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Um novo revés para Dilma com a troca de líder do PMDB da Câmara

Aliado do Governo, Leonardo Picciani foi trocado por Leonardo Quintão, do grupo de Cunha

Gil Alessi
O novo líder da bancada do PMDB, Leonardo Quintão
O novo líder da bancada do PMDB, Leonardo QuintãoZ. Ribeiro (Ag. Câmara)

A presidenta Dilma Rousseff sofreu nesta quarta-feira novo revés em sua luta contra o impeachment. O deputado Leonardo Picciani (PMDB-RJ) foi destituído da liderança da bancada de seu partido na Câmara. Ex-aliado do presidente da Casa, Eduardo Cunha, o parlamentar se indispôs com grande parte de seus correligionários ao se aproximar da petista nos últimos meses. Na manhã desta terça a ala oposicionista do PMDB conseguiu reunir a assinatura de 35 dos 66 deputados da bancada, o suficiente para aprovar a troca na liderança. Os peemedebistas escolheram Leonardo Quintão, de Minas Gerais. O parlamentar, que é do grupo de Cunha, é crítico do Governo, e já defendeu reservadamente o fim da aliança com o PT.

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A expectativa é que a mudança na liderança do principal partido da base aliada de Dilma – já bastante fragmentada – aprofunde ainda mais o distanciamento do Planalto com o PMDB e a crise política. A relação entre as duas legendas já havia sofrido outro baque esta semana com a divulgação de uma carta do vice-presidente Michel Temer enviada a Dilma. No texto ele critica a presidenta por, entre outras coisas, ter escolhido o parlamentar fluminense para fazer a articulação com a bancada sem consultá-lo. A troca também evidencia que, apesar de acuado pelas investigações da Lava Jato e por um processo na Comissão de Ética que pode cassar seu mandato, Cunha ainda dá as cartas na Câmara.

A gota de água que levou os radicais do PMDB a mudarem a liderança foram as indicações feitas por Picciani para compor a chapa da comissão especial que analisará o pedido de impedimento da presidenta. O ex-líder foi criticado por apontar somente nomes pró-Governo para as vagas do PMDB, o que fez com que parte da bancada se aliasse à oposição e lançasse uma chapa paralela hostil a Dilma, e que foi vitoriosa na tarde de terça. A manobra, em todo caso, está sob análise do Supremo, a pedido do PCdoB, que entrou com uma ação contra a criação de uma chapa alternativa.

Ao assumir a liderança, Quintão evitou criticar Picciani, mas deixou claro que, a partir de agora, as decisões da bancada serão tomadas somente após discussão interna no partido, para contemplar a maioria dos parlamentares do PMDB. O deputado Darcísio Perondi (PMDB-RS), um dos responsáveis pelas articulações que levaram à troca na liderança da bancada, criticou o papel de Picciani à frente da legenda. “O líder anterior é jovem e fez sua ligação direta à presidente Dilma Rousseff. Quintão vai aglutinar todas as forças do partido".

Foi um amadorismo brutal do Governo achar que ele [Picciani] poderia ser um interlocutor"

Em 2013, o deputado mineiro provocou a ira de ambientalistas ao dizer, durante palestra, que não via problemas em ser relator do projeto do Código de Mineração após ter recebido recursos de empresas do setor. A prática constitui quebra de decoro, e é vedada pelo regimento da Câmara, que proíbe que parlamentares relatem matéria envolvendo interesses de companhias que financiaram suas campanhas. Segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral, em 2010 Quintão recebeu 379.000 reais de mineradoras. O Instituto Socioambiental entrou com uma representação na Casa contra o parlamentar, mas ela acabou arquivada.

Desde que se aliou ao Planalto, Picciani conseguiu emplacar dois ministros: Celso Pansera (Ciência e Tecnologia) e Marcelo Castro (Saúde). Por outro lado, ele não conseguiu apaziguar a ala radical de sua bancada, favorável ao afastamento de Dilma. Diversas votações de temas sensíveis para o Governo foram adiadas por falta de quórum devido à ausência, além de parlamentares da oposição, de deputados peemedebistas, em um claro indício das dificuldades de articulação enfrentadas pelo líder da legenda. A derrota da chapa com os nomes indicados por Picciani na Comissão do Impeachment foi apenas mais um fracasso do peemedebista, que agora vê suas ambições de herdar a cadeira de Cunha na Câmara mais distantes.

PMDB do Rio joga as últimas cartadas para recuperar poder

María Martín, Rio de Janeiro

A ala peemedebista do Rio, que deu as costas a Eduardo Cunha para se consolidar como o principal apoio de Dilma Rousseff em campo inimigo, manobra com velocidade para evitar não só a derrota da presidenta como a sua própria. Após o líder do PMDB na Câmara, Leonardo Picciani, perder o comando da bancada, seu pai e presidente da Assembleia do Rio, Jorge Picciani, o governador Luiz Fernando Pezão, e o prefeito Eduardo Paes, desenham estratégias para não perder, nas mãos de Cunha, o controle dos correligionários em Brasília.

Para retornar ao posto, Picciani precisa recuperar o apoio da maioria dos 66 deputados peemedebistas. Para isso, o PMDB do Rio pode tentar reverter algumas das assinaturas contra o líder ou engrossar a bancada com novos deputados fieis. Com o aumento do número de deputados fieis seria possível apresentar um novo abaixo assinado pedindo o retorno do antigo líder. "A partir deste momento, a qualquer momento, a qualquer hora e a qualquer dia, pode vir uma lista e trocar o líder da bancada", afirmou Leonardo nessa quarta.

O clã fluminense, por enquanto, resolveu na terça-feira que dois deputados licenciados do PMDB que exerciam cargos executivos no Rio abandonassem suas pastas para recuperar suas vagas no Congresso. Os indicados foram o braço direito de Paes, pré-candidato a prefeitura e secretário municipal, Pedro Paulo Carvalho, e o filho do ex-governador Sérgio Cabral e secretario de Esportes, Antônio Cabral. A contraofensiva passa também, segundo a Folha divulgou, por conseguir a filiação no PMDB de novos deputados, que seriam fiéis a Picciani. Na base do troca-troca, deputados peemedebistas que ocupam cargos executivos nos governos municipais e estadual do Rio poderiam ser substituídos por deputados de outros partidos que foram eleitos em coligação com o PMDB do Rio, para recuperarem suas vagas no Congresso.

Para o analista político Thiago de Aragão, da Arko Advice, Picciani prometeu ao Planalto algo que jamais conseguiria entregar. “Foi um amadorismo brutal do Governo achar que ele poderia ser um interlocutor. O PMDB é um partido de vários reis, e a Dilma optou por negociar com alguém que não é”, afirma. Segundo ele, a presidenta errou ao dar preferência ao parlamentar fluminense em detrimento de caciques do partido ligados a Temer ou a Cunha . “Ao escolher Picciani, o Planalto não só deixou de resolver os problemas antigos, o que resultou em várias derrotas no plenário provocadas pela infidelidade em sua base, como arrumou problemas novos”, diz, referindo-se à derrota na votação das chapas para a comissão do impeachment.

O cientista político Luciano Dias, do Instituto Brasileiro de Estudos Políticos, acredita que a escolha de Picciani como interlocutor do Governo foi “conveniente” quando a meta do Planalto era a reforma ministerial e a aprovação das medidas fiscais. “Ele [Picciani] entrega pizza, não o controle do impeachment. Ele cometeu um erro de avaliação ao achar que tinha autonomia para falar pela bancada”. Com a substituição do deputado, Dias não acredita que haja algum peemedebista na Câmara com influência sobre a bancada disposto a assumir a interlocução com o Governo. 

Picciani ainda pode tentar reverter a decisão da bancada, e para isso conta, de acordo com o jornal O Globo, com os votos de dois deputados licenciados que atuam como secretários do Governo do Rio de Janeiro. Pezão teria autorizado a volta de Marco Antônio Cabral e Pedro Paulo para a Câmara, com o objetivo de fortalecer o aliado. A reportagem não conseguiu entrar em contato com o ex-líder do partido.

Risco de contágio

O clima de rejeição ao Governo que não para de crescer na Câmara pode "contaminar" o Senado. Essa é a opinião do analista político Rafael Cortez, do grupo Tendências. Segundo ele, não havendo incentivos para a superação deste crise política, "vão se estabelecendo bases sistemáticas de apoio ao antigovernismo". "O mesmo pode acontecer com relação aos ministros do PMDB", afirma. Esta semana o ex-ministro da Aviação Civil Eliseu Padilha oficializou sua saída do Governo. Até o momento, Renan Calheiros (PMDB-AL), presidente do Senado, tem agido com cautela com relação ao racha interno do PMDB e à questão do impeachment. Ele chegou a se manifestar após a divulgação da carta de Temer para Dilma, dizendo que a mensagem não representava a opinião do PMDB.

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