_
_
_
_
_

Kesha, o lado mais obscuro das fábricas de sucesso

Em sua luta para se libertar de seu produtor, a quem acusa de abusos, a cantora pop ganhou fama e o apoio da indústria

Foto: reuters_live | Vídeo: REUTERS-Live
Mais informações
‘Work’: o sensual videoclipe de Rihanna e Drake
Grammy 2016 consagra o pop de Taylor Swift e Ed Sheeran
Kanye West revela ao mundo: “o melhor disco de todos os tempos”

A estrela pop Kesha nunca antes se viu em tantas manchetes. Sua imagem chorando no tribunal após perder o julgamento contra sua gravadora e produtor acabou de repente com a felicidade vendida até então no mundo pop. O juiz não acredita que tenha sido estuprada pelo homem que está por trás de suas músicas, Dr. Luke, nem que tenha sido abusada psicologicamente, e sentenciou que ela deve cumprir seu contrato de mais seis álbuns com sua atual empresa.

Sem ter completado 29 anos, a cantora protagoniza uma história com ingredientes demais para não despertar interesse. Sexo, drogas, distúrbios alimentares e o debate sobre a igualdade das mulheres na sociedade e em uma indústria, a do entretenimento, ainda controlada por homens. Também revelou o lado mais obscuro das fábricas de sucesso, que por vezes mostra seus artistas dizendo sentirem-se como marionetes nas mãos dos responsáveis por um negócio milionário. Aconteceu anos atrás com Prince, que precisou mudar de nome para seguir com sua carreira. O caso de Kesha tem um componente a mais. A maioria das pessoas que a transformaram em trending topic há alguns dias com a hashtag #FreeKesha (liberdade para Kesha) provavelmente não sabe cantarolar suas músicas. Ela lançou um single de sucesso em 2009 e fez colaborações com outros cantores que ficaram na memória, mas sua atividade nesses sete anos não foi suficiente, em quantidade e conquistas. A tragédia que afetou sua imagem pública tem hoje mais peso do que sua contribuição artística. Sem saber muito bem quem ela é, todo mundo fala de uma jovem marcada pelo escândalo.

Kesha, à saída do tribunal de Nova York na passada sexta-feira.
Kesha, à saída do tribunal de Nova York na passada sexta-feira.Raymond Hall

Nasceu em Los Angeles, mas cresceu em um subúrbio de Nashville (Tennessee, EUA). Nunca conheceu seu pai, e sua mãe era uma cantora que compunha para outros artistas. Kesha conheceu os programas de assistência social e os cupons de alimentação. Na adolescência utilizou a rebeldia para sobreviver em um mundo que sempre lhe foi hostil. Cabelo roxo, bissexualidade e a música como expressão. Chegou a passar na casa de Prince para deixar-lhe uma demo porque gostaria que ele produzisse sua música. Em 2009 assinou com o selo de Dr. Luke. Tinha todo o necessário para triunfar como uma nova princesa do pop, e o sucesso veio de repente no primeiro ano. Sua canção Tik Tok foi número um em 11 países e é um dos singles digitais mais vendidos, com mais de 14 milhões de downloads. Tentou manter o nível nos anos seguintes, mas não conseguiu encontrar seu lugar em um panorama cheio de cantoras parecidas, e com o perfil da “rebelde e incomum” ocupado por Lady Gaga na crista da onda. Kesha ficou relegada a estrela de segunda linha, e isso ficou demonstrado em uma campanha a favor dos animais com Iggy Pop na qual fazia um dueto animado com Pitbull.

Dr. Luke e Kesha, durante uma entrega de prêmios em Los Angeles em 2011.
Dr. Luke e Kesha, durante uma entrega de prêmios em Los Angeles em 2011.cordon press

Sua intenção de fugir do eletropop das fórmulas de rádio e buscar um estilo mais voltado ao rock não foi respaldada pelo selo de Luke. Em 2013 anunciou um projeto com a banda alternativa The Flaming Lips, cancelado meses depois. Muitos acusaram Luke de bloqueá-lo. Ela declarou que era algo que não podia controlar e que até mesmo gostaria de liberar o material porque o dinheiro não lhe importava. A próxima notícia dizia que ela havia sido internada em um centro médico por bulimia nervosa. Vários médicos culparam Dr. Luke porque supostamente não suportava a independência adquirida por Kesha e suas pretensões de reconduzir a carreira. Saiu da clínica com uma camiseta com os dizeres “sou uma sobrevivente” e, como Prince, mudou seu nome simplesmente para Kesha, já que antes o ‘s’ era o símbolo do dólar. Era somente o princípio de um escândalo que nos tribunais revelou que Luke supostamente se gabava de drogar e embebedar mulheres para estuprá-las e que obrigou sua mulher a abortar. Na acusação feita pela cantora se fala de como ele ameaçava arruiná-la e que a humilhava ridicularizando seu aspecto e talento, sempre exercendo um controle asfixiante sobre ela. Tudo para conseguir renegociar seu contrato com ele, e durante 10 anos.

Mas o juiz deu razão ao produtor, ainda que somente em relação ao vínculo profissional. Eles voltarão a se encontrar no dia 16 de maio, em um caso que, nas palavras de Kesha, nunca foi por seu contrato, mas por sua luta em se afastar de um homem que ela afirma que a aterroriza. Após a sentença, a Sony declarou que permitirá a Kesha trabalhar com outros produtores. Ela respondeu no Facebook: “Expresso minha vontade de cumprir o contrato com a multinacional se forem corretos e romperem todos os vínculos que me ligam ao meu abusador”. Uma mensagem encerrada com agradecimentos aos seus colegas de profissão, principalmente mulheres (lideradas por Taylor Swift, que a ajudou com 250.000 dólares [um milhão de reais]), junto com milhares de anônimos que mostraram seu apoio nas redes sociais. “Só quero fazer música sem ter medo, sem que me assediem, sem sofrer abusos”, conclui.

Mais informações

Arquivado Em

Recomendaciones EL PAÍS
Recomendaciones EL PAÍS
_
_