_
_
_
_
_

O assassino da família brasileira na Espanha está solto no Brasil

Guarda Civil espanhola dá por resolvido o crime de esquartejamento, mesmo sem prender suspeito

Imagem tirada do Facebook, de Marcos Nogueira e Janaína Santos Américo, o casal brasileiro esquartejado em Pioz (Guadalajara). Em vídeo, declarações do Ministro do Interior (ATLAS).Foto: reuters_live | Vídeo: EFE
Mais informações
Foi assim que os assassinos da família brasileira em Guadalajara apagaram seus rastros
Pai da família esquartejada na Espanha vivia no país há mais de 10 anos
Dois adultos e dois menores brasileiros esquartejados na Espanha
Sobrinho da família brasileira esquartejada na Espanha é suspeito do crime

François Patrick Nogueira Gouveia. Seu nome e seu rosto sorridente inundaram as redes sociais nos últimos dois dias em ambos os lados do Oceano Atlântico. Da Espanha ao Brasil e do Brasil à Espanha. “O esquartejador de Guadalajara”, anunciava sua fotografia no Twitter. Para os investigadores da Guarda Civil espanhola, ele é o assassino múltiplo “de caráter psicopata, narcisista, egoísta e desprovido de apego à vida humana” que cometeu “o crime atroz de uma família em Pioz”, Guadalajara.

Para as autoridades brasileiras, que o interrogaram em suas dependências em João Pessoa (capital do Estado da Paraíba) há alguns dias, é um jovem com antecedentes criminais –apunhalou violentamente um professor quando tinha 16 anos– que agora é reclamado pela justiça espanhola. E depois de tomar seu depoimento na presença de seu advogado o deixaram ir por considerar que “as provas contra ele não eram suficientes”, segundo explicaram os agentes espanhóis.

Apesar de não ter prendido o principal suspeito do crime –"a coautoria não está sendo contemplada”– os responsáveis pela investigação do Instituto Armado dão o caso como resolvido. Assim afirmaram numa concorrida entrevista coletiva que concederam na terça-feira em Guadalajara. Na coletiva, afirmaram que as primeiras hipóteses que apontavam para “assassinos profissionais” possivelmente ligados ao tráfico de drogas “foram descartadas conforme avançava a investigação e se conheciam os detalhes da família e a existência de um quinto membro que não aparecia”.

Sem poder fornecer dados concretos, porque prevalece o segredo de justiça em grande parte da investigação, dizem ter “numerosos indícios e provas indubitáveis” de que o rapaz de 20 anos de idade é quem matou os quatro componentes dessa jovem família brasileira, um casal de 30 anos e seus dois filhos de quatro e um ano. No dia 18 setembro eles foram encontrados degolados, esquartejados (os dois adultos) e colocados em sacos plásticos lacrados em um chalé num tranquilo condomínio na periferia da referida cidade. “Havia a intenção de se desfazer dos corpos e destruir provas”, dizem os investigadores.

As vítimas são os próprios familiares do suposto assassino: seu tio Marcos Campos Nogueira, a mulher deste, Janaína Santos Américo, e os dois filhos do casal, seus sobrinhos. Estavam mortos havia mais de um mês, como revelou depois o relatório do legista. Mas com todos eles François Patrick teria convivido e compartilhado moradia por ao menos quatro meses. “Morou com eles até que se mudaram para Pioz”, afirmaram os investigadores.

Apenas dois dias depois que os agentes do distrito de Horche estiveram na casa por causa da queixa de um vizinho que reclamava do “forte odor” e encontraram a macabra cena do crime, François Patrick pegou um avião em Madri rumo ao Brasil.

Ele adiantou a passagem de volta ao seu país, que estava marcada para 16 de novembro. “Em nenhum momento, nem antes nem depois que os corpos foram encontrados, ele veio denunciar o desaparecimento de seus familiares”, dizem os investigadores, que veem nessa atitude um indício de culpa, somado à sua aparente fuga antes do tempo. François Patrick voou para o Brasil no dia 20 de setembro, onde permanece até hoje, “supostamente vigiado pelas autoridades”, dizem os investigadores, que deixam nas mãos de seus colegas brasileiros a prisão do seu suspeito número um.

De acordo com a imprensa local, François Patrick se defendeu das acusações dizendo que seus restos biológicos encontrados junto às vítimas se deviam ao fato de que ele tinha morado com elas. E é precisamente nessa convivência onde parece estar a chave da investigação.

