_
_
_
_
_

Ataque aéreo ao Supremo Tribunal leva ao limite a crise venezuelana

Sala Constitucional tira o poder da Procuradoria e entrega suas funções à Defensoria do Povo

O helicóptero, durante o ataque ao Supremo
O helicóptero, durante o ataque ao Supremo

Enquanto um helicóptero da polícia científica disparava no fim da tarde da terça-feira contra a sede do Supremo Tribunal de Justiça da Venezuela, seus juízes estavam finalizando os detalhes de duas sentenças controversas. Uma delas diminuiu as funções da Procuradoria Geral da República, crítica de Nicolás Maduro, concedendo-as à Defensoria do Povo. A outra anula a recente nomeação do vice procurador-geral e deixa a nomeação de um sucessor nas mãos do Supremo Tribunal, controlado pelo chavismo. O ataque ao tribunal eleva a um novo nível a crise que sacode o país há três meses.

Mais informações
Assim se deu o fracasso da condenação da Venezuela na Assembleia da OEA
Leopoldo López grita na prisão: “Estão me torturando, denunciem!”
Muito empenho por nada: fracassa tentativa de pressionar Venezuela na OEA
Brasil nega venda de bombas de gás lacrimogêneo para a Venezuela

O helicóptero que realizou o ataque – efetuou disparos e lançou quatro granadas – era pilotado pelo inspetor da polícia científica Óscar Pérez e mostrava uma faixa dizendo “350 Liberdade”, referindo-se ao artigo da Constituição que autoriza os venezuelanos a rejeitar um regime que não respeite as garantias democráticas e despreze os direitos humanos. Pérez, contra quem foi emitida uma ordem de captura internacional na quarta-feira, subiu vários vídeos em Instagram nos quais garante que faz parte “de uma coalizão de militares, policiais e civis contra este Governo transitório e criminoso”. No entanto, nenhuma unidade militar expressou seu apoio a este ataque na quarta-feira. O vice-presidente, Tarek El Aissami, informou na quarta-feira que as autoridades localizaram o helicóptero em uma localidade no estado de Vargas, perto de Caracas, e indicou que por enquanto ninguém foi preso.

O presidente Nicolás Maduro condenou o ataque e prometeu capturar “cedo ou tarde” a tripulação responsável pelo incidente. “Este é o tipo de escalada armada que venho denunciando. Ativei as Forças Armadas Nacionais para defender o direito à tranquilidade. Condeno o ataque e exijo que a direção da Unidade Democrática [coalizão opositora] faça o mesmo”, acrescentou em uma cerimônia no Palácio Miraflores. Horas antes, o presidente tinha avisado: “Nunca vamos nos render, e o que não foi possível fazer com os votos, vamos fazer com as armas, libertaremos nossa pátria com as armas”.

Até o meio-dia de quarta-feira na Venezuela, a maioria dos Governos latino-americanos e da União Europeia não tinha condenado o ataque – Bruxelas pediu que todas as partes “coloquem um fim, urgente, à violência e evitem o uso da força” e o Brasil expressou sua “preocupação” pelo aumento das tensões. O novo chanceler, Samuel Moncada, se queixou com amargura do silêncio. Moncada não aspirava que os Governos apoiassem Maduro, mas que se solidarizassem com os civis que, na hora do ataque do helicóptero, estavam perto dos edifícios. Era uma maneira de tentar impor a ideia de que o regime da Venezuela enfrenta um grupo terrorista de direita e não uma oposição democrática.

O ataque ocorreu em um dia com duas decisões judiciais que são duros golpes do regime, que controla o Supremo, ao chavismo crítico que surgiu durante os protestos nos últimos meses. A líder desse movimento é a Procuradora-Geral da República, Luisa Ortega Díaz, cuja independência inesperada em relação ao Governo surpreendeu em meio aos protestos da oposição.

“Desmontagem progressiva”

Espera-se que o próximo movimento do Executivo de Maduro seja a nomeação de um número dois da Procuradoria de sua confiança e substitua Ortega Díaz com a convocatória da Assembleia Nacional Constituinte no início de agosto. A hierarquia governista prometeu transformar a convocatória para redigir uma nova Constituição na ocasião para um expurgo generalizado.

Com a decisão do Supremo, a Defensoria do Povo, também próxima ao Governo, agora poderá investigar, emitir pareceres, revisar expedientes, promover provas e receber denúncias sobre casos de direitos humanos, uma competência até então reservada ao ministério público. Como em outros casos, o chavismo cria um escritório paralelo para enfraquecer um órgão que pode exercer oposição. Algo semelhante fez o falecido presidente Hugo Chávez quando seu adversário Antonio Ledezma ganhou a prefeitura de Caracas nas eleições regionais de 2008. Maduro seguiu o exemplo nomeando protetorados em regiões controladas por forças opostas.

A decisão do Supremo transformou o Defensor do Povo, Tarek William Saab, no procurador-geral de facto. Ortega Díaz reconheceu nesta quarta-feira em uma coletiva de imprensa semelhante à oferecida para classificar como golpe de Estado as sentenças com as quais o Supremo assumiu os poderes do Parlamento. “Estamos testemunhando o desmantelamento progressivo do ministério público”.

Mais informações

Arquivado Em

Recomendaciones EL PAÍS
Recomendaciones EL PAÍS
_
_