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Lava Jato faz pente fino em triplex e contratações de palestras de Lula

Força tarefa diz que investigação não permite pedir prisão de Lula agora neste momento PF suspeita que ex-presidente indicou nomes na Petrobras

Gil Alessi
O ex-presidente Lula no aniversário do PT.
O ex-presidente Lula no aniversário do PT.R. Stuckert (Inst. Lula.)

O maior pesadelo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e do PT começou a tomar forma na manhã desta sexta-feira. O petista, que tenta se manter como um candidato viável para disputar as eleições em 2018, foi o principal alvo da 24ª fase da operação Lava Jato. Além de ser conduzido coercitivamente para depor, Lula viu a Polícia Federal fazer uma devassa em seu apartamento de São Bernardo do Campo e na sede do Instituto Lula, em São Paulo. Sob a batuta do juiz Sérgio Moro, da Justiça Federal do Paraná, a força-tarefa segue o rastro de uma espécie de cadeia de troca de favores que culminariam, segundo os investigadores, em pagamento de vantagens indevidas envolvendo o ex-presidente e algumas das maiores empreiteiras do país – todas na mira da Lava Jato. Já pesavam suspeitas sobre reformas feitas em imóveis ligados ao ex-presidente: um sítio frequentado por ele em Atibaia e um tríplex no Guarujá, pagas respectivamente pela Odebrecht e OAS. Mas agora os investigadores colocaram na mira doações e repasses feitos pelas construtoras envolvidas no esquema de corrupção da Petrobras ao Instituto Lula e à empresa de palestra do ex-presidente, a LILS. Os recursos movimentados superariam os 30 milhões de reais.

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Batizada de Aletheia – referência à entidade mítica grega ligada à 'busca pela verdade' – a nova etapa da Lava Jato coloca em xeque também os atos de Lula na presidência. “Estão sob análise todos os atos de nomeação de diretores da Petrobras e de casos envolvendo outras empresas e órgãos estatais”, afirmou hoje em entrevista coletiva o procurador da força-tarefa Carlos Fernando dos Santos Lima. Segundo ele, as autoridades investigam se “esse aparelhamento deu-se por orientação do Governo”. “Sabemos que José Dirceu [ex-chefe da Casa Civil de Lula, já preso] estava ciente [das irregularidades]. Agora vamos verificar se esses desvios eram de conhecimento do ex-presidente”, afirmou.

O procurador confirmou a existência de evidências do pagamento de vantagens a Lula “sem nenhuma justificativa plausível para isso”. Ele cita como indício o fato de que as cinco maiores empresas que doaram para o Instituto Lula entre 2011 e 2014 são as cinco maiores empreiteiras investigadas pela Lava Jato. Os repasses feitos por Camargo Corrêa, Odebrecht, UTC, OAS, Queiroz Galvão e Andrade Gutierrez ao Instituto somam 20 milhões de reais no período. “Doações podem ser realizadas por diversos motivos, mas temos que analisar se isso tem relação com obras fraudadas da Petrobras”, disse Lima. O procurador fez questão de frisar que essa é uma hipótese investigativa ainda não confirmada: “Estamos analisando evidências de que o ex-presidente e sua família receberam vantagens. Certamente o Governo dele foi um dos grandes beneficiários desse esquema de compra de apoio político partidário, mas vamos ver se ele foi pessoalmente beneficiário disso”.

Prova de que as autoridades ainda não dispõem de provas concretas contra Lula é o fato de que foi feito apenas um pedido de condução coercitiva do ex-presidente – quando o investigado é obrigado a depor. Não foi decretada pelo juiz Moro a prisão temporária ou preventiva do petista, como foi feito com a maioria dos outros suspeitos de envolvimento no esquema. “Entendemos que não se caracterizavam os pressupostos [para um pedido de prisão]”, disse o procurador Lima. “Neste momento as investigações não são conclusivas a ponto de pedir a prisão do senhor Luís Inácio”, disse o servidor. Segundo ele, as autoridades optaram pela condução coercitiva porque o país vive um clima de polarização política. “Se tivéssemos marcado um depoimento antecipado isso levaria movimentos pró e contra o Governo à rua, e isso poderia desencadear atos de violência”, afirmou.

