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Promotoria acusa jovens detidos em protesto anti-Temer de organização criminosa

Os 21 manifestantes foram detidos antes de protesto contra o presidente, e liberados em seguida por juiz que considerou a prisão ilegal

Manifestação pelo fora Temer na Paulista no dia 04 de setembro de 2016.
Manifestação pelo fora Temer na Paulista no dia 04 de setembro de 2016.F. D. (REUTERS)
Marina Rossi

O Ministério Público de São Paulo enviou à Justiça uma denúncia contra o grupo de 21 jovens que foram detidos no dia 4 de setembro antes de uma manifestação pelo fora Temer em São Paulo e liberados no dia seguinte. A promotoria acusa o grupo, dentre eles três menores de idade, de organização criminosa.

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No documento, com cinco páginas com data do dia 15 de dezembro, os jovens são acusados de “prática de danos e danos qualificados consistentes na destruição, inutilização e deterioração do patrimônio público e privado e lesões corporais em policiais militares”. “Os ora denunciados e os menores acertaram que parte do grupo levaria consigo os objetos utilizados nas depredações – barra de ferro e disco metálico, parte carregaria produtos de enfermagem para realizar pequenos curativos em caso de lesões sofridas no confronto, outros transportariam máscaras e capuzes – para ocultar a identidade de todos – e um deles transportaria os telefones celulares dos demais em uma mochila”, diz a denúncia, a qual o EL PAÍS teve acesso.

O documento ainda aponta nominalmente quem exerceria cada uma das funções citadas. Afirma que na data da manifestação, o grupo se dirigiu até a rua Vergueiro, onde “distribuíram referidos materiais”. Mas “populares notaram o que estava por ocorrer e acionaram policiais militares”. Por fim, a denúncia pede que os jovens sejam interrogados, os policiais militares envolvidos no caso sejam ouvidos e o caso prossiga “até final condenação”. Assina a denúncia o promotor de Justiça Fernando Albuquerque Soares de Souza.

Detenções ilegais

Naquele domingo 4 de setembro, a maior manifestação pelo "Fora, Temer" ocorreu na cidade de São Paulo, que vinha sendo cenário de seguidos protestos contra o presidente nas últimas semanas. Um grupo de jovens que se conhecera pela internet combinou de irem juntos ao ato. Na época, um deles afirmou ao EL PAÍS que marcaram o encontro antes para não irem sozinhos ao protesto, por medo de represálias da Polícia Militar, que vinha havia reprimido os últimos protestos com bombas de gás.

O local de encontro era o Centro Cultural São Paulo, na rua Vergueiro, a cerca de três quilômetros da avenida Paulista onde era a concentração da manifestação. Chegando ao local, dezenas de policiais militares abordaram os jovens. Os 21 manifestantes foram então levados ao Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic), onde passaram a noite. No grupo, estava o capitão do Exército Willian Pina Botelho, que se apresentava como Balta Nunes, e fora apontado como infiltrado pelos jovens. Embora tenha participado da revista policial como os demais, Botelho foi o único que não foi levado à delegacia, o que aumentou a suspeita da infiltração.

Os manifestantes foram liberados no dia seguinte, após audiência de custódia. O juiz considerou as detenções ilegais. "A prisão ocorreu de um fortuito encontro com policiais militares que realizavam patrulhamento ostensivo preventivo e não de uma série e prévia apuração de modo que qualificar os averiguados como criminosos organizados à míngua de qualquer elemento investigativo seria, minimamente, temerário”, afirmou o juiz Paulo Rodrigo Tellini de Aguirre Camargo na sentença.

A participação do capitão Botelho numa possível operação do Exército em conjunto com a secretaria de Segurança Pública de São Paulo não é mencionada no documento do Ministério Público que agora foi enviado à Justiça. Revelado pelo EL PAÍS e pela Ponte Jornalismo, o caso levou o MP a afirmar que abriria uma investigação para apurar o que ocorreu. Além do MP de São Paulo, o MP Federal, o Ministério da Defesa e o próprio Exército abriram investigações.

Na época, a Câmara dos Deputados, por meio do deputado Ivan Valente (PSOL), pediu esclarecimentos sobre o caso. Até o momento, a resposta à Câmara foi a única que se tornou pública. Na semana passada, o Exército afirmou que buscou "acompanhar possíveis ameaças" à passagem da tocha olímpica naquela data em São Paulo. Fala em "monitoramento" e não em infiltração, e contraria a acusação protocolada agora contra os manifestantes. "Não há que se falar em infiltração, uma vez que o grupo que foi preso, naquela data, não era uma organização criminosa. Mas sim de livre adesão", diz o texto do Exército. "Manifestava-se de maneira ostensiva no ambiente cibernético e nas ruas, podendo receber tantos e quantos fossem os interessados em participar". 

Outra contradição deste caso ocorreu em outubro, pouco mais de um mês após o ocorrido, quando o comandante-geral do Exército, general Eduardo da Costa Villas Bôas afirmou que houve uma operação em conjunto com a secretaria de Segurança Pública naquela data. "Houve uma absoluta interação com o Governo do Estado", afirmou Villas Bôas. A secretaria de Segurança Pública do Estado nega. "Não houve qualquer operação conjunta durante as manifestações em São Paulo", afirmou o órgão, por meio de nota, naquela época.

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