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Lula tem segundo round com Moro, desta vez sob o baque do depoimento de Palocci

Ex-presidente recorre da condenação pelo triplex. "Agora, com um tribunal isento, temos a expectativa de reverter essa decisão", diz defesa do petista

Lula é recebido por apoiadores ao chegar à sede da Justiça Federal em Curitiba. Também houve protestos.
Lula é recebido por apoiadores ao chegar à sede da Justiça Federal em Curitiba. Também houve protestos.HEULER ANDREY (AFP)

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva se encontra novamente com o juiz federal Sérgio Moro nesta quarta-feira em Curitiba. O petista chegou à sede da Justiça Federal no Paraná por volta das 14h, onde foi recebido com simpatizantes, para depor no caso em que é réu por supostamente ter recebido vantagens indevidas da empreiteira Odebrecht, como um terreno que seria destinado ao Instituto Lula e um apartamento em São Bernardo do Campo, onde ele tem residência. O segundo encontro cara a cara entre dois dos maiores personagens da operação Lava Jato ocorre em momento bem distinto do primeiro, realizado em 11 de maio também na capital paranaense. Agora, além de já ter sido condenado por Moro a 9 anos e meio de prisão no caso do tríplex do Guarujá, o ex-presidente está mais fragilizado no processo após o depoimento de seu ex-ministro Antonio Palocci – que atribuiu a Lula uma série de crimes.

No início do mês Palocci, que ainda não assinou acordo de colaboração premiada e está preso desde setembro passado, depôs perante Moro e chegou a falar em um “pacto de sangue” firmado entre Lula e o empresário Emílio Odebrecht. Ele também mencionou um pacote de propinas da empreiteira que seria destinado ao petista, e que incluiria um terreno em São Paulo que seria destinado ao Instituto do ex-presidente. A defesa do petista sempre negou qualquer irregularidade cometida por Lula, e afirmou que a única sede da entidade fica no bairro do Ipiranga.

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As acusações de Palocci representam um baque na narrativa da defesa petista, e  jogam um balde de água fria nas pretensões políticas do ex-presidente, que acabou de completar uma caravana pelo Nordeste para mobilizar suas bases. O ex-ministro era um dos homens mais próximos da cúpula petista no primeiro governo de Lula e também no primeiro ano da administração Dilma (2011).

A estratégia de defesa do petista segue a mesma linha adotada até aqui. “Questionamos quaisquer delações que não trazem nenhuma prova material”, disse, em coletiva nesta quarta, o ex-ministro da Saúde, Alexandre Padilha, vice-presidente da legenda. “Não somos só nós, mas centenas de juristas têm questionado”, completou ele, dizendo acreditar que a Justiça vai reverter as denúncias contra ele. Para Padilha, criou-se uma armadilha para que Lula para que ele não concorra à eleição em 2018. “São acusações frágeis... Lula é o plano A do partido [para 2018] e de uma parcela da população”, disse.

Outra consequência da “traição” de Palocci foi um possível arrefecimento nos ânimos da militância petista. Se no primeiro depoimento de Lula a Moro criou-se um clima de guerra entre apoiadores e críticos do ex-presidente, agora a situação é mais calma, a ponto das autoridades reduzirem o efetivo policial no entorno do tribunal. “Informações repassadas a nós [dão conta de que], virão menos pessoas”, disse o secretário da Segurança Pública e Administração Penitenciária (Sesp) do Paraná, Wagner Mesquita, após a reunião que definiu o esquema de segurança na cidade. De qualquer forma, espera-se a chegada de ao menos 5.000 manifestantes a Curitiba – no primeiro depoimento a expectativa era de 60.000 pessoas. O ex-presidente deve discursar para seus apoiadores por volta das 19h na praça Generoso Marques, região central da capital.