Sobre o sítio em Atibaia, o procurador afirmou que "os pagamentos [para a compra de materiais para a reforma] eram feitos em dinheiro, uma das formas mais elementares de lavagem de dinheiro, porque é difícil de rastrear". O tríplex no Guarujá também voltou a ser citado pela procuradoria: "Não podemos ignorar que haja o pagamento de 40.000 [feito pela mulher de Lula] pela opção de compra de um apartamento no qual foram gastos 700.000 em obras, e que isso simplesmente não seja considerada vantagem".

Os supostos favores trocados entre Lula e as empreiteiras não param por aí: segundo a força-tarefa, 40% das receitas da empresa LILS (cerca de 10 milhões de reais), que gerencia as palestras do ex-presidente, foram provenientes de pagamentos feitos pelas empreiteiras investigadas na Lava Jato. “Estamos verificando se as palestras ocorreram, onde ocorreram, e se houve um ato do Governo que pode ser vinculado a essas empreiteiras que pagaram por estes serviços”, diz Lima. Em seu despacho autorizando as buscas na LILS, o juiz Sérgio Moro destaca algumas palestras pagas por empreiteiras: "Chama a atenção os elevados valores pagos ao ex-presidente por suas palestras, como, cerca de 200.000 dólares líquidos pela OAS por palestra e 449.580,84 reais líquidos pela Odebrecht por palestra".

Além disso, existe a suspeita de que tenha havido triangulação de recursos envolvendo as empresas de Lula: doações feitas ao Instituto como contrapartida por contratos recebidos durante o Governo do petista podem ter sido repassados para familiares do ex-presidente. A força-tarefa da Lava Jato investiga se o Instituto Lula, que é uma entidade sem fins lucrativos, realizou repasse de um milhão de reais para a empresa G4, de propriedade de um dos filhos do ex-presidente, por serviços que podem não ter sido prestados.

“O Instituto é isento de tributos, logo os recursos que entram lá precisam ser usados na finalidade da organização”, afirmou Roberto Lima, auditor fiscal da Receita Federal. “O que entra lá precisa ser aplicado lá, ele não pode distribuir lucro ou recursos para eventuais dirigentes”, disse o integrante da força-tarefa. Segundo o fiscal, os pagamentos feitos pelo Instituto estão sob investigação uma vez que existem provas de uma "confusão operacional e financeira entre as duas entidades [LILS e Instituto] ainda a ser confirmada". “Estamos investigando a entrada e saída de recursos das empresas”, afirmou. O filho do ex-presidente, Fábio Luiz da Silva, mais conhecido como Lulinha, também é um dos alvos da investigação: agentes da PF cumpriram mandados de busca e apreensão em seu apartamento em Moema, zona sul de São Paulo.

Outra ponta da investigação apura o pagamento por parte da OAS, sem motivo aparente, dos custos de transporte e armazenagem de objetos do ex-presidente recebidos de presente durante seu mandato. Quando Lula deixou o Planalto, a empreiteira teria desembolsado ao menos um milhão de reais para levar para um depósito dez contêineres - com conteúdo desconhecido das autoridades.

A Aletheia acontece menos de 24h depois do Planalto ter sido sacudido por informações não oficiais de que o senador Delcídio do Amaral, que havia sido preso pela Lava Jato, implicava Dilma e Lula em sua delação premiada. O delegado da Polícia Federal Igor Romário de Paula afirmou nesta sexta que a 24ª fase da operação “não tem nenhuma relação com a suposta delação premiada do senador Delcídio do Amaral, vazada ontem [quinta-feira]”.

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