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As raízes do golfe surgem num campo recém-construído no Rio

Adilson da Silva fazia tacos de golfe cortando galhos de árvores com uma faca Décadas mais tarde, o golfista fecha no Rio o seu ciclo vital

Carlos Arribas
Adilson Da Silva.
Adilson Da Silva.ANDREW BOYERS (REUTERS)
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Não existe história de grande golfista do século XX que não inicie com um menino pobre que começa a ganhar a vida revendendo bolas perdidas de um campo não muito distante de sua casa, dando tacadas escondido e sendo caddie de vizinhos ricos aos 11 anos para trazer alguns trocados para casa. Assim é a vida de Adilson da Silva, que fazia tacos de golfe cortando galhos de árvores com uma faca, aprendia e inventava tacadas e jogava como ninguém em Santa Cruz do Sul, não longe Porto Alegre. Décadas mais tarde (o golfista tem 44 anos), Silva, já profissional, o único brasileiro no Rio, fechará seu ciclo vital e carregará de símbolos o momento, dando na quinta-feira, em Marapendi, a primeira tacada do torneio de golfe, que retorna aos Jogos Olímpicos 112 anos depois de ter saído da programação.

Também é significativo que o último golfista a participar do primeiro dos quatro dias de disputa seja o espanhol Rafa Cabrera-Bello, o protótipo do golfista do século XXI, formado em escolas e protegido pela federação antes de sair do ovo e ganhar a vida como profissional. Na equipe espanhola, será acompanhado por Sergio García. Eles jogarão num campo novo, um campo público recém-construído ao lado do Atlântico que, se para muitos lembra um links escocês [tipo específico de campo, em áreas costeiras, com dunas de areia], e a chuva fria e o vento sul da quarta-feira acrescentavam entusiasmo a milhares de milhas mais ao sul, para Manolo Piñero recorda os campos australianos de Melbourne, os de que mais gosta por sua beleza. Piñero, ótimo golfista depois de ter começado como caddie ainda menino no Club de Campo de Madri, a mesma história que os grandes nomes da sua geração, é o capitão da equipe espanhola.

Silva terá como caddie Andrew Edmonson, o comprador de tabaco que vinha do Zimbabwe ao Brasil todos os anos para jogar golfe e tinha como caddie o menino brasileiro. Mas jogava tão bem que numa viagem de volta para a África Edmonson o levou consigo e o inscreveu numa escola dirigida por Tim Price, o irmão de Nick, o zimbabuense que ganhou o Open em 1994.

O golfe procura revelar suas raízes duras no Rio, de caddies escoceses que no século XIX, descalços e em farrapos, mais fortes do que o frio e o vento, sempre ganhavam o Open. Essa será sua imagem olímpica, sua cara mais de escola de vida e superação, fugindo da imagem elitista que tanto o prejudica. Ser um esporte, mas sem deixar de ser golfe. Os melhores do ranking mundial estarão ausentes. Não virão Jason Day, Dustin Johnston, Jordan Spieth ou Rory McIlroy, mas talvez a ausência deles não seja tão importante para o objetivo do golfe no Rio: como todos sabem, nos Jogos, além da excelência esportiva se aplaudem especialmente as histórias humanas. Não se valorizam as estatísticas, mas as experiências de vida.

“É como uma volta aos tempos de amador, quando você jogava pensando apenas na vitória e no troféu, não no dinheiro”, diz Sergio García, feliz como um adolescente na Vila Olímpica como seu amigo Rafa Nadal e aspirante, como o tenista canhoto, a uma medalha. A mesma opinião tem Cabrera-Bello, que não deixou de desfrutar do festival Olímpico entre os treinamentos diurnos num campo que aprecia e as noites como espectador do basquete, da natação, do tênis, da ginástica, do que fosse. “É uma sensação bacana a que estou tendo”, diz o canário, que disputará uma partida com o favorito, o sueco Henrik Stenson, vencedor do último Open. Um jogador bacana para uma aventura olímpica que o golfe quer que seja mais bacana ainda.

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