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Fotógrafos relatam violência policial em protestos em São Paulo

Sindicato publicou nota condenando abordagem aos profissionais e cobrou audiência com Governador

Ação policial durante ato em 2 de setembro
Ação policial durante ato em 2 de setembroPaulo Pinto (AGPT)

Uma barreira de policiais militares posicionada logo depois das catracas aguardava quem saía de dentro da estação Sé do metrô, em São Paulo, no último dia 7. Era Dia da Independência e lá em cima, em frente à Catedral da cidade, um protesto contra o Governo de Michel Temer estava prestes a começar. Uma família que ia ao Shoppping Light, na região, foi retida para revista, um garoto que estava fazendo turismo também. Mas os alvos preferenciais para averiguação eram fotógrafos que iam cobrir o protesto.

Um deles, que já trabalhou nas principais redações do país e hoje atua como freelancer, foi ameaçado de ser levado para uma delegacia. “Eles ficaram perguntando onde eu morava, por que estava com capacete, por que era carioca e estava indo a um protesto em São Paulo”, contou. Quando um grupo de jornalistas chegou ao local da abordagem, foi liberado. Outro parado foi Vinicius Gomes, 19 anos, que trabalha no coletivo independente Afroguerrilha. Era a segunda vez que ele tinha contato direto com a polícia desde o afastamento definitivo de Dilma Rousseff. No dia 31 de agosto, foi agredido em uma abordagem, levou cinco pontos na cabeça e teve seu equipamento de trabalho jogado no chão e destruído.

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Denúncias de abuso policial contra fotojornalistas não são novidades. Um fotógrafo que preferiu não se identificar contou que em 2014, depois de ser alvo de uma ação violenta da polícia e aparecer em algumas reportagens, passou a ser perseguido, inclusive com ligações e intimidações em sua casa. “Eles estacionavam a viatura do lado de fora e ficavam algumas horas na porta”, disse. Também ficou conhecido o caso do fotógrafo Sérgio Silva, que perdeu um olho após ser atingido por uma bala de borracha da PM em protesto em junho de 2013 – em uma decisão controversa, a justiça ainda o considerou culpado pelo incidente.

Com tudo isso, o Sindicato dos Jornalistas de São Paulo publicou uma nota em repúdio à ação da polícia nos últimos dias e pediu uma audiência com o Governador Geraldo Alckmin (PSDB). Por enquanto, não obteve nenhuma resposta. Para o diretor do Sindicato, Alan Rodrigues, o caso de Gomes que teve seu equipamento quebrado, ilustra bem a escalada de violência contra profissionais da imprensa. “Hoje, o perfil do fotojornalista mudou, é difícil ver alguém que trabalha fixo em um jornal. Geralmente são freelas e profissionais que atuam em mídias alternativas. Esses têm sido alvos preferenciais. Claro que ninguém merece esse tratamento, mas acreditamos que a polícia os vê como ativistas e não trabalhadores, aí a abordagem é pior ainda”, diz Rodrigues.

Gomes conta que no dia 31, após de ter sido vítima de socos e chutes, foi levado para uma delegacia, depois para um pronto-socorro onde recebeu atendimento médico, e, por fim, novamente para delegacia. Tudo começou por volta das 21h e só foi terminar lá pelas 4h da manhã. Neste ínterim, ele contou ter ficado mais de 40 minutos de pé, virado para a parede, enquanto os advogados acionados pelos fotógrafos que viram a abordagem da polícia não chegavam à delegacia. “No final, tivemos que assinar um B.O não criminal e fomos liberados”, contou.

Agora, o coletivo Afroguerrilha está fazendo um crowdfunding para comprar novo material para Gomes e, no domingo, uma ação conjunta de fotógrafos irá vender fotografias no vão do Masp para arrecadar dinheiro. “Acho que até por eu ser negro, sou um alvo mais visado. Durante todo o tempo em que estive na delegacia percebi que o meu tratamento era diferente de outro fotógrafo que foi levado junto comigo. Eles ficavam me chamando de neguinho, perguntando se eu nunca tinha sido preso por fumar um baseadinho”, diz Gomes. Ele conta que a presença de fotógrafos negros em cobertura de protestos é cada vez maior. “A gente está conseguindo comprar nosso equipamento agora e isso, na verdade, é maravilhoso. Seria ótimo se cada jovem negro tivesse uma câmera para registrar nossa realidade”.

Nesta terça-feira (6), a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), órgão do Ministério Público Federal, disse que vai monitorar as ações das policias do Rio de Janeiro e de São Paulo durante as manifestações de forma geral. Rodrigues disse que nunca havia presenciado uma situação tão tensa como a que está acontecendo em São Paulo entre policia e jornalistas. “Cerca de 30 fotógrafos já entraram em contato com o sindicato para relatar agressões”, conta. Procurada pelo EL PAÍS, a Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo não se pronunciou sobre o caso de Vinícius Gomes ou sobre a nota publicada pelo Sindicato até o fechamento desta reportagem.

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