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O risco embutido na euforia do mercado pelo impeachment de Dilma

Investidores torcem por queda do Governo e especialistas dizem que fato pode gerar longa instabilidade

Clientes com notas de dólar no Rio.
Clientes com notas de dólar no Rio. V. A. (AFP)

Na última semana, o mercado financeiro viveu dias atípicos de euforia com os novos desdobramentos da Operação Lava Jato, que teve como alvo o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e também com o vazamento da suposta delação do senador Delcídio do Amaral, que implicaria a presidente Dilma Rousseff no escândalo da Petrobras. A Bolsa de Valores de São Paulo cravou sua melhor semana desde outubro de 2008, com uma alta de 18%, e o dólar caiu quase 6%.

Aos olhos de investidores e analistas, as últimas notícias aumentam as possibilidades de a presidenta não terminar o seu mandato, o que é visto como uma nova perspectiva para a retomada do crescimento da economia que está mergulhada na pior recessão das últimas décadas. O sentimento de otimismo do mercado, no entanto, exige cautela, segundo especialistas. "Mesmo que o mercado raciocine que a saída de Dilma seja o melhor caminho para o país, o perigo dessa euforia é que, caso o impeachment vingue, temos um processo pela frente que ainda é muito incerto e que pode ser longo", afirma o economista Silvo Campos Neto, da Tendências Consultoria.

E é justamente essa incerteza que deve criar um cenário bastante volátil nos próximos meses independentemente se Dilma deixar ou não o poder antes de 2018. "Não sabemos se realmente haverá essa saída e, mesmo se houver, não podemos prever se será por impeachment, pelo julgamento do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) ou por uma renúncia. O caminho não será tranquilo. Não temos um salvador da pátria, nem uma oposição consistente, não há uma resolução clara que possa gerar uma tranquilidade", explica a economista Maria Cristina Mendonça de Barros, da consultoria MB Associados.

A economista, admite, no entanto, que, se antes havia uma certa descrença de que a presidenta pudesse ser afastada, com análises mais ponderadas de consultorias políticas e financeiras, as chances estão aumentando com as últimas notícias e desdobramentos das investigações da PF. Para ela, há um consenso que essa confluência de crise política econômica não aguenta até 2018 ou "o país irá derreter". Nesta segunda-feira, a consultoria Eurasia voltou a aumentar também as chances de que presidenta brasileira não termine seu mandato: a probabilidade subiu de 40% para 55%.

A Eurasia tem repetido que um eventual Governo Temer pode ser alvo igualmente da Lava Jato e que ele teria menos margem para implementar reformas pró-mercado do que um novo presidente eleito – na hipótese de que o TSE casse Dilma e o vice anulando o pleito de 2014, cenário que eles avaliam agora com mais chances até que o impeachment. "Nós acreditamos que o otimismo do mercado em relação a um possível Governo Temer é exagerado", escreveram a clientes ainda no ano passado.

"No caso hipotético do vice-presidente Michel Temer (PMDB) assumir a presidência, a resposta do mercado pode ser positiva em um primeiro momento, mas depois ele também será avaliado. Agora, se depois entrar um Governo crível, o câmbio e o mercado podem dar uma acomodada. Mas hoje, no futuro próximo, o que teremos é bastante volatilidade, com dias de euforias de notícias boas e outros de queda ", explica Barros, da MB Associados.

Esse mercado volátil já foi sentido nessa segunda-feira. Sem grandes novidades no âmbito da Operação Lava Jato, o dólar fechou em alta, cotado a 3,796 reais, interrompendo uma sequência de quatro quedas consecutivas. Já o Ibovespa, índice de referência da Bolsa de Valores de São Paulo, subiu 0,33%, puxada pelo desempenho da mineradora Vale e da Petrobras. Na próxima semana, o mercado deve voltar a oscilar. Na opinião de Campos Neto, os agentes financeiros devem voltar a reagir caso as manifestações populares do fim de semana contra o Governo sejam massivas.

O comportamento desta segunda também refletiu novamente pessimismo com a trajetória da economia brasileira neste ano. O mercado piorou suas previsões, estimando mais inflação e uma queda maior do nível de atividade. Estimativas divulgadas pelo Banco Central, mostraram que a inflação oficial do país neste ano subiu de 6,57% para 7,59%. Já a estimativa do Produto Interno Bruto (PIB) passou de uma contração de 3,45% para 3,5%.

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