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Bolsa fecha em alta um dia após pedido de impeachment de Dilma

Pedido de afastamento aumenta incertezas e pode aprofundar recessão no curto prazo

Presidenta Dilma Rousseff.
Presidenta Dilma Rousseff.EVARISTO SA (AFP)

A bolsa de Valores de São Paulo abriu em alta nesta quinta e o dólar registrava queda, um dia depois da decisão do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, aceitar a abertura de um pedido de impeachment da presidenta Dilma Rousseff. Em menos de quinze minutos, ela subia 3,24%, com as ações da Petrobras ON vendidas a 7,39 reais. O Ibovespa operou em alta o dia todo, atingindo o pico de 4,92% às 11h30. No final das negociações, às 17h, a bolsa fechou com uma valorização de 3,58%. Já o dólar oscilou bastante ao longo desta quinta, mas encerrou em queda de 2,26%, cotado a 3,74 reais.

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Para o economista André Perfeito, a alta reflete uma certa celebração do mercado com a possibilidade da saída de Dilma Rousseff. “De fato a presidenta acaba se tornando a personificação da crise política, então a sua saída é vista como uma boa notícia. Como a crise atual é mais política do que econômica, um impeachment aumenta a possibilidade de que finalmente o ano de 2014 acabe, porque o de 2015 nem existiu ”.

Perfeito sugere, no entanto, cautela, já que não se sabe ainda as diretrizes econômicas de um possível Governo Temer, que estaria na linha de sucessão da presidenta. “Além disso um processo de impeachment seria demorado”.

Raphael Figueredo, analista da Clear Corretora, lembra, em todo caso, que o mercado financeiro é pró-impeachment, pois um processo do gênero traz a possibilidade de que toda a indefinição do Governo sobre a economia chegue a um fim. “Com um novo Governo, o rumo da política econômica poderia mudar e projetos importantes anunciados, como o pacote de infraestrutura (198 bilhões de reais) que não sai do papel, sejam concretizados”, acredita. “Mas esse pedido de impeachment é como um gol no primeiro minuto do primeiro tempo. Ainda há um jogo muito longo pela frente e o recesso parlamentar, que começa daqui a duas semanas, pode prolongar ainda mais isso”, avalia.

Ricardo Kim, analista da XP Investimentos, destaca que logo após o anúncio de acolhimento do pedido por Cunha, o mercado respondia positivamente, com a alta das ações brasileiras negociadas em bolsas internacionais. Ainda assim, é cedo para afirmar se o movimento de ascensão do mercado de ações se estenderá por mais tempo. "Muita coisa pode acontecer durante o processo", pondera.

Ao fim e ao cabo, o processo deflagrado nesta quarta-feira pode prejudicar ainda mais o desempenho da economia brasileira no curto prazo, que sangra desde o início deste ano. Para o economista Alexandre Schwartsman, o processo de impeachment de Dilma adiciona incertezas ao processo político e fiscal. “A reação de maneira geral será negativa”, diz Schwartsman, que esperava uma disparada do dólar e a queda da Bolsa antes da abertura do pregão. Ele ressalta que, ao focar na análise do pedido, o Congresso deixará de lado temas importantes para a retomada do crescimento, como as MPs do ajuste fiscal e outras medidas que visam aumentar a arrecadação.

A expectativa daqui em diante é que haja um ambiente de incertezas e forte especulação, que podem retrair ainda mais os investimentos e aprofundar a recessão brasileira, também levaria o país a perder o selo de bom pagador. Ainda que tal possibilidade já esteja precificada atualmente pelo mercado, segundo analistas, ou seja, as negociações em bolsa e no mercado financeiro em geral já incluíam esse risco.

Uma possível troca de Governo, por outro lado, traria novas expectativas para economia, com uma onda mais otimista no setor produtivo, na opinião de Schwartsman. “O nosso cenário atual é de uma economia paralisada por mais três anos de mandato. Com a saída de Dilma, existiria uma possibilidade desse panorama mudar”, explica.

O economista Herón do Carmo concorda que um processo de substituição poderia renovar a condução da política econômica, gerando maior consenso entre os políticos para passar as pautas necessárias. “Com isso, haveria a recuperação da confiança e o país poderia voltar a crescer no fim do ano que vem”.

O analista Raphael Figueredo cita a operação Lava Jato que mexeu com políticos, empresários, a maior empresa do país (Petrobras), com o setor de construção civil e, agora, até com os bancos. “Isso trava, com certeza, os investimentos em infraestrutura e o crescimento do país. Mas não é apenas por conta disso que não crescemos. A constante intervenção do Governo no mercado e as elevadas taxas de juro, por exemplo, não têm a ver com a Lava Jato, e elas impedem que os investimentos na área sejam feitos”, acredita.

As chances de Dilma cair, no entanto, ainda não são seguras para a consultoria Eurasia. Em boletim a seus clientes, a empresa de avaliação de risco político afirma que a presidenta irá sobreviver ao pedido de impeachment. Mesmo com a decisão de Eduardo Cunha, a Eurasia avalia que ela tem 60% de chances de continuar seu mandato dada a falta de consenso no Congresso para sua saída. "Embora o apoio à saída de Dilma possa crescer, as facções pró-impeachment no Congresso estão longe da maioria de dois terços necessária para aprovar a moção no plenário", afirma a consultoria em relatório divulgado nesta quarta-feira.

A má notícia, no entanto, é que o ajuste fiscal será colocada em espera. "Para lutar por sua sobrevivência política, o Governo terá menos espaço para defender novas medidas de ajustes por enquanto”, diz relatório.

Crise política

Hoje a maior pedra no sapato da economia não são os fundamentos, mas a crise política que a alimenta. A falta de apoio do Governo no Congresso para destravar pautas que ajudariam a colocar em marcha o plano de  ajuste  das contas dificultam a retomada econômica. Sem apoio, a presidenta chegou ao final de 2015 tendo de publicar um decreto para congelar 11 bilhões de reais em gastos do Governo. Com menos recursos, o setor público, responsável por quase um terço do PIB, torna-se um agente que também inibe investimentos e aumenta a sensação de recessão no país. A retração da economia brasileira se aprofundou mais do que o esperado no terceiro trimestre. "O que temos é uma crise de tomada de decisão política. Se isso se arrastar por muito tempo, o custo será muito grande para o país".

Para o presidente da FIESP, Paulo Skaf, a crise política gera uma falta de segurança no empresariado brasileiro.  "Enquanto o Governo não resolver seus entraves no Congresso, o empresário não vai investir. Sem emprego e sem consumo, a crise entra em um ciclo vicioso", disse ele nesta quarta.

 

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