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Coluna
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Bolsonaro é pior do que Trump?

O Brasil precisa de um estadista moderno, progressista ou conservador, mas capaz de reunificar o país

Juan Arias
Eduardo Bolsonaro e seu pai, Jair Bolsonaro.
Eduardo Bolsonaro e seu pai, Jair Bolsonaro.Fabio Rodrigues Pozzebom (Agencia Brasil)

Nos Estados Unidos apresentaram Jair Bolsonaro como o “Trump brasileiro”. Pode ser verdade, mas com um acréscimo: para o Brasil, sua vitória seria mais perigosa do que a de Trump para os Estados Unidos. Sua candidatura, politicamente, é de extrema-direita, embora em assuntos econômicos já tenha defendido as teses mais opostas e contraditórias.

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Uma diferença importante em relação a Trump é que, apesar de que em ambos os países a presidência é muito poderosa, a Constituição dos Estados Unidos de 1787, diante da possibilidade da chegada de um aventureiro ao cargo máximo do país, dotou os outros dois Poderes, o Legislativo e o Judiciário, de um forte contrapeso em caso de excessos do presidente.

No Brasil, os outros dois Poderes, na prática, sempre estiveram bastante subordinados ao Executivo. O Legislativo, por exemplo, esteve muitas vezes de mãos atadas, sem exercer seu verdadeiro papel, dedicando-se a aprovar as medidas propostas pelo Executivo. O Judiciário também é muito mais forte e mais independente nos Estados Unidos do que no Brasil. Embora lá também seus nove membros sejam nomeados pelo presidente e ratificados pelo Senado como aqui, sua influência real é maior.

O fato de que no Brasil a democracia e as instituições do Estado sejam mais jovens e mais expostas às decisões de um Executivo forte faz com que um presidente como Bolsonaro, com sua índole violenta e seu retrocesso em matéria de direitos humanos e costumes, represente para o país um perigo muito maior do que Trump aos Estados Unidos.

Outra diferença, apesar de algumas semelhanças, inclusive grotescas e de ambas as personalidades, é que Trump é um empresário bilionário que chegou à política quase por esporte e pode, quando desejar e se cansar da função, voltar ao mundo dos negócios que é o seu. Bolsonaro é apenas político, como vários de seus filhos. Sem o mundo da política, não seria nada. É deputado há um quarto de século e já militou em seis partidos e talvez se candidate às eleições presidenciais por um diferente.

Há quem diga que Bolsonaro nunca ganhará as eleições porque as mulheres, que são maioria no eleitorado brasileiro, nunca votariam nele devido às suas ideias não apenas conservadoras como até mesmo perigosas e desrespeitosas em relação ao mundo feminino. O mesmo foi dito sobre Trump e ainda assim votaram nele.

É conhecido o machismo e o quase desprezo de Bolsonaro pela mulher, que diz que “deve ganhar menos do que o homem porque fica grávida”. E comentando sobre sua família, disse: “Tenho cinco filhos. Quatro são do sexo masculino. Depois dei uma relaxada e veio uma mulher”. Suas ideias perigosas sobre o estupro e os gays e lésbicas são mais do que conhecidas e reprováveis.

Nisso ele chega a superar Trump, apesar da vulgaridade com que o novo presidente norte-americano sempre tratou as mulheres, vistas mais como objeto sexual do que como pessoas. Talvez Trump seja até mais grosseiro com o mundo feminino, mas Bolsonaro é ideologicamente mais perigoso em matéria de sexo.

Dizem que Trump é amante da guerra e violento. Bolsonaro, se chegar à presidência, não seria uma ameaça militar, pois o Brasil não precisará declarar guerra a ninguém. No entanto, poderia representar um perigo ainda maior dadas as suas ideias sobre a violência. O ex-paraquedista defende a tortura e a pena de morte. “Eu sei matar”, disse dias atrás ao lembrar que, como ex-militar, sabe usar todas as armas. Chegou a elogiar, em seu voto a favor do impeachment de Dilma, o militar que a havia torturado na prisão.

Enquanto Trump e Bolsonaro se declaram “crentes”, o candidato brasileiro que acaba, dizem, de se tornar evangélico, é muito mais radical do que Trump na defesa de um estado confessional. Bolsonaro é contra a laicidade do Estado e a favor da imposição de um poder religioso no Brasil. “Deus está acima de tudo. Não existe, no Brasil, isso de Estado laico. O Estado é cristão e a minoria que é contra que se retire. A minoria deve se curvar à maioria”, disse no Congresso.

O Brasil está vivendo um momento crucial e perigoso, com uma sociedade dividida e em conflito. Se o país precisa de alguém para presidi-lo, é de um “pacificador”, não de um guerreiro com pretensões de violência e ideias medievais em matéria e costumes e direitos humanos.

O Brasil precisa de um estadista moderno, progressista ou conservador, mas capaz de reunificar o país e harmonizar as diferenças, capaz de unir as melhores forças da nação para um novo renascimento político e moral depois do cemitério de escombros que a corrupção político-empresarial está deixando.

Para conduzi-lo, o Brasil precisa, no jogo de xadrez mundial, de alguém que possa se colocar como fator de civilização e de contrapeso à propagação de ideias perigosamente atrasadas e violentas que hoje ameaçam a harmonia mundial.

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