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Por que os boatos sobre câncer são tão persistentes?

Oferecemos um manual de instruções para desmontá-los

Patrick Sison (AP)
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Quando lançamos El Tragabulos, nossa página especializada em boatos, habilitamos uma direção de e-mail (eltragabulos@verne.es) para que os leitores nos enviassem as correntes de origem duvidosa que recebessem através das redes sociais.

Muitas dessas correntes, como pudemos comprovar, estão relacionadas com o câncer, seja com alimentos que o produzem e com substâncias que o curam. Já desmentimos os boatos de que batons, melancias com rachaduras e cosméticos causavam câncer. E também recebemos boatos sobre as supostas propriedades curativas de produtos como os sucos de beterraba e de graviola:

Marta Blanco, médica da Associação Espanhola contra o Câncer, é taxativa em suas declarações: “É verdade que quase um terço dos cânceres poderiam ser evitados com uma alimentação saudável, mas não existe nenhum produto milagroso contra o câncer. Devemos sempre desconfiar das mensagens que prometem recuperação instantânea”.

Ainda que muitos boatos sobre o câncer sumam rápido das redes sociais, como foi o caso da beterraba e da graviola, é fácil que sua mensagem encontre guarida entre a população. Afinal, é muito mais fácil difundir um boato na Internet do que desmenti-lo, como demonstra o fato de que, de acordo com a Organização de Consumidores e Usuários, o boato sobre os batons cancerígenos está há pelo menos uma década circulando.

Um dos principais motivos pelos quais os boatos se propagam é o medo: essas informações falsas costumam conter mensagens catastróficas e sentimos a vontade de compartilhá-las para prevenir nossos entes queridos.

Isso se encaixa, no caso do câncer, com o que nos conta por telefone Juan Antonio Cruzado, diretor do Master em Psico-Oncologia da Universidad Complutense de Madrid: “O câncer se transformou na doença mais temida por nossa sociedade, por isso é normal que as pessoas tenham um medo especial e compartilhem mais informação, mesmo que seja falsa”.

Juan Antonio Cruzado também indica outro dos fatores que, psicologicamente, explicam a profusão de boatos sobre o câncer: “As pessoas com câncer estão submetidas a um estado extremo de ansiedade, insegurança e desesperança. E em semelhantes condições somos mais vulneráveis às informações falsas que nos trazem esperança”.

Outra das razões que nos levam a difundir boatos em geral é que não nos custa nada fazê-lo. Basta apertar um botão para, em teoria, realizar uma ação solidária. Mas, do ponto de vista de Juan Antonio Cruzado, não devemos perder de vista que a difusão de informação falsa sobre o câncer tem sim um custo importante: “Causa falsas esperanças e frustração às pessoas que o sofrem. Além disso, pode fazê-las confiar em terapias alternativas sem nenhuma eficácia”, explica.

Como se combatem os boatos sobre câncer

Para reconhecer um boato devemos desconfiar das notícias que parecem boas demais para ser verdade, revisar as fontes do artigo, comprovar se a informação foi publicada em outros lugares, avaliar a credibilidade das outras notícias da página e entrar em sites dedicados exclusivamente a desmontar boatos.

Ao desmontar boatos sobre saúde, contamos com algumas vantagens em relação a outro tipo de informação. “Por ser um material extremamente sensível, o público geral dispõe de mais recursos. A melhor solução para saber a veracidade de uma informação é perguntar diretamente a seu médico”, diz Marta Blanco. A doutora também nos lembra da existência de associações de pacientes que, como a própria Associação Espanhola Contra o Câncer, dispõem de consultórios gratuitos online e telefones para resolução de dúvidas.

Além disso, por se tratar também de um assunto especialmente sensível, as autoridades nacionais e os órgãos internacionais costumam deixar muita informação à disposição do público.

Vamos voltar, por exemplo, ao boato das melancias com rachaduras que, supostamente, causavam câncer. A informação compartilhada nas redes sociais afirmava que as rachaduras se deviam ao uso de forclorfenurão, um composto químico cancerígeno. Como nos explicou José Miguel Mulet, biotecnólogo da Universidade Politécnica de Valencia, para desmenti-la bastaria acessar a base de dados da PAN (Pesticide Action Network, uma coalizão internacional de controle de pesticidas e que reúne informação de diferentes bases de dados de tóxicos), que demonstra que não existem evidências de que o forclorfenurão cause câncer.

Mais acima mencionamos a utilidade de se revisar as fontes de um artigo para identificar um boato. A doutora Marta Blanco nos recomenda desconfiar “dos artigos que se apoiam unicamente em um depoimento pessoal isolado”. Blanco nos lembra que as revistas especializadas costumam seguir protocolos muito rígidos de publicação: “Só devemos confiar nos artigos com bibliografa sólida”.

Outro dos remédios clássicos para se identificar um boato é acessar alguma página especializada, como a norte-americana Snopes e a francesa Les Décodeurs. E a nossa Tragabulos, claro, que também está no Telegram (https://t.me/tragabulos). A Snopes, a mais veterana dessas páginas, investiga boatos e lendas urbanas desde 1995. Isso faz com que os boatos sobre câncer sejam abundantes em seu site: que limões podem curá-lo, aspargos...

Nesses casos, como acontece com os boatos em geral, a melhor maneira de combate-los é quebrar a corrente quando não estamos seguros de sua autenticidade.

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