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Doria reduz em 67% fila de exames, mas quase 200.000 ainda aguardam atendimento

Corujão da Saúde não contemplou todos os exames ofertados na rede, por isso fila não foi zerada em SP

João Doria em coletiva em que comemorou o fim da fila de exames.
João Doria em coletiva em que comemorou o fim da fila de exames. Fabio Arantes

O prefeito de São Paulo, João Doria (PSDB), anunciou no início da semana que uma de suas principais promessas de campanha, a de zerar a fila de exames herdada de Fernando Haddad (PT), havia sido cumprida com a realização do programa Corujão da Saúde. "Zeramos as filas na cidade. Compromisso feito, compromisso cumprido", disse o gestor, em um vídeo veiculado em seu Facebook. Doria, entretanto, não zerou a fila total de exames. Ele se referia apenas aos procedimentos atendidos pelo Corujão, que englobam 50 exames de seis tipos. Ficaram de fora da conta outros 112 exames não contemplados pelo Corujão e não mencionados explicitamente pela gestão ao tratar do tema. Com eles, a fila, no mês passado, se aproximava de 200.000 pedidos. Ainda assim, uma queda brusca, de 67%, quando comparada aos dados de dezembro, deixados pela gestão anterior: mais de 600.000 pedidos.

Com três meses completados na última segunda-feira, o Corujão da Saúde funcionou como uma espécie de mutirão de exames, que prometia usar horários ociosos de hospitais e laboratórios privados para a realização de procedimentos da rede pública, onde, em dezembro, uma pessoa chegava a esperar, em média, mais de cem dias (ou de três meses) por um exame. Em 10 de janeiro, quando o programa foi lançado, a gestão Doria anunciou que havia 485.300 pedidos na fila em dezembro de 2016. Este número referia-se apenas aos seis procedimentos que seriam o foco do programa: ultrassonografias, mamografias, tomografias, ecocardiografias, ressonâncias e desintometrias. 

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Mais de 120.000 exames, que envolvem procedimentos como colonoscopia (que auxilia a detecção de câncer no intestino), colposcopia (detecta lesões no colo do útero) ou eletrocardiograma (ajuda no diagnóstico de problemas cardíacos) não foram contemplados pelo mutirão. Hoje, para cada um deles, a média de espera, na ordem, é de 98 dias, 82 dias e 74 dias. Houve, entretanto, uma queda na demora de atendimento desses procedimentos neste ano. Em dezembro, ela era de 209 dias, 129 e 106, respectivamente. De todo modo, a espera ainda longa atualmente, em se tratando de exames que detectam doenças graves. (Leia sobre outros tempos de espera no quadro ao final).

A prefeitura afirma que com o Corujão a pasta pretendeu focar nos procedimentos com maior quantidade de pacientes aguardando na fila. De fato, a fila do final de 2016 apresentava uma demanda reprimida muito grande na maior parte dos exames escolhidos para o programa. Haviam, por exemplo, 113.665 pedidos aguardando, em média, 95 dias (3 meses) por uma ultrassonografia transvaginal, outro importante exame para detectar anomalias nos órgãos reprodutivos femininos. Com o mutirão, a espera passou para 48 dias (um mês e meio), com 23.314 pedidos acumulados -ainda é a maior fila de exames existente no município, de acordo com os dados de março da gestão Doria. Ao todo, a espera, que na gestão Haddad era, em média, de 109 dias, passou para 68 dias. Essa diminuição ocorreu tanto nos seis tipos de procedimentos contemplados pelo Corujão como nos outros procedimentos que não foram contemplados pelo programa.

Fila crescente

Os exames que não são contemplados pelo Corujão tiveram uma queda menor na quantidade em espera, de cerca de 40%. Em março deste ano, últimos dados detalhados disponíveis segundo a prefeitura, mais de 76.000 pessoas aguardavam por um desses 112 exames que não foram foco do programa.

Esses dados detalhados referentes ao mês de março, fornecidos agora ao EL PAÍS, permitem uma análise mais acurada da demanda existente na saúde municipal, um calcanhar de Aquiles da gestão Haddad e de prefeitos anteriores. A saúde pública foi considerada, em diversas pesquisas, o pior problema da cidade. Os dados mais recentes da fila de espera eram pedidos pela reportagem à gestão Doria desde o início de fevereiro, mas haviam sido negados tanto pela assessoria de imprensa do órgão quanto por meio da Lei de Acesso à informação, conforme noticiado por este jornal no mês passado.