Militantes do MST aguardam a chegada de Lula diante da Justiça Federal em Curitiba nesta quarta-feira.
Militantes do MST aguardam a chegada de Lula diante da Justiça Federal em Curitiba nesta quarta-feira.HEULER ANDREY (AFP)

Ao todo, Lula é réu em seis ações penais, sendo três no âmbito da Lava Jato – um por suposta obstrução de Justiça, outra pelo caso do triplex, da qual já teve a acusação estabelecida pelo juiz Sergio Moro, e outra pelo terreno do Instituto Lula, sobre a qual será ouvido nesta quarta. Em outra, a operação Janus investiga a relação de Lula como facilitador da Odebrecht em empréstimos ao BNDES para atuação da empreiteira em Angola. É réu, ainda, em outras duas ações pela operação Zelotes. Uma delas foi aceita nesta segunda pelo Ministério Público Federal do Distrito Federal por suposta venda de medida provisória para o setor automotivo em 2009.

Recurso contra a condenação pelo triplex

No dia anterior ao novo cara a cara com Moro, a defesa do ex-presidente apresentou recurso contra a condenação pelo caso do triplex do Guarujá no Tribunal Regional da 4ª Região, com sede em Porto Alegre. Os advogados de Lula pedem tanto que seja reconhecida a sua inocência quanto a nulidade do processo pelos "inúmeros excessos e ilegalidades cometidos pelo juiz". "Nós acreditamos que com um julgamento técnico, imparcial e objetivo somente pode resultar na absolvição. Nós temos a confiança em que [o tribunal] irá reconhecer a inocência", afirmou ao EL PAIS o advogado de Lula, Cristiano Zanin Martins.

A defesa do ex-presidente argumenta que ele “foi condenado sem que exista nenhuma prova da sua culpa”. A conclusão de Moro de que Lula recebeu o apartamento em troca de contratos da Petrobras está embasada, segundo Zanin, somente no depoimento do ex-presidente da construtora OAS Leo Pinheiro sem nenhuma outra prova material nem mais testemunhas que verifiquem essa acusação. “Durante o processo foram ouvidas 73 testemunhas, inclusive da acusação, e nenhuma delas fez qualquer afirmação que pudesse confirmar a acusação”, salienta Zanin.

O advogado também insiste em que existe uma “prova de inocência” de Lula que foi “desprezada pelo juiz”. Segundo a defesa, Moro, além de não conseguir demonstrar que o tríplex do Guarujá é propriedade do ex-presidente, ignorou um documento oficial no que está registrado que “100% dos direitos econômicos e financeiros do apartamento pertencem a um fundo ligado à Caixa Econômica Federal”. “Para que alguém tivesse atribuído qualquer forma de alienação em favor do ex-presidente Lula teria que ter pago o valor do imóvel em uma conta específica que estava indicada num contrato firmado entre a OAS e a Caixa, e isto jamais apareceu, porque essa prova não existe”, acrescenta Zanin. “É impossível que Leo Pinheiro tenha dado esse apartamento para o ex-presidente Lula sem que tenha prova de ter pago a Caixa Econômica Federal”.

A defesa entende que além do mais o processo deve ficar nulo porque Moro proferiu uma sentença que não está baseada nas acusações do Ministério Público. Os promotores de Curitiba assinalaram que os recursos para a compra e a reforma do apartamento saíram de três contratos entre a Petrobras e a OAS. “Como ao longo de processo nós demonstramos que não há nenhum recurso da Petrobras que foi utilizado para a compra do apartamento, o juiz Moro produziu uma nova acusação, que ele mesmo fez e julgou sem nenhuma prova, baseado exclusivamente no depoimento de Leo Pinheiro”, insiste o advogado Zanin.

Todas estas questões, segundo a defesa, demonstram que a condenação de Lula “não foi jurídica” e que Moro “teve a sua atuação confundida com o próprio acusador do caso”. “Segundo a legislação brasileira e internacional, essa atuação é incompatível com um julgamento imparcial”, afirma o advogado de Lula. Zanin opina que o julgamento do recurso do ex-presidente “não deve estar atrelado a nenhum processo eleitoral” e que por enquanto ele “permanece com todos os seus direitos políticos preservados”.

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