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Grupo de ex-ministros de Chávez pede referendo revogatório na Venezuela

O recurso, previsto na Constituição, busca fazer frente à grave crise socioeconômica e de governabilidade

O presidente da Venezuela, Nicolás Maduro.
O presidente da Venezuela, Nicolás Maduro.FEDERICO PARRA (AFP)

Um grupo de ex-funcionários do Governo de Hugo Chávez, incluindo ex-ministros, juntamente com representantes de uma facção dissidente da atual administração realizaram na segunda-feira uma coletiva de imprensa para exigir a convocação, este ano, de um referendo revogatório contra o presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, algo que o Executivo venezuelano procura evitar a todo o custo.

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“O referendo revogatório, além de ser um direito constitucional, é também uma solução pacífica para a crise política”, destacou Ana Elisa Osorio, ministra do Meio Ambiente no Gabinete de Hugo Chávez por cinco anos e ex-deputada do Parlamento Latino-Americano do Partido Unido Socialista Unido da Venezuela (PSUV), aliado do atual Governo. “Ignorar isso poderia levar a saídas indesejadas”.

Além de Osorio, estavam presentes na coletiva, entre outros, o ex-ministro da Educação e aliado de Chávez desde o início da revolução, Héctor Navarro; Gustavo Márquez, ex-ministro do Comércio; o major-general aposentado Oliver Alcalá Cordones, ex-chefe da Zona de Defesa Integral Guayana; o ex-representante da Venezuela perante a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), Freddy Gutiérrez; e o cientista político Nicmer Evans, líder da Maré Socialista, uma corrente chavista que faz oposição ao atual Governo.

Minutos antes do evento, o major-general Cordones — irmão do ex-comandante do Exército e atual prefeito de La Guaira (estado de Vargas, costa central da Venezuela), Carlos Alcalá Cordones — havia remetido para o Conselho Supremo Eleitoral (CNE), em sua sede, no centro de Caracas, um documento com o mesmo pedido. A petição também inclui a assinatura do ex-ministro do Planejamento e mentor intelectual de Chávez, Jorge Giordani.

“Nos definimos como defensores da Constituição, somos a favor de que o povo decida”, afirmou Alcalá Cordones, que esteve ao lado, em 1992, do então comandante Hugo Chávez em sua tentativa de golpe contra o segundo mandato de Carlos Andrés Pérez (1989-1993), e a quem diversos meios de comunicação o vincularam a cartéis do tráfico de drogas quando estava no poder.

Devido à grave crise socioeconômica e de governabilidade enfrentada pela Venezuela, setores da oposição têm defendido a realização de um referendo revogatório contra o presidente Maduro, um recurso disponível na Constituição em vigor, de 1999, e que já foi colocado em prática em 2004, contra o então presidente Hugo Chávez, que venceu o desafio.

A oposição só conseguiu concluir perante as autoridades eleitorais a primeira fase do processo de ativação do referendo e acusa o CNE — dominado pelo Governo — de atrasá-lo deliberadamente para evitar a convocatória.

Na verdade, o Governo Maduro tenta contornar 2016 sem enfrentar o desafio do referendo revogatório. Nesta segunda-feira, foram divulgados, em Caracas, os resultados da pesquisa de opinião Venebarómetro, que constatou que 88% dos entrevistados apoiam a rápida remoção de Maduro do poder; e 58% disseram estar dispostos a assinar os formulários para solicitar o referendo, apesar dos riscos que isso poderia implicar para cada um deles. Neste contexto, não surpreende que Maduro e outros líderes da coalizão do Governo, como o número dois do PSUV, Diosdado Cabello, e o Governador do estado de Aragua, Tarek El Aissami, tenham expressado abertamente que o referendo não será realizado este ano, dizendo que a oposição demorou para iniciar os trâmites ou que o processo é fraudulento.

Se o Governo não puder evitar a realização do referendo, pelo menos tenta adiá-lo para o ano que vem, quando, de acordo com as disposições constitucionais, se for derrotado, o mandato presidencial até janeiro 2019 deverá ser completado pelo vice-presidente da República, Aristóbulo Istúriz, do PSUV. Por outro lado, se o referendo fosse realizado em 2016, seria necessário convocar eleições dentro de um mês após o resultado.

Daí a importância da declaração, na segunda-feira, na qual as principais vozes do campo revolucionário — mas que vêm se distanciando de Maduro há muito tempo — exigiram a realização imediata do referendo. O professor universitário Esteban Emilio Mosonyi esclareceu, em nome do grupo, que a iniciativa não visa necessariamente retirar Maduro do poder, mas colocar em prática um “direito civil”, consagrado na Constituição que o próprio Chávez apadrinhou em 1999.

Além disso, os dissidentes condenaram a demissão de funcionários públicos que assinaram a favor da realização do referendo, bem como “funcionários que não possuem nenhuma função eleitoral”, mas manifestam sem nenhuma base o direito de avaliar a procedência ou não da consulta.

Manifestações desse calibre vêm se repetindo em vários meios de comunicação nos últimos dias, procedentes de líderes do início do regime bolivariano. Juan Barreto, ex-prefeito de Caracas e líder do partido Redes (um dos membros da coalizão pró-governo Grande Polo Patriótico), disse na segunda-feira que o Governo deve parar de suspeitar “cada vez que seja criticado” e que Maduro “deve respeitar o [referendo] revogatório”. “Se continuar ameaçando aqueles que discordam, esse não é o caminho”, disse.

Há duas semanas, Barreto admitiu, em entrevista a uma rede de TV, que continua negociando a “saída de Maduro”, declaração considerada desleal, e que gerou reações iradas do PSUV. Militantes do Governo também criticaram a decisão do ex-prefeito de Caracas de aparecer em uma foto cumprimentando Lilian Tintori, esposa de Leopoldo López, líder da oposição preso desde fevereiro de 2014, em um presídio militar perto da capital, e verdadeiro pesadelo para o chavismo.

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