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Parlamento venezuelano declara crise humanitária

Maioria opositora aprova acordo em que afirma que o país se encontra em emergência de saúde

Consumidores compram alimentos em um supermercado estatal no dia 9 de janeiro em Caracas.
Consumidores compram alimentos em um supermercado estatal no dia 9 de janeiro em Caracas.REUTERS
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O Parlamento venezuelano já afirma sem rodeios que o país sul-americano se encontra em emergência sanitária devido às carências estruturais no abastecimento de medicamentos, remédios e produtos básicos. Em acordo aprovado na Assembleia Nacional, a maioria opositora declara que existe uma crise humanitária na Venezuela. O documento exorta o Executivo de Nicolás Maduro a abastecer as farmácias com medicamentos essenciais, publicar o boletim epidemiológico e permitir o envio sem fins lucrativos de remédios do exterior.

Este talvez seja o lado mais dramático do desabastecimento e da escassez na Venezuela, que se acentua no início do ano devido às férias coletivas de dezembro. Com o reinício das atividades comerciais e fabris aumentaram também as longas filas de consumidores em frente aos supermercados e as peregrinações por todas as farmácias.

O Governo venezuelano incluiu uma lista de medicamentos essenciais na Gazeta Oficial, que cobrem quase todas as doenças crônicas, mas que não está em condições de garantir. Durante o debate antes do acordo, o deputado José Manuel Olivares, de oposição, afirmou que 92% desses medicamentos estão em falta na Venezuela. Ampliando a perspectiva, a Federação Farmacêutica Venezuelana calcula a escassez no setor em torno de 80%. A situação parece piorar à medida que caem os preços do petróleo e o regime não tem como entregar as divisas necessárias para reanimar a produção nacional.

Em tempos de tanta incerteza, o Executivo de Nicolás Maduro decidiu informar cada vez que atraca em costas venezuelanas uma embarcação com comida, remédios e produtos básicos. Entre terça-feira e quarta-feira desta semana, a conta da estatal Bolivariana de Portos no Twitter divulgou a chegada de 458 contêineres de alimentos e produtos de higiene, e de 30.000 toneladas de arroz, um bem muito escasso nas últimas semanas.

Enquanto isso, os ministros encarregados das áreas menos abastecidas pedem aos venezuelanos para não comprar alimentos e bens em excesso. Nesse sentido, em entrevista à televisão local, Ricardo Molina, deputado do Partido Socialista Unido da Venezuela, de Governo, disse não entender o que leva uma pessoa a comprar cinco ou seis pares de sapatos por ano.

Desabastecimento

A oposição não se limita a reconhecer, em uníssono, que a Venezuela avança a passos acelerados para uma explosão social. As vozes críticas do chavismo também alertam para um surto de violência iminente. O ex-ministro do Interior e da Justiça Miguel Rodríguez Torres, o primeiro titular dessa pasta no Governo de Maduro, pediu entendimento à liderança política. “A Venezuela se transformou em uma verdadeira panela de pressão”, escreveu no Twitter.

A escassez e o desabastecimento podem ser as fontes mais evidentes do descontentamento, mas a acelerada inflação dos alimentos também contribui. O Centro de Documentação e Análise para os Trabalhadores (Cendas) afirmou em seu último relatório que entre dezembro de 2014 e o mesmo mês de 2015 a cesta básica familiar aumentou 361%. É uma cifra menor que os cálculos da organização sobre a alta de preço dos alimentos – 443% em um ano – e do aumento do salário mínimo – em torno de 97% – decretado pelo Governo venezuelano. O Fundo Monetário Internacional agravou recentemente todas estas previsões ao calcular que, neste ano, a inflação na Venezuela chegará a uma cifra recorde mundial de 720%.

O Executivo venezuelano continua promovendo reuniões com todas as forças vivas da economia para tentar conter a crise sem mudar o modelo de desenvolvimento. Em seu programa de terça-feira na televisão, o presidente Maduro assinou o decreto de criação do Sistema Centralizado de Compras Públicas para todo o Estado, com o qual pretende ativar um plano “de acupuntura econômica”. Com essa nova instância – que se junta a uma burocracia já hipertrofiada – pretendem investir em setores específicos as escassas divisas hoje arrecadadas pelo fisco.

Ao mesmo tempo, Maduro ordenou ao ministro da Energia, Eulogio del Pino, que iniciasse um giro pelos estados membros da Organização de Países Exportadores de Petróleo (OPEP) em busca de apoio. A Venezuela procura desesperadamente uma nova alta dos preços porque depende deles para que sua economia se recupere. As exportações de petróleo bruto respondem por 94% das divisas arrecadadas pelo fisco.

Reação do chavismo à não aprovação do decreto econômico

O chavismo ainda não anunciou o que pretende fazer depois que a Assembleia Nacional se negou a aprovar o decreto de Emergência Econômica proposto pelo Governo.

Maduro disse que a decisão do Parlamento era inconstitucional e que serão tomadas medidas que, por enquanto, prefere não especificar. O presidente venezuelano acusou o Parlamento, de maioria opositora, de “dar as costas ao país” neste momento de grave crise econômica.

Na sexta-feira passada, a maioria opositora do Parlamento decidiu não habilitar Maduro a legislar em temas econômicos durante 60 dias, como era sua intenção com o decreto de Emergência Econômica. No debate prévio à decisão, a oposição argumentou que a autorização ao Executivo significaria aprofundar a crise e que isso não facilitaria a saída da recessão.

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