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Edmar Bacha: “Sem a PEC, alternativa é um calote grego ou hiperinflação”

Segundo economista, medida é caminho que obriga sociedade a resolver conflito da falta de recursos

Economista Edmar Bacha.
Economista Edmar Bacha. Pedro Carrilho (Folhapress)

O Senado aprovou em segundo turno a  PEC do Teto de Gastos, um projeto imprescindível para ajustar as contas públicas, na visão de muitos economistas. Edmar Bacha, doutor em economia em Yale, nos Estados Unidos, e um dos pais do Plano Real, avalia que a polêmica PEC 55 é condição essencial para a tão desejada retomada da economia e critica a corrente de especialistas que enxergam alternativas à emenda. Em entrevista ao EL PAÍS por telefone, Bacha ressaltou que o Governo comandado pelo presidente Michel Temer nos últimos meses está longe de ser o ideal, mas é o possível.

Pergunta. Existiam alternativas melhores do que a PEC 55 para conter o rombo nas contas públicas brasileiras?

Resposta. Eu não vejo alternativa porque já chegamos em uma situação que não dá para aumentar os impostos e existe um enorme déficit. Não só o atual, mas como de perspectiva devido ao custo crescente da Previdência pela frente. Nós estamos numa situação em que a dívida pública cresceu muito fortemente nos últimos anos criando a perspectiva de que, se as coisas continuassem como estávamos, o país entraria em insolvência. Estávamos numa situação muito dramática se nada fosse feito. Então a PEC do teto dos gastos é um caminho muito interessante porque força o sistema político a resolver os conflitos que se estabelecem no orçamento com base na capacidade efetiva que o Governo tem de arrecadar impostos e não mais simplesmente no desejo de políticos de gastar o que eles não têm.

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P. Vinte anos não é muito tempo para uma medida de contenção?

R. O problema é que o buraco que existe nas contas públicas é muito grande, e a projeção é de que levaremos pelo menos dez anos até conseguir fazer a dívida começar a cair. Eu acho que os vinte anos só refletem a dramaticidade da situação. A grande importância dessa medida é que gera um efeito sobre as expectativas. Se você tem um compromisso de duas décadas, de longa duração, e que projeta uma queda da dívida substantiva, você tem efeitos muito importantes hoje. Caso o país fique insolvente, a taxa de juros tende a ficar estratosférica. Já com uma perspectiva de resolução fiscal pela frente isso cria um efeito favorável para os detentores da dívida contê-la com taxas de juros muito mais baixas do que a que temos. O compromisso de vinte anos é uma forma de fazer que as taxas de juros baixem muito fortemente e que, daqui a cinco anos, possamos ter taxas civilizadas. Isso permitiria, em dez anos, dispensar a necessidade da PEC, por exemplo. No entanto, tudo depende das expectativas, e o que a PEC faz é criar expectativas favoráveis sobre o reequilíbrio das contas públicas e isso influencia muito na taxa de juros. Ela é, ao lado da Previdência, um dos maiores problemas do Brasil.

P. A Previdência não seria mais importante para o reequilíbrio?

"A PEC é  interessante porque força o sistema político a resolver os conflitos no orçamento com base na capacidade efetiva que o Governo tem de arrecadar impostos, e não mais no desejo de políticos de gastar o que eles não têm"

R. Não haverá reforma da Previdência se antes não houver a PEC do Teto de Gastos. A Previdência atinge interesses muito fortes dentro da sociedade brasileira. Há enorme resistência. Para conseguir essa reforma, você precisa fazer um grande contrapeso na sociedade e o caminho é limitando o gasto total. Dessa maneira fica claro que, se você não reformar o sistema de aposentadorias, não vai sobrar dinheiro nem para a educação nem para a saúde.

P. A PEC 55 atingiu um ponto sensível já que fala em mexer na verba da saúde e da educação...

R. Justamente para não mexer nesses setores vão ter que aprovar a Previdência. É uma lógica política. A sociedade é feita de conflitos, que precisam ser resolvidos democraticamente dentro da capacidade do Governo. Se não for aplicada essa PEC, a alternativa será uma calote grego ou uma hiperinflação brasileira.

P. Mas você acha que estamos no nível dessas duas alternativas?

R. Essas são as duas perspectivas se nada fosse feito. Esse era o caminho que estávamos trilhando.

P. Há dois anos o Brasil vive essa contenção de gastos, de investimentos e um clima de ajuste. Como conseguiremos fazer o Brasil voltar a crescer?

R. O primeiro problema é o de confiança, quando há perspectiva de uma falência do Estado ninguém vai investir neste país que está falindo. Estamos vivendo um momento de transição, à medida que o tempo passa a confiança aumenta, com a PEC e quando o Governo passar a Previdência acredito que terá uma retomada dos investimentos e da confiança.

P. Desde a chegada de Temer se fala nessa retomada da confiança, mas não estamos vendo muitos indícios. Temer agora falou em uma retomada da taxa de emprego no fim de 2017 e revisou o PIB deste e do próximo ano. Qual a sua opinião?

R. Um problema adicional é a situação internacional. Parte da dificuldade do Brasil decorre da inversão da bonança que tivemos até 2011, preços de commodities e entradas de capital. A economia internacional está crescendo a taxas baixas e isso dificulta retomar as exportações brasileiras. Enquanto não houver uma confiança efetiva de que haverá continuidade das políticas de ajuste a partir de 2019, a retomada será fraca necessariamente. É um problema porque os investidores fazem investimentos de longo prazo embora as regras tenham mudado para favorecer os investimentos. Isso tudo leva tempo porque os investidores se perguntam: vai durar?

P. Qual a sua avaliação do Governo Temer?

R. Quando você entra numa situação desesperadora, como a que Dilma colocou o Brasil, o que você tem pela frente é o único caminho visível. Não é uma Brastemp, mas é o possível no momento. Obviamente não é o Governo dos nossos sonhos, mas era o possível, já que ele era o vice-presidente e com legitimamente assumiu o país. A reforma tributária não dá tempo nesse mandato, mas estão acontecendo algumas coisas em paralelo como a mudança da exploração do pré-sal, por exemplo. As reformas das estatais e dos fundos de pensão também podem ser feitas nesses dois anos.

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