A prefeitura não divulgava o tamanho da fila referente aos novos pedidos de exames que entravam na fila a partir de janeiro ou quantos exames do Corujão haviam sido feitos pela rede própria do município e pelos parceiros privados. Caso a maior parte dos exames estivesse sendo feita pela rede própria, os novos exames que entraram na fila a partir de janeiro poderiam estar se acumulando, se a rede municipal não tivesse obtido um reforço no número de atendimentos.

A fila de exames de São Paulo

Não atendidos pelo Corujão

Atendidos pelo Corujão

T.B

Dados da prefeitura repassados a pedido do EL PAÍS permitem uma radiografia da fila de espera de cada procedimento na cidade. Veja abaixo o que aconteceu com os principais exames ofertados na rede, tanto os atendidos quanto os não atendidos pelo Corujão da Saúde.

-Paquimetria ultrassonica (essencial para pacientes com glaucoma)

Dezembro 2016: 711 pedidos e demora de 71 dias

Março de 2017: 957 pedidos e demora de 101 dias

- Monitoramento Pelo Sistema Holter 24 Hs (para doenças cardíacas)

Dezembro 2016: 10.808 pedidos e demora de 132 dias

Março de 2017: 7.654 pedidos e demora de 89 dias

- Endoscopia digestiva alta (doenças do sistema digestivo)

Dezembro 2016: 29.520 pedidos e demora de 89 dias

Março de 2017: 15.855 pedidos e demora de 67 dias

- Eletroencefalografia (pode detectar um tumor cerebral ou epilepsia)

Dezembro 2016: 1.086 pedidos e demora de 152 dias

Março de 2017: 995 pedidos e demora de 118 dias

- Prova de função pulmonar completa (doenças pulmonares)

Dezembro 2016: 15.853 pedidos e 165 dias de espera

Março de 2017: 10.467 pedidos e demora de 92 dias

- Exame otoneurológico (auxilia o diagnóstico de labirintite)

Dezembro 2016: 1.579 pedidos e demora de 459 dias

Março de 2017: 942 pedidos e demora de 85 dias

- Ultrassonografia transvaginal (ajuda no diagnóstico de câncer do ovário)

Dezembro 2016: 113.665 pedidos e demora de 95 dias

Março de 2017: 23.314 pedidos e demora de 48 dias

- Ecocardiografia Transtoracica (diagnóstico de doenças cardíacas)

Dezembro 2016: 33.542 pedidos e demora de 112 dias

Março de 2017: 18.869 pedidos e demora de 79 dias

- Ultrassonografia mamária bilateral (diagnósticos de mama)

Dezembro 2016: 53.304 pedidos e demora  112 dias

Março de 2017: 16.702 pedidos e demora de 58 dias

- Ultrassonografia de tireoide (doenças da tireoide)

Dezembro 2016: 17.154 pedidos e demora de 87 dias

Março de 2017: 4.330 pedidos e demora de 62 dias

- Ultrassonografia de globo ocular (pode detectar tumor nos olhos)

Dezembro 2016: 74 pedidos e demora de 41 dias

Março de 2017: 40 pedidos e 79 dias

- Tomografia computadorizada de tórax (diagnóstico de lesões pulmonares)

Dezembro 2016: 5.072 pedidos e 178 dias

Março de 2017: 68 pedidos e 35 dias

Para analisar o progresso do Corujão, a gestão Doria criou um novo sistema informatizado. Ele é alimentado diariamente e, por isso, segundo a prefeitura, é possível saber que a fila apenas para os exames contemplados pelo programa já diminuiu em relação aos dados de março, usados nesta reportagem. Ela, agora, é de 88.060 exames. Pela análise desses dados mais recentes, percebe-se que a grande maioria dos pedidos que compõem esta fila foi de pedidos feitos entre janeiro e março deste ano. Houve, neste período, mais pedidos sendo atendidos do que chegando à fila. Na prática, com o Corujão, Doria fez nos primeiros três meses deste ano 39% mais atendimentos que a gestão Haddad neste mesmo período do ano passado, quando analisados apenas os exames que foram foco do programa.

Apesar de Doria divulgar o Corujão como um programa que levava pobres a "hospitais de rico, como Albert Einstein, HCor, Sírio-Libanês e Oswaldo Cruz", apenas 21% de todos os exames feitos no mutirão até esta semana foram realizados em instituições parceiras privadas. A maioria deles aconteceu no mês de março. O restante foi feito na rede pública, que, segundo a prefeitura, ganhou um reforço. Os quatro "hospitais de rico" citados pelo prefeito em diversas entrevistas fizeram, juntos, só 4,9% do total de exames.

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