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Coluna
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O ‘modus operandi’ na educação

No Paraná e em São Paulo, governados pelos tucanos Geraldo Alckmin e Beto Richa, a educação pública é tratada como caso de polícia

Protesto estudantil em São Paulo na semana passada.
Protesto estudantil em São Paulo na semana passada.Marina Rossi

Mais que o processo de impeachment aberto contra Dilma Rousseff por um Congresso desacreditado, liderado por dois políticos investigados pelo Supremo Tribunal Federal —os presidentes do Senado, Renan Calheiros, e da Câmara, Eduardo Cunha, ambos filiados ao PMDB—, para mim o confuso e lamentável ano que agoniza deixará como marcas o definitivo atolamento do PT na lama da corrupção e a explicitação da face arrogante e autoritária do PSDB. A primeira se transforma pouco a pouco em dolorosa lembrança do que poderia ter sido e não foi; a segunda, cicatriz que lateja quando nos lembramos do acidente.

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Sobre a derrocada petista, já muito me ocupei aqui neste espaço: melancólica, irreversível, patética. Então, tratemos de recordar o modus operandi tucano que, por reiterado, pode ser compreendido como padrão. Não bastassem os humilhantes índices alcançados pelos estudantes brasileiros nas provas de avaliação internacional —sempre listados entre os últimos lugares— em pelo menos dois dos nossos mais ricos estados (São Paulo e Paraná), governados respectivamente por Geraldo Alckmin e Beto Richa, lideranças ascendentes do PSDB, a educação pública é tratada como caso de polícia.

Em setembro, Alckmin anunciou o projeto de reorganizar a rede de escolas do Estado de São Paulo em três segmentos (1º ao 5º ano, 6º ao 9º ano e ensino médio), o que implicaria no remanejamento, no ano que vem, de cerca de 310.000 alunos e o fechamento de 94 unidades. A essa decisão autoritária —os principais atingidos pela medida, professores, funcionários e pais de alunos, não foram sequer consultados— seguiu-se outra, alicerçada na arrogância, de desprezar os protestos que engrossavam dia a dia, com ocupação de escolas e mobilização dos estudantes. Com baixo índice de popularidade —apenas 28% do eleitorado paulista classifica sua administração como ótima ou boa, segundo pesquisa Datafolha— e após a polícia reprimir de forma violenta as manifestações, inclusive com uso de bombas de efeito moral, o governador anunciou a suspensão da medida, prometendo “aprofundar o diálogo” em 2016.

Sete meses antes, os arredores da Assembleia Legislativa do Paraná, em Curitiba, haviam se transformado em uma praça de guerra: a Polícia Militar, empregando gás lacrimogêneo, balas de borracha, spray de pimenta e bombas de efeito moral, dispersou um protesto de professores da rede pública, deixando um saldo de 213 feridos. A truculência da ação acirrou a greve da categoria, que se arrastou por quase 50 dias, e derrubou o comandante-geral da PM e os secretários da Segurança e da Educação, além de causar um enorme estrago na imagem do governador Beto Richa.

Como explicar esse tipo de deplorável atitude? Alguém pode evocar como argumento a nossa ainda incipiente familiaridade com as regras da democracia, mas é incompreensível uma autoridade pública tentar impor de maneira despótica decisões que afetam de forma irreversível a vida dos cidadãos, até mesmo com aplicação da força bruta, para só depois, experimentada a resistência, admitir a possibilidade do diálogo. Isso, para mim, apenas demonstra o viés intolerante do caráter nacional, acirrado quando a ele se alia a soberba, particularidade da nossa elite.

Estranhamente, educação não parece ser prioridade para os tucanos —a bem da verdade, para nenhum governante de qualquer ideologia até agora. Mas, no caso do PSDB, esse descaso é imperdoável, já que o partido tem como maior liderança o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, professor universitário e intelectual internacionalmente respeitado. Durante cinco de seus oito anos de mandato nenhum professor de ensino superior foi contratado e os salários permaneceram congelados, e por todo o período não foi criada nenhuma nova universidade federal. A única expansão ocorreu com o número de estudantes universitários, a custo do acelerado crescimento da rede privada: os filhos dos ricos estudam de graça em instituições que oferecem ensino de boa qualidade, enquanto os filhos dos pobres pagam caro para frequentar escolas de qualidade duvidosa... Fórmula, aliás, ampliada nos governos Lula e Dilma...

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