O suposto autor estaria supostamente obcecado por sua tia Janaína. Ela mesma tinha se queixado de sua atitude a seus familiares no Brasil durante o tempo que moraram na mesma casa. Mas diante do caráter violento do rapaz e de seu “perfil psicótico”, a família teria decidido se afastar dele. Fugir. Esconder-se em Pioz. Mas o sobrinho os encontrou lá um mês depois e os teria matado, com uma faca na mão e “de maneira sequencial”, um por um.

O “motivo passional” está sobre a mesa, embora “não se descartem outras motivações do autor”, que incluiriam seu próprio perfil violento e doentio.

O assassino está solto no Brasil. E, sabendo que os “cidadãos brasileiros não são passíveis de extradição para a Espanha”, a Guarda Civil “vai emitir uma ampliação da comissão rogatória às autoridades brasileiras para poder enviar ao Brasil uma equipe de investigadores” para colaborar com seus colegas e dar caça ao principal suspeito do brutal crime, “fornecendo mais provas que convençam os brasileiros”.

No entanto, os espanhóis responsáveis por pelo caso afirmaram na terça-feira que “três dias depois da horrível descoberta dos corpos já foi possível apontar o principal suspeito ao juiz” e que por isso, em 22 de setembro, o Tribunal de Instrução número 1 de Guadalajara apresentou uma ordem internacional de prisão contra François Patrick Nogueira Gouveia. Não parece ser surtido muito efeito.

Justiça brasileira analisa provas do caso

A Polícia Federal do Brasil esclareceu em um comunicado que desde que soube do caso colabora com a polícia espanhola. “A Constituição Brasileira veta a extradição de brasileiros a outros países e sua prisão para esse fim”, explica a polícia na resposta ao pedido de prisão não realizado do jovem pela Interpol.

Dentro dos acordos de colaboração dos dois países, as autoridades policiais espanholas, segundo seus homólogos brasileiros, devem agora enviar as provas do caso “indispensáveis para a resolução do crime” que demonstrem a culpa de Patrick Nogueira para inclui-las em uma investigação policial já aberta no país. Com todos os indícios em poder das autoridades locais, será um juiz brasileiro que terá a responsabilidade de analisá-las e, posteriormente, decidir sobre uma ordem de prisão contra o suspeito.

A Polícia já tomou a declaração de Patrick, que tomou um avião ao Brasil no dia 22 de setembro, dois dias após a descoberta dos corpos de seus tios e sobrinhos. O jovem, de 20 anos, foi voluntariamente a uma delegacia dias depois para prestar depoimento. A julgar pelas palavras de seu advogado em entrevista ao Fantástico, da TV Globo, o jovem não admitiu sua participação no crime. De acordo com o advogado, a família viveu por quatro meses com o suspeito em Torrejón de Ardoz e se mudou a Guadalajara sem revelar seu novo endereço.

“O tio prometeu que voltaria para buscá-lo, mas nunca mais deu notícias”, disse o advogado. “Ele não veio ao Brasil como um foragido. Decidiu voltar porque temia até mesmo por sua integridade física [após tomar conhecimento da notícia]. É normal que existam amostras de DNA nos objetos da casa porque viveu com eles, mas não na cena do crime porque ele não sabia nem qual era o novo endereço”, disse o advogado em entrevista.

O “quinto membro” de uma família humilde

P.O.D.

Um rapaz com antecedentes. François Patrick Nogueira, de 19 anos, tinha antecedentes criminais por ter brutalmente agredido um professor na frente de seus colegas quando tinha 16 anos. Atribui-se a ele um "caráter violento" próprio de "psicóticos".

Sem ocupação na Espanha. Chegou ao país há alguns meses, mas não há conhecimento de que tivesse qualquer ocupação. Morou por quatro meses em Torrejón de Ardoz com seus tios, que mais tarde degolaria com seus filhos pequenos da família, morta degolada depois.

Uma família humilde. De acordo com a Guarda Civil, as vítimas eram "uma família normal, trabalhadora e humilde". Marcos, o único empregado, não aparecia ao trabalho desde 17 de agosto.

Mais informações

Arquivado Em

Recomendaciones EL PAÍS
Recomendaciones EL PAÍS
_
_