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Cinema
Crítica
Género de opinião que descreve, elogia ou censura, totalmente ou em parte, uma obra cultural ou de entretenimento. Deve sempre ser escrita por um expert na matéria

‘Atômica’ retrata a Berlim de 1989, uma cidade em chamas

O filme, que estreia neste dia 31, oferece múltiplas leituras, mas no final seu conjunto é bem vazio

Javier Ocaña

Berlim, 1989. Era uma época de sobressaltos em uma cidade assolada pela divisão. Mas, no fundo, se o cinema se empenha, também foi uma época elegante: o falso nostálgico como símbolo de distinção. O poder de fascinação de uma cidade de gelo, mas na realidade em chamas, em um cinema distanciado, longe da transcendência e que impõe uma representação estilizada da sujeira política e moral. É Atômica, filme de espionagem no estilo do século XXI, uma espetacular bolha de sabão sem recheio (ou muito pouco), baseada na série de graphic novels Atômica: A Cidade mais Fria, criada por Antony Johnson e Sam Hart, e editada no Brasil pela DarkSide Books.

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Em seu primeiro filme como diretor, a primeira coisa que fez David Leitch, que até agora havia trabalhado no departamento de especialistas de várias superproduções, foi converter a gélida história em quadrinhos (desenho em preto e branco, sutil e de traços simples) em uma explosão de cor e sensações que, além disso, vem acompanhada por um elenco carismático. E a novidade talvez seja que o habitual personagem romântico dos filmes de espionagem, com James Bond à frente, sempre uma mulher, leve o filme a uma nova dimensão: a do lesbianismo exposto com total naturalidade, ao ser armado com uma protagonista também mulher, a personagem de Charlize Theron.

Leitch, criado no ofício da luta e da ação, sucumbe à saturação da luta de artes marciais a cada quinze minutos, mas, em troca, mostra um estilo surpreendente, especialmente em um debutante, para filmá-las de forma extraordinária quase sem cortes, culminando no esplêndido plano-sequência de uma luta nas escadarias.

Desigual, embora nunca desprezível, Atômica tem aspectos interessantes e, num instante vem abaixo, como uma montanha-russa de sensações a favor e contra difícil de tratar. Diante de uma história capenga, cujo fio condutor é uma entrevista da qual se entra e sai com demasiada frequência, como um bom filme de espionagem contém um objeto desejado interessante e bem exposto. E com uma lista de canções de gosto refinado e muita força, Leitch as usa sem critério, como se as introduzisse para tapar buracos de talento e para elevar momentos carentes da solidez necessária.

Como as duplas e até triplas personalidades dos personagens, disfarçados do que não são, o filme também oferece múltiplas aparências. Mas, no final, domina apenas a fachada. Dentro, o conjunto vazio.

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