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Cinema bolivariano para lembrar Bolívar e o general Miranda

Cultura oficial impõe filmes e séries sobre os heróis

Jacobo García
Reprodução do filme 'Miranda regresa'.
Reprodução do filme 'Miranda regresa'.

Os venezuelanos estão acostumados às cadeias de transmissão nacionais e à aparição surpresa na tela dos presidentes Hugo Chávez, primeiro, e Nicolas Maduro, hoje. No entanto, estão menos habituados a que estas cadeias sejam para impor filmes que interrompem a novela.

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Os eventos para lembrar o bicentenário da morte do general Francisco Miranda, falecido em 14 de julho de 1816, incluíram uma invocação durante um ato militar do general Padrino López e um filme alegórico em cadeia nacional.

A transmissão obrigatória de Miranda regresa foi parte de uma série de atividades civis e militares “para mostrar o pensamento mirandino e emancipador da pátria grande”, disse Maduro ao anunciar a emissão.

O filme Miranda regresa, produzido em 2007, é um longa-metragem sobre a vida do militar nascido em Caracas até a sua morte na prisão de Cádiz, contada através dos olhos de um jornalista mexicano que entra em sua cela para fazer uma entrevista.

Bolívar, muito mais que Miranda, Zamora e o próprio Hugo Chávez, é a figura mais prolífica, cinematograficamente falando, do chavismo

Para este fim de semana, nascimento do libertador Simón Bolívar (Caracas, 24 de julho de 1783) também está sendo preparada uma programação especial com transmissão de documentários e filmes sobre sua vida.

Bolívar, muito mais do que Miranda, Zamora e do próprio Hugo Chávez, é a figura mais prolífica, cinematograficamente falando, do chavismo.

Nos últimos anos, foi lançado Bolívar, o homem em dificuldades (2013) e Libertador. O primeiro foi dirigido por Luís Alberto Lamata, um dos diretores de cinema e televisão de maior prestígio do país. Uma versão semi-ficcional da vida do herói durante seu exílio no Haiti, entre 1815 e 1816. Em paralelo, El Libertador (2013), com música de Gustavo Dudamel, foi outra das grandes produções incentivadas pela presidência e La Villa del Cine, uma fábrica audiovisual destinada a fomentar o cinema venezuelano dirigida pelo filho de Maduro, Nicholas Jr. de 25 anos.

No entanto, a transmissão do filme Miranda regresa foi um dos últimos motivos de indignação da população e um novo exercício de controle audiovisual sobre os telespectadores, uma das fixações do Governo bolivariano.

Em 2014, o Governo venezuelano proibiu que os canais de televisão transmitissem conteúdos, séries e filmes que promovessem a violência e o tráfico de drogas, chegando a impedir a transmissão, por ser muito agressiva, da série de Arturo Pérez Reverte, La Reina del Sur. Uma ironia em um dos países mais violentos do mundo.

Mas a revolução audiovisual na Venezuela também inclui as séries. A última tentativa de convencer o público é Guerreras y Centauros, atualmente na tela. Uma telenovela com personagens de época como Simón Bolívar, Manuelita Sáez e José Antonio Páez durante o tempo entre a Batalha de Carabobo e a Guerra Federal (1821-1840).

A série é transmitida todos os dias através da Televisão Venezuela Social (TVES), um canal criado com o sinal que o governo tirou da Radio Caracas Televisión (RCTV) em 2007. Trata-se da última aposta de promoção de um gênero entre o nacionalista e o de divulgação, que até agora só provoca bocejos entre a audiência.

A Venezuela, que em certo momento chegou a ser potência audiovisual, hoje vive um dos períodos mais fracos. Há 20 anos, o país caribenho produzia mais de 10 séries dramáticas em um único ano para alimentar o mercado nacional e exterior. No entanto, de acordo com o Observatório Internacional de Televisão (Obitel), em 2014 foram feitas apenas quatro — nenhuma delas entre as mais assistidas, em comparação com 35 brasileiras, 34 mexicanas e 32 argentinas. Em 2015, foram gravadas apenas duas produções no país.

Na semana passada, Maduro voltou a colocar os olhos na televisão e pediu para “que seja feita uma revisão completa e removidos conteúdos racistas que há hoje em toda a cultura, cinema e televisão venezuelana”, disse ao receber a marcha de “afrodescendentes” em Caracas.

De acordo com Maduro na Venezuela “precisamos superar esse sistema que, nas novelas e nos filmes, colocam o povo afro-venezuelano como menor, como o empregado, como o escravo ou como o assaltante”, disse.

Talvez por isso o filme Miranda regresa passe por cima de um detalhe; o general que colocou a pedra para a independência das colônias cresceu com mais de sete escravos negros a seu serviço.

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