote.

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