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Governo brasileiro teme ‘efeito Oi’ no mercado

Nos primeiros cinco meses deste ano, número de pedidos de recuperações judiciais foi quase o dobro (95,1% maior) do que o registrado no mesmo período do ano passado

SERGIO MORAES (Reuters)

Altamente endividada, a companhia telefônica Oi entrou, na semana que passou, com o maior processo de recuperação judicial da história do país, admitindo não ser capaz de pagar uma dívida de mais de 65 bilhões de reais. Em meio à forte recessão econômica, outras empresas de grande porte também podem seguir caminho semelhante ao da Oi, já que vêm mostrando dificuldades para cumprir seus compromissos financeiros.

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Mais de uma dezena de companhias brasileiras foram avaliadas pelas agências de classificação de risco Fitch ou Moody's como empresas de alto risco de inadimplência. Elas receberam notas do tipo "CCC" (pela Fitch) e Caa1 (pela Moody's) em que há uma possibilidade real de calote. Entre elas, estão grandes companhias como as siderúrgicas CSN e a Usiminas, que sofrem atualmente com a fraca demanda interna de aço, a desaceleração da China e com o excesso de oferta global que limita as exportações.

As duas possuem a nota Caa1 pela Moody's. Segundo a agência de risco, a Usiminas, que hoje é a maior produtora de aço plano integrada da América Latina, também sofre com o impacto da desvalorização do real, já que quase 50% da dívida financeira da companhia é em moeda estrangeira. A dívida líquida da Usiminas era, no fim de março, de 5,547 bilhões de reais. As companhias estão empenhadas em driblar o efeito Oi. A Usiminas informou que fechou nos últimos dias um acordo de renegociação de sua dívida com bancos privados e com o banco de fomento do Brasil (BNDES). Procurada, a CSN não respondeu aos pedidos de comentários sobre o tema até o fechamento desta edição.

O aperto financeiro das empresas no início 2016 já bateu recorde. Nos primeiros cinco meses deste ano, o número de pedidos de recuperações judiciais foi quase o dobro (95,1% maior) do que o registrado no mesmo período do ano passado, segundo uma pesquisa da empresa de dados financeiros Serasa Experian. As micro e pequenas empresas foram as que lideraram os requerimentos, com 433 pedidos, seguidas pelas médias (198) e grandes empresas (124). De acordo com o economista Luiz Rabi, da Serasa Experian, as dificuldades na obtenção de crédito, em meio a um quadro recessivo, prejudica a solvência financeira das empresas, que pedem recuperação judicial com o objetivo de evitar a falência. Ainda segundo Rabi, desde 2014, os pedidos de recuperação judicial de grandes empresas se acentuaram.

Para Ricardo Carvalho, diretor sênior da Fitch, o número de empresas que estão sob risco de não honrar suas dívidas é o maior observado na última década. A tendência é que os rebaixamentos de notas aumentem já que as companhias continuarão pressionadas pela conjuntura econômica. "Há uma forte perda de geração de caixa operacional. As razões são simples: há uma forte piora do ambiente de negócios, uma demanda retraída, queda de renda, preço baixo das commodities, alta taxa de juros, sem perspectiva de investimentos", explica. No ano passado, a agência de risco concedeu quatro downgrades para cada upgrade. Já em 2016, a Fitch estima de dez a 15 rebaixamentos para cada aumento de nota.

Outra empresa que atravessa um momento turbulento é a companhia aérea Gol. A empresa está na categoria “CCC” (Fitch) e “Caa1” (Moody’s). Apesar de hoje ser a líder brasileira em número de pessoas embarcadas, o cenário de recessão econômica no país, que afetou a demanda de passageiros, e a forte alta do dólar fizeram a companhia amargar perdas de 3,5 bilhões de reais no ano passado e fez a dívida líquida da Gol somar 6,05 bilhões de reais no fim do primeiro trimestre deste ano. A dívida líquida ajustada atingiu 14,5 bilhões. Neste ano, a companhia contratou duas consultorias financeiras para trabalhar estratégias que tragam mais liquidez à empresa. A companhia prevê cortou oito destinos de voo e  pretende retirar 20 aeronaves da sua frota ainda em 2016. Segundo a companhia, uma redução substancial da dívida é necessária visando o crescimento operacional, "balanceando pelo fortalecimento na estrutura de crédito de longo prazo".

Para o economista Alex Agostini, a forte queda do Produto Interno Bruto (PIB), a inflação alta e o nível da taxa de juros elevado não deixou imune nenhum dos setores da economia brasileira, mas tem causado maior estrago em empresas que já estavam no vermelho. "Se uma empresa já tinha um nível de endividamento grande no ano passado, muito provavelmente esse ano ela terá dificuldades financeiras gravíssimas e problemas para honrar seus compromisso. A maioria das receitas caíram e as despesa tem custo alto", explica.

Agostini descarta a possibilidade do Governo ajudar financeiramente as grandes companhias. "O Governo poderia conversar com o BNDES para renegociar a dívida, aumentar os prazos, mudar regulações, mas não aportar recursos nem dar mais crédito, não seria viável neste momento de ajuste fiscal. Nem para a Oi seria adequado fazê-lo, pois abriria precedente em um momento econômico muito difícil".

Para tentar tirar a Oi da crise financeira que atravessa, o Governo Temer estuda acelerar uma mudança regulatória de todo o serviço público de telefonia fixa. Segundo a Folha de S.Paulo, a ideia é transformar as concessões em autorizações. A grande diferença é que em uma autorização, os bens usados na prestação dos serviços (antenas, infraestrutura de cabos e prédios) pertencem à operadora, e podem ser colocá-los nas negociações com credores.

Outros arranjos também estão sendo realizados para evitar novas quebras. Nesta semana, a Câmara dos Deputados aprovou uma Medida provisória que garante participação de capital estrangeiro nas empresas aéreas em até 100%. Atualmente, existe o limite de 30% para sócios de fora. “Essa mudança na participação do controle estrangeiro é uma demanda das empresas para conseguir novos investidores”, explica Agostini.

A situação econômica da Petrobras também é uma das preocupações do Governo. Hoje, a estatal é a empresa mais endividada do país, com uma dívida bruta de mais de 450 bilhões de reais, segundo ranking da Economatica. A equipe econômica de Temer, concluiu no entanto, que neste momento não há uma necessidade da petroleira promover uma capitalização na Bolsa, segundo informação do jornal Estado de S.Paulo. A equipe, ainda segunda publicação, confia que a economia deve melhorar nos próximos meses, o que ajudará a Estatal a cumprir seus compromissos financeiros. Porém, não descarta que a capitalização volte a ser discutida caso o cenário econômico brasileiro não apresente uma melhora. Consultados pelo jornal, nem a Petrobras, nem o Ministério da Fazenda quiseram comentar sobre o tema.

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