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Cartagena, a cidade que se prepara para a assinatura de paz com as FARC

Cidade do Caribe colombiano se prepara para o maior acontecimento da história recente do país

Sally Palomino
Timochenko se despede de Carlos Antonio Lozada antes de partir para Cartagena.
Timochenko se despede de Carlos Antonio Lozada antes de partir para Cartagena.Ricardo Mazalan (AP)

Chamada de “A fantástica”, “A cidade amuralhada”, Cartagena das Índias tem tantos apelidos quanto história, mas talvez o título que mais lhe honre é “A heroica”. A cidade caribenha foi atacada em 1815 durante mais de cem dias em uma tentativa de reconquista espanhola. Sua resistência lhe valeu o título que ainda hoje seus moradores continuam repetindo com orgulho.

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Também foi nessa cidade onde o jesuíta espanhol San Pedro Claver dedicou sua vida a ajudar os escravos, e, em honra à sua defesa dos direitos humanos, Cartagena foi nomeada pelo presidente Juan Manuel Santos como “a cidade da paz”. Lá será realizada na segunda-feira a assinatura dos acordos entre o Governo e as FARC, talvez o momento mais importante da história contemporânea da Colômbia. “San Pedro Claver foi proclamado como o grande defensor dos Direitos Humanos. Esse processo de paz teve como uma de suas características que colocam as vítimas, os Direitos Humanos, como o centro da solução para esse conflito”, disse Santos quando fez o anúncio. O presidente, a equipe negociadora e a delegação guerrilheira já se encontram na cidade.

Cerca de 2.500 pessoas foram convidadas para o evento que oficializará o acordo, que pretende dar fim a 52 anos de guerra. Confirmaram presença no ato os presidentes de Argentina, Bolívia, Costa Rica, Cuba, Chile, Equador, El Salvador, Guatemala, Honduras, México, Panamá, Paraguai, Peru, República Dominicana e Venezuela, além do rei emérito da Espanha, Juan Carlos I, o ex-premiê espanhol Felipe González, os ex-presidentes Ernesto Zedillo (México) e José Mujica (Uruguai) e o ex-secretário da ONU Kofi Annan, entre outras importantes personalidades.

Os preparativos de segurança, que começaram cinco dias antes e se prolongarão ao menos por mais três depois da assinatura do pacto, abriram novamente o debate sobre a violência que atinge essa cidade, que abriga em sua área urbana cerca de um milhão de moradores. Segundo o estudo Cartagena, Como Vamos, ainda que em 2015 a taxa de homicídios tenha diminuído em comparação com o ano anterior, houve mais mortes por conflitos de gangues. A falta de oportunidades e os problemas sociais se manifestam também nos números. O mesmo levantamento adverte que Cartagena é uma das oito cidades com maior população na pobreza e na pobreza extrema. Entre os jovens, 46,6% não estão registrados no sistema educacional.

Melhorar as condições da cidade que será testemunha da paz é uma das grandes cobranças que seus habitantes fazem. O prefeito da localidade, Manuel Vicente Duque, disse que Cartagena deve se preparar com uma “maquiagem importante” para o acontecimento histórico, em que serão ouvidos o presidente Santos e o líder das FARC, Rodrigo Londoño. A frase de Duque fez relembrar outros episódios em que os moradores de Cartagena viram como as autoridades encontram soluções rápidas (e muitas vezes momentâneas) para mostrar a cidade em sua melhor versão. Em 2012, com a Cúpula das Américas, aconteceu algo parecido. Em questão de dias ruas foram consertadas e a iluminação foi melhorada em algumas áreas antes da chegada dos mais poderosos políticos do continente. A população protestou, a resistência de seu passado parece continuar em suas veias.

Por isso, não se descarta que na segunda-feira se levantem vozes em Cartagena como forma de reclamar pela pouca atenção que receberam mediante seus problemas. A moradia de 72% das pessoas tem infraestrutura precária, e os jovens enfrentam a difícil realidade que aponta que uma de cada cinco grávidas nessa cidade é uma menina adolescente, entre 10 e 19 anos.

A exigência por melhores políticas públicas é uma manifestação recorrente nessa cidade, que fica localizada na região que dá o apoio mais alto para o sim no plebiscito. Lá, segundo a última pesquisa de opinião do Datexco, realizada para o El Tiempo e a W Radio, 72,2% dos entrevistados afirmaram que apoiam o processo. Não é para menos que nesse departamento, Montes de María, tenham ocorridos massacres e muitos agricultores tenham sido forçados a deixar suas casas escapando da guerra. Agora, querem voltar e a esperança está depositada no acordo de paz.

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