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Um dia na vida de um trabalhador de uma cidade inteligente

Dispositivos informáticos já coletam dados para que a ideia das cidades inteligentes se torne realidade

Ponto de ônibus do futuro
Ponto de ônibus do futuroShutterstock

Esta manhã, o despertador de seu celular tocou 10 minutos antes do habitual. O acesso a algumas regiões da cidade está fechado por causa dos preparativos para uma badalada festa de fim de verão, por isso se espera que os congestionamentos sejam maiores que o normal. Vai ter que pegar o ônibus mais cedo para chegar a tempo ao trabalho.

A hora do alarme se adapta a sua sequência de rituais matutinos, controlada diariamente por seu relógio inteligente, e leva em consideração a previsão do tempo (se espera chuva às 7h), o dia da semana (é segunda-feira, e o trânsito sempre é pior às segundas-feiras), assim como o fato de que na noite passada, deitou-se tarde (é provável que, esta manhã, esteja mais lento do que de costume). O celular volta a tocar. É hora de sair, se quiser pegar o ônibus.

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Enquanto caminha em direção ao ponto, seu celular lhe sugere um pequeno desvio. Por alguma razão, a praça que você costuma atravessar está cheia de gente nesta manhã. Pelo caminho, você passa pela sua padaria favorita, e seu celular propositalmente deixa de avisar que hoje ela está oferecendo 20% de desconto. Afinal de contas, você tem pressa.

Depois de sua caminhada matinal, você se sente zerado e cheio de energia. Faz log-in no ponto de ônibus, dotado de conexão wi-fi e Bluetooth, e o motorista do próximo ônibus é informado. Ele já sabe que há 12 passageiros esperando, o que significa que, se for possível, terá que aumentar ligeiramente a velocidade para que todos tenham tempo de subir. A empresa de ônibus também recebeu um aviso, e já está acionando um veículo adicional para atender à forte demanda ao longo do seu trajeto. Enquanto você espera, repara num pai com duas crianças pequenas, que se entretêm com o sistema de informação com tela tátil instalado no ponto.

Quando o ônibus chega, o embarque é feito com fluidez. Quase todos os passageiros usam bilhetes armazenados em seus celulares, então a perda de tempo se limita a um caso de pagamento em dinheiro. No ônibus, você saca um tablet da bolsa para ficar a par de diversas notícias e emails, usando o wifi de bordo, gratuito. De repente, percebe que esqueceu de carregar o celular, então o conecta ao ponto de carga USB que há junto ao seu assento. Embora o tráfego seja muito lento, você consegue preparar a maioria dos seus emails de trabalho, então o tempo de viagem não foi perdido.

Você desce do ônibus na frente do seu escritório, e minutos depois seu chefe lhe informa sobre uma visita imprevista a um determinado lugar, então você faz reserva num programa de aluguel de veículos por horas, como o Co-Wheels. Pede um carro para o mesmo dia, com uma bicicleta dobrável no porta-malas.

Bicicleta dobrável
Bicicleta dobrávelMr.tinDC (Flickr)

Seu destino fica bem no centro da cidade. Por isso, quando chega num bairro próximo você deixa o carro compartilhado em um estacionamento (que, na verdade, é uma garagem que um membro do programa não utiliza) e pega a bicicleta com a qual passará o resto do dia, economizando tempo e evitando congestionamentos. Seu aplicativo de deslocamentos lhe dá instruções pelo fone de ouvido Bluetooth e oferece conselhos sobre como adaptar a velocidade na bicicleta à sua condição física. Como você tem um pouco de asma, o aplicativo sugere uma rota que evita uma área especialmente poluída.

Depois da reunião, você opta por pegar um táxi de volta ao escritório, o que lhe permite responder alguns emails no caminho. Com um leve toque no celular você pede o táxi, e nos dois minutos que este demora a chegar você dobra a bicicleta, preparando-a para ser devolvida no porta-malas de outro veículo compartilhado, perto do seu escritório. Como você tem pressa, hoje não vai ganhar pontos ecológicos por ir a pé, mas pelo menos chegou a tempo para a reunião, deixando de emitir vários quilos de dióxido de carbono no caminho.

Sejamos realistas

Pode ser que tudo isto pareça pura ficção, mas, para dizer a verdade, a maioria dos dados necessários para que esse dia se torne realidade já estão sendo colhidos de uma maneira ou de outra. Seu celular é capaz de determinar a sua localização, a sua velocidade e até o tipo de atividade que você está fazendo num determinado momento, seja de carro, a pé ou de bicicleta.

Seu histórico de buscas e seu comportamento nas redes sociais podem revelar seus interesses, seus gostos, e inclusive suas intenções

Ao mesmo tempo, os monitores de atividade e os relógios inteligentes são capazes de averiguar sua frequência cardíaca e sua atividade física. Seu histórico de buscas e seu comportamento nas redes sociais podem revelar seus interesses, seus gostos, e inclusive suas intenções. Por exemplo, os dados criados quando você consulta ofertas de férias pela Internet não só dão uma pista sobre aonde você quer ir, como também de quando quer viajar e quanto está disposto a gastar.

Além dos dispositivos pessoais, o desenvolvimento da internet das coisas, com seus sensores de todo tipo, distribuídos em redes e capazes de medir qualquer parâmetro – como a poluição atmosférica e a intensidade do tráfego –, é outra fonte de dados. Isto para não falar do constante deságue de informação ao seu alcance nas redes sociais, sobre qualquer tema que possa passar pela sua cabeça.

Com tantos dados à nossa disposição, você deve pensar que a imagem do seu entorno está quase completa. Mas estes conjuntos de dados se encontram depositados em sistemas separados, que não interagem e que estão administrados por entidades distintas, as quais não necessariamente querem compartilhá-los. Então, embora tenhamos a tecnologia, nossos dados continuam armazenados em organizações diferentes, e os obstáculos institucionais se interpõem no caminho que levaria a esse nível de serviços. Cabe a você decidir se isso é bom ou mau.

Marcin Budka é pesquisador principal de Ciência de Dados da Universidade de Bournemouth.

Cláusula de divulgação

Marcin Budka recebe financiamento da Innovate UK. O autor agradece as agudas contribuições de Tom Quay, diretor-gerente da We Are Base Ltd, e seu sócio no projeto de transferência de conhecimento.

Este artigo foi publicado originalmente em inglês no site The Conversation